— Puxa... Como seu cabelo está comprido! Ele não está muito fraco, Camilo? — Falou o homem irônico, que acabara de acender uma lamparina, iluminando o espaço quase completamente escuro, que estava sendo salvo apenas por uma vela, em uma mesa próxima. Camilo era um carcereiro, obeso e quando suava suas vestimentas ficavam encharcadas. Era um porco narcisista. Era um homem mau quando a situação era favorável para o mesmo. Vestido completamente de preto, riu com o que o seu mestre falara. Tinha com ele um chicote com pontas de ferro afiadas, e ao seu lado estava a mesa com a vela, coberta por instrumentos ensanguentados. A chama da lamparina, forte, iluminava o rosto do homem que acabara de chegar, tão bonito, mas que tinha consigo um sorriso diabólico e cabelos encaracolados que cobriam levemente seus olhos de serpente, que tinham um brilho próprio, verdes.
— Camilo, preste muita atenção! — Falou o homem, interpretando movimentos como se tudo fosse uma belissíma peça de teatro.
Um homem, acorrentado pelo pescoço, pelos pulsos e tornozelos, nu e cheio de cortes profundo por todo o corpo, apenas respirava sufocadamente prensado em uma parede. O cabelo crescera até o chão desde a última vez que cortara, em sua terra natal. Agora jazia naquele estado, pálido pela falta de sol, as costelas eram visivéis e as unhas já não mais existiam. O carcereiro sempre fazia questão de tirá-las quando já estavam longas o suficiente. Os cortes sempre cicatrizavam, mas eram abertos novamente deixando cicatrizes, cicatrizes eternas naquele ser imortal. Um anchi, que desejava a morte, mas ela nunca vinha. Sempre sentia a pele cicatrizar quando era cortado, o sangue coagulando. Ouvia o coração pulsar aceleradamente, quando a dor era insurportável, sentia a pulsação pelas veias do pescoço. Queria que o coração parasse, mas ele nunca parava. Já chorara, já rezara, já berrara, e nada. Continuava vivo, mesmo que a vida não tivesse mais sentindo. Mesmo que depois de décadas não se lembrasse do quente toque do sol, ou o movimento dos cabelos ao vento ou o cheiro de comida. Qual foi a última vez que tivera comido algo decente? Apenas davam pão seco e água, mesmo que não precisasse. Afinal, era imortal. Antes uma benção, mas agora era maldição. Uma criatura que antes era bela, tinha um corpo protuberante e terras, agora era ignorado.
— Fale para todos Camilo! Avise que nosso triunfo está marcado! Chegaremos ao pódio, velho amigo! Marque com todos uma reunião daqui a meia hora. Diga para não se atrasarem! — Falou o homem para o carcereiro, no qual correu para um caminho perto dali, um corredor, mal iluminado, como tudo naquele lugar subterrâneo. O prisioneiro nada falava, já tinha desistido. Quando o prisioneiro se pronunciava o homem às vezes ria dele expressando pena, cuspia em seu rosto quando tinha um ataque de fúria repentino, ou acariciava seu rosto quando tinha vontade. O prisioneiro apenas deixava, nem levantava mais a cabeça para lhe ridicularizar com palavras, pois nada adiantava. Ele não iria sair dali, ele sabia. Já aprendera isso há muito tempo. O homem-serpente, agora olhando para o outro que estava acorrentado, gargalhou, e os ecos deixavam sua risada mais diabólica, estridente.
— Estou planejando algo estrondoso, eu diria. Você quer saber? Vou lhe falar já que, infelizmente, não poderá ir para a reunião — O homem sorria, abusadamente. — Acho que irei destriur algo. Um Imperium, para ser mais exato. É claro que meu plano precisa de revisões, para sair perfeito. Você sabe como sou perfeccionista. Já faz um tempo que estou pensando nisso e por que não querer mais?
O prisioneiro arfou. Uma lembrança passara em sua mente, queimando, cavalos relinchando e fugindo, crianças ensanguentadas, homens desesperados.
— Como nos velhos tempos, Adonai.
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Laços
General FictionHyacinthum Imperium. Ano de 1352 pelo calendário dos "anchis", povo imortal. O Imperium é dividido por quatro províncias, bem definidas e únicas: Veranum, Primo Vere, Autumno e Hibernu. Todos estão ligados por acaso ou por diversão do deuses. As pr...