jeans azul

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A música alta enchia meus ouvidos com aquela batida gostosa e leve naquela noite. Gelo seco enchendo o ambiente, luzes lilases ofuscando os cantores, pessoas dançando como se voassem e lábios cheinhos com gosto de Jack Daniels e Marlboro vermelho entre meus dentes.

Não sou assim, desse tipo de ambiente, mas essa noite permiti à mim mesmo ser quem sou de verdade. I wanna  be yours era a minha trilha sonora naquele momento. Não exatamente pela letra, mas porque todas as vezes em que eu a ouvia, lembrava a sensação das mãos calejadas dele apertando minha cintura por baixo da camiseta preta.

A música era abafada, mas eu ouvia perfeitamente aquela guitarra gritar em meu ouvido enquanto ele puxava meu lábio inferior com seus dentes numa mordida lenta. Seus olhos sempre nos meus, até mesmo quando ele lambia minha boca. Tudo era em câmera lenta, ou parecia ser, talvez ele fizesse questão que fosse assim.

Vez ou outra, ele parava de me beijar para dar uma tragada funda em seu cigarro, e eu apenas observava com um sorriso bobo no rosto, segurando a jaqueta jeans azul e rasgada dele. Eu não perguntei o nome dele, mas sabia que aqueles all stars azuis claro cheios de rabiscos eram os únicos que eu veria na vida.

Quando ele esquecia o cigarro preso entre o indicador e o dedo do meio, segurava minha nuca com firmeza e trazia sua boca de volta para a minha. Merda, seu beijo era a minha passagem só de ida para o inferno. Se antes eu era um garoto de dezessete anos cercado por anjos e toda a inocência que meus pais exemplares me passaram, agora eu era apenas um corpo pecador cheio de sangue fervendo e desejos queimando.

Tudo nele me derretia. Sua língua chupando a minha, seu braço rodeando minhas costas quase por completo ao trazer-me para perto de si mais e mais, suas mordidas nada castas em meu maxilar, vez ou outra, se eu tivesse sorte, seguidas de leves chupões.

Um súbito de consciência pesou sobre mim e eu abri os olhos para observar se todos estavam nos olhando, como a cena vergonhosa que se passava em minha cabeça, mas éramos praticamente invisíveis no meio daqueles corpos se balançando no ritmo da música. Talvez ele tenha percebido minha vergonha, não tenho certeza, mas ele percebeu algo que nem eu tinha: minha ereção presa na calça.

Senti minhas bochechas queimarem quando seus olhos cheios de resquícios de lápis de olho nos cantos foram em direção àquele lugar, mas ele apenas riu contra meu ouvido e sussurrou: "eu tô de pau duro por tua causa também, meu anjo".

Meu corpo tremeu, tanto que a única coisa que consegui fazer foi passar meus braços por seu pescoço e o apertá-lo com força contra mim. Era idiotice, já que eu sequer sabia seu nome, mas logo senti os seus braços me apertarem pelo tronco também. Perguntei seu nome, ele disse que se um dia nos víssemos novamente, diria.

Me senti triste, pois sabia que assim que aquela festa acabasse, eu voltaria para minha vida pacata e religiosa na cidadezinha onde meus pais tem uma igreja e nunca mais veria o rapaz alto de blusa cinza, jaqueta e jeans azuis, assim como seu all star. Nem suas tatuagens no pulso, muito menos a maquiagem desgastada na parte debaixo de seus olhos grandes.

Nunca mais beijaria aqueles lábios com gosto de Jack Daniels e Marlboro vermelho.

PúrpuraOnde histórias criam vida. Descubra agora