Me desculpe, Senhor Kim;

12 0 0
                                    

Já faz alguns anos que a senhorita Park trabalhava naquele centro de recuperação psiquiátrica. Nem era tão velha assim. 27 anos e já estava tão amarga como um suco de limão. Tinha sorte de ter aquele rosto de adolescente recém formado.

Sempre quando ia trabalhar usava sobre-tudos e camisas de gola alta. De vez em quando vinha com uma blusa social meio amarrotada deixando visível a tatuagem que tinha no lado direito do pescoço.

Aqueles olhos verdes e grandes e o cabelo preto meio bagunçado, difícil de definir em um corte, deixava tudo mais desponjado. Ah, mas o que ela tinha de bonita tinha de antipática.

Quando entrei lá como secretária, percebi que a relação dela com aqueles pacientes problemáticos era ótima. Ambos sempre eram assustadores, nada que dê uma combinação melhor. O instinto provocante e língua solta da veterana agradava quem precisava de si. Isso fazia com que o tratamento fluisse com uma leveza enorme.

Park os tratava como amigos, algo que nunca realmente entendi.

Era solteira, morava num kitnet e nem o garoto do caixa do mercadinho que sempre ia, sabia seu nome. Quando entrava dentro da sala de atendimento tudo mudava. Claro, seus sorrisos lançados eram na maioria das vezes sarcásticos, mas fazia muita diferença num rosto que passava a maior parte do dia sem expressão alguma.

Havia um rapaz que sempre dava em cima dela. Foi internado depois de ter uma crise e quase matar uma pessoa.
De acordo com os diagnósticos, estava se recuperando um pouco mais rápido que o previsto, depois que ficou aos cuidados da senhorita. Já fazia uns anos que estava lá, então depois de ser dispensado, teria que passar um ou dois meses prestando serviços comunitários, para cumprir a pena.

O garoto chegava a ser uma piada. Quantas bolas fora já levou da Doutora? Ele parecia muito mais um jovem mulherengo do que um 'quase assassino'.

Um dia, já na recepção do local onde trabalho, bem pequeno, assim por dizer, Park vinha caminhando com uma cara não muito boa.

-O que é isso?

Nossa, eu nunca esqueceria aquela cara, misturada de raiva suprimida com uma beleza incomparável. Tinha fogo nos olhos e dentes cerrados. Estava extremamente intimidadora, no momento.

-Um laudo, Senhora.

-Primeiro, não sou senhora e nem senhorita. Segundo, esse laudo é meu, o que estava fazendo junto dos arquivos dos pacientes?

-N-não sei, Doutora Park.

Então aos poucos, junto do silêncio, foi abaixando a cabeça. Estaria pensativa, caso não estivesse explodindo por dentro. Rasgou o papel no meio e levou consigo. Ela não era idiota de larga-lo em um lugar qualquer. Provavelmente tacaria fogo naquilo para nunca mais ver.

- Ela está... p**a. Muito p**a.

Eu sabia que em momentos de raiva, pelo jeito que ela é, a primeira coisa que gostaria de fazer é quebrar algo, e se possível, machucar alguém. Mas seu escritório estava todo organizado. Estava até estranho.

Vi que analisava algum papel em cima da mesa. Não sei dizer como ela se sentia, mas com a testa apoia em suas mãos, dava a intender que a situação não era das melhores.

- Ei, garota. Diga ao senhor Kim que não repassarei o caso a ninguém.

Disse finalmente notando minha presença e jogando aquele papel em minhas mãos.

Quem era o senhor Kim? bem, senhor Kim era o chefão, o velho que controlava tudo aquilo e que Park não tinha medo nenhum de bater de frente. Vinha sendo a melhor psiquiatra que já esteve ali nos últimos 6 anos. A mulher não teria aberto a mão de tantas outras oportunidades para cuidar de seus pacientes a toa.

Estava familiarizada com o lugar. Perder a guarda do caso do mulherengo seria imperdoável. 4, 4 anos cuidando daquele imprestável, como ela diria. Ah, se algo acontecesse, ela perderia a cabeça.

A sala do senhor Kim ficava em outro prédio, mais ao centro da cidade. Bem, eu não sou pombo-correio, mas o que não faço por um bom salário, não é mesmo?

Apertei o botão do elevador que levava ao andar 201.

Alto, estávamos muito alto.

Caminhei atê o fim do corredor, onde haviam vários outros escritórios. Ao entrar, sentei no banquinho da mini recepção e esperei me chamarem. Não queria demorar muito.

-Entre, senhorita.

Kim parecia estar morrendo. O coitado precisava de férias, devo adimitir. Já tinha 73 anos na ficha.

-Bom dia senhor Kim, vim a pedido da doutora Park. Ela disse que não repassará o caso nem por Jesus.

-Bom d- o quê?

-Ela não repassará o caso. Aqui o papel. Até mais.

Corri direto pro elevador e finji não escutar ele me chamar.

Você leu todos os capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Apr 30, 2018 ⏰

Adicione esta história à sua Biblioteca e seja notificado quando novos capítulos chegarem!

Dr. Park E Seus Laudos PsiquiátricosOnde histórias criam vida. Descubra agora