Enquanto os policiais analisavam as imagens eu não conseguia pensar em algo que não fosse a infeliz e tenebrosa coincidência que relacionava o novo nome da rua com o nome da minha filha.
-Senhor, nós vamos levar esse CD para averiguação na Delegacia. E o senhor quer nos acompanhar e fazer um boletim de ocorrência? - disse um dos PMs. Pensei um pouco e concluí que não era bom que eu me afastasse de casa por momento algum.
-Não, eu... - pensei em minha filha - eu tenho muito trabalho. Vou à Delegacia depois. - expliquei.
-De toda forma pela gravidade da situação a gente vai levar o material para lá e aí, muito provavelmente, será aberto o inquérito. - explanou o policial.
-Obrigado, muito obrigado! - agradeci sinceramente. Me virei para entrar em casa e ouvi o tradicional “disponha da Polícia Militar”. Ouvi muito isso quando Yara foi assassinada.
Entrei em casa e fechei a porta com as costas. Me encostando nela, deixei que eu mesmo deslizasse por ela até sentar no chão. Me senti exausto. Com meu notebook nas mãos deitei minha cabeça em meus joelhos. Respirei fundo e tomei coragem de me levantar e trancar a porta. Que me restava fazer? Sentia medo, muito medo. Talvez devesse tentar me distrair um pouco. Fui até meu quarto guardar meu notebook. Desci.
Me sentei no sofá da sala, peguei o controle e liguei a TV. Quando o aparelho acendeu vi que nele estava pregado um pedaço de papel, aparentemente um bilhete. Soltei o controle no sofá e me aproximei para ver do que se tratava. Peguei o bilhete que, escrito com uma tinta vermelha semelhante a sangue, dizia “César, não olhe para trás”. Arregalei os olhos e instintivamente voltei lentamente meu rosto para trás. Vi o espelho que ficava posicionado justamente atrás do sofá. Percebi que nele havia algo e fui verificar o que era. Aproximei-me e vi que estava escrito em outro papel “Você matou sua filha!”. Me assustei ao perceber que a TV começara a emitir um som. Vagarosamente voltei meu rosto para o espelho novamente e vi minha filha na televisão. Mas não era o noticiário. Era um vídeo da minha filha sendo morta. Olhei diretamente para o televisor e vi detalhe por detalhe os momentos de desespero que Yara viveu. Os sons dos gritos de dor e agonia de minha filha se misturavam com os impiedosos e sarcásticos risos dos cruéis assassinos, que pareciam zombar não só de Yara, mas de mim. Eu não compreendia como alguém entrara em minha casa em tempo de preparar aquela armadilha mesmo que eu estivesse presente o tempo todo. O momento final do assassinato de Yara foi um golpe certeiro com um pé-de-cabra na cabeça dela, que afundou violentamente seu crânio. O sangue escorreu e se fez uma poça ao redor da cabeça dela. Eu não contive as lágrimas.
Foi então que ouvi latidos insistentes e raivosos do meu cachorro. Me dirigi até a porta que me levava aos fundos da casa. Respirava pesado, mas tentava me conter. Não ouvia nada além do Tibirco revoltado. Sutilmente apanhei um grosso bambu que deixava ao lado da pia da cozinha e destranquei a porta. Abri e imediatamente posicionei o bambu para dar uma cacetada em quem quer que fosse. Mas não havia ninguém lá além de Tibirco e um pássaro que ele tentava alcançar. No momento senti um alívio imenso. Puxando o animal pela coleira, decidi trazê-lo para dentro de casa.
Depois de cuidar do cachorro fui até o DVD e tirei do aparelho o CD com a filmagem do assassinato de Yara. Quando abri o aparelho, vi que o disco além de personalizado com a foto de Yara, ainda trazia escrito “Não assista até o final”. Movido pela curiosidade e a sede por buscar pistas sobre o assassino de minha filha, decidi que assistiria o filme de novo até o final. As cenas perturbadoras mexiam seriamente com meu psicológico. Tentava resistir. Aguentei firme até o golpe letal. A tela escureceu.
Acabou?, perguntei para mim mesmo. Após alguns segundos um texto apareceu na tela e era narrado por uma voz descaracterizada: “César, se foi corajoso o suficiente para ler isto, seja também o suficiente para lidar com a situação. Eu estou te observando. Estou dentro da sua casa. Me encontre!”. Pouco sent naquele momento além de medo. Quando o texto parou de passar na tela, outra frase surgiu em letra maiúscula e dizia: “LEMBRE-SE DE NÃO OLHAR PARA TRÁS!”. Novamente por instinto voltei meu olhar vagarosamente para o espelho da sala. Arregalei os olhos deixando cair uma gota de lágrima e meu queixo caiu. No espelho estava escrito com sangue: “Agora que você olhou, já sabe que é o próximo!”
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A Sombria História da Rua YN-15
Mystère / ThrillerBaseada no tema da redação da Unicamp, a história conta o caso de um homem que perdeu a filha após um bizarro e cruel assassinato. Pouco tempo depois, ele começa a lidar com uma série de acontecimentos macabros e perturbadores que o assombram dentro...