Capítulo 1

477 25 23
                                    

15 de março de 1891

Minha filha,

Por minhas contas essa é a terceira carta que lhe escrevo antes que a doença me leve. Você provavelmente deve estar com treze ou quatorze anos, isso tudo só depende de quando a morte me arrebatou. Também deve estar ainda mais linda e doce, inteligente e sonhadora do que agora. Fico imaginando o que sentes enquanto lê esta carta escrita por seu velho pai. Será que se sente feliz? Será que isso lhe causa ainda mais amargura? Se sua resposta for sim para a última pergunta, suplico-lhe que deixe isto guardado em sua última gaveta e que não dirija nem ao menos um pensamento sequer a estas cartas. Se livre disso enquanto tem tempo. Minha querida, eu amo você e sua mãe mais do que já amei qualquer coisa e as amarei até mesmo depois que eu passe pelos portões do céu. Peço que me perdoem por provavelmente tê-las deixado tão cedo.
Amo-te, Eliza. Amo-te como o dia ama o sol e a noite as estrelas.

Com amor, seu pai.

Ѽ

Janeiro de 1894

Eliza guarda seus pertencentes em uma pequena mala. Pega as cartas de seu falecido pai junto com sua bíblia, e as coloca em uma bolsa. Segura as lágrimas que insistem em cair e um pequeno soluço escapa por entre seus lábios rosados e carnudos. Senta em sua velha e desconfortável cama e imagina o quanto sentirá falta desse lugar.

Sua casa deixa de ser sua hoje. Sua vida deixa de pertencê-la.

Está prometida em casamento a um homem arrogante, asqueroso e bem mais velho. Não que ele não fosse bonito, longe disso. Eliza o catalogava como lindo e exuberante, mas com um grande porém, não para sua idade.

Sua mãe não pensava como ela, é claro, se o fizesse não estaria a obrigando a se casar com ele. "É a melhor saída para você, querida." Cecília insistia em repetir essa frase, e ela não sabia mais ao certo se tentava convencer a filha ou a si mesma.


Após as intermináveis tosses de seu pai, seguidas por sangue crosto e vermelho escuro, ele foi diagnosticado por um infeliz médico de Churchill, com tuberculose, uma das doenças mais sádicas e incuráveis do século.

Ver seu pai perder as forças e se transformar em um homem magro, pálido e encurvado, fez Eliza perder as esperanças na vida muito cedo. Cedo demais para se dizer.

Levantou-se da cama convencida a não deixar sua mãe perceber sua dor ou seu medo e caminhou até a saída de seu aposento, com a certeza de que nunca mais voltaria a este lugar. Após um longo suspiro, seus pés se recusam a continuar, e voltando-se para trás Eliza abraça seus pertences mais valiosos.

- Não sinto-me amargurada quando leio suas cartas, papai. - Os olhos são apertados com força e a mão trêmula seca a única lágrima que caiu de uma figura que se torna dura, dura demais para sua idade. - Sinto-me na verdade, extremamente feliz.

Não há mais tempo, se não sair agora e fizer o que sua mãe deseja, é bem capaz que seja arrastada por todo o caminho até o lago, que diga-se de passagem, é deveras longe de sua pequena casa.

Ao caminhar pelo estreito corredor que leva até a sala, memórias de bons momentos inundam sua mente, assombrações para lhe causar ainda mais sofrimento.

A Mansão de ChurchillOnde histórias criam vida. Descubra agora