Capítulo 76

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Senti vontade de cavar um buraco e me esconder para o resto da minha vida. Como o Víctor teve a coragem de dar bandeira daquele jeito?
- Opa – é claro que o Fabrício se enrolou novamente na toalha, né?
- Desculpa – o cara de pau do meu amigo ficou muito vermelho. – Eu não sabia que você estava... desse jeito!
Que vontade de matá-lo, estrangulá-lo, esquartejá-lo... Primeiro com o Vinícius e depois com o Fabrício... Se eu não tomasse cuidado, ele daria em cima de todos os moradores daquela república, talvez daria em cima até de mim!
- Não tem problema – o Fabrício não olhou diretamente pra ele e continuou a fazer o que estava fazendo antes do intruso aparecer.
- Hã... vocês vão demorar muito? – perguntou Víctor.
- Não, Víctor – eu estava com muita raiva dele. – Não vamos demorar, espera a gente na sala, beleza?
- Tudo bem. Desculpa de novo, cara...
- Tranquilo – Fabrício respondeu enquanto passava desodorante aerosol nas axilas.
Quando ele saiu, eu suspirei profundamente. Eu gostava muito do Víctor, mas às vezes ele passava dos limites. Eu estava torcendo para o Fabrício não ter percebido nada referente a homossexualidade do meu amigo.
- Desculpa, Fabrício – eu falei depois de uns minutos. – Ele é muito sem noção.
- Não tem problema não, Caio.
- Desculpa mesmo.
- Que nada, nem fica grilado com isso, é normal. Já me acostumei com essas coisas.
- Que bom que você não é grilado.
- Que nada. Se eu fosse grilado não ficaria pelado na sua frente, ou na frente do Vini. Tranquilo.
- Menos mal.
É claro que ele não era idiota, com certeza percebeu o olhar que o Víctor lançou ao que ele tinha no meio das pernas, mas como ele era muito discreto, não falou nada a esse respeito, o que me deixou muito aliviado.
Só o que ele não podia saber, era que o Víctor e eu éramos gays. Esse era meu maior medo... E se ele descobrisse? Será que reagiria bem?
- Estou pronto. Vamos?
- Vamos sim – eu levantei e fechei meu notebook. – Preciso muito de uma bebida.
- Somos dois. E aí? Como estou?
Eu passei os olhos pelo visual do cara e aprovei na hora. Ele estava gatíssimo com uma regata branca bem colada ao corpo, uma calça jeans azul-marinho e um par de tênis na mesma cor da camiseta. Os cabelos estavam arrepiados e por incrível que pareça, ele estava deixando a barba crescer. Um perfeito gato que com certeza chamaria a atenção de muitas mulheres. E de alguns homens também, é claro.
- Aprovado. Vamos?
- Posso chamar o Vini?
- Deve – eu até fiquei animado. Ter o médico por perto seria bom, porque ele sempre me fazia rir.
- E os outros caras? Não vai chamar?
- Rodrigo saiu. Não sei para onde foi e os outros ainda não chegaram. Aliás, falando nisso, por que você chegou mais cedo hoje?
- Não tive as duas últimas aulas.
- Hum, está explicado!

- Se soubesse que a gente ia vir pra praia, não teria vindo de tênis – Fabrício reclamou.
- Mas daqui a gente pode colar em uma baladinha, pô – falei.
- Isso é...
- Que horas seus amigos vão chegar, Caio? – perguntou Víctor.
- Lá pelas 23. Por?
- Não, por nada. Só estou achando isso aqui muito vazio. Com mais pessoas é mais legal pra gente dar risada.
- Hum.
- Vai querer beber alguma coisa, Caio? – perguntou Fabrício.
- Quero uma caipirinha. Vai pegar?
- Vou sim. Quer, Víctor?
- Não, Fabrício. Muito obrigado.
- Já volto.
Deixei o Fabrício se alonjar o suficiente para poder conversar com o Víctor sem que ele nos escutasse. Aquela foi a oportunidade perfeita para falar tudo o que estava engasgado na minha garganta:
- Às vezes eu tenho vontade de te matar, sabia?
- O que eu fiz? – ele ficou espantado.
- Ah, pelo amor de Deus, não se faça de sonso pra cima de mim!
- Menino, o que eu fiz? Eu, hein?
- Precisava ter entrado no quarto sem bater? Precisava ter olhando pro Fabrício do jeito que você olhou? Quer que ele descubra que eu sou gay?
- Ah, Caio... Que é aquilo, hein?
- NÃO, eu não estou ouvindo isso, estou?
Sem mais nem menos ele come;ou a se abanar feito uma velha que estava na menopausa. Eu não estava acreditando que ele estava fazendo aquilo. Não era possível!
- Não acredito que você está brincando, Víctor.
- Caio do céu, o que é aquilo? Por que não me disse que ele fica pelado na sua frente, meu filho? Se eu soubesse...
- Se você soubesse você teria feito o quê? Teria invadido meu quarto na madrugada pra ficar olhando pra ele? Teria ajoelhado e chupado o pau dele mesmo sem ele querer? Víctor, você está brincando com fogo, moleque. Eu não moro com um monte de viados, eu moro com heteros. E não dá pra ficar cutucando a onça com vara curta, não dá!
- Mas...
- Mas nada! Já falei pra você se controlar, será que é tão difícil assim? Só por que você está rodeado de caras interessantes você não precisa soltar a franga que existe dentro de você não, muito pelo contrário! Já pensou se ele percebe? O que seria de mim? Ser expulso mais uma vez? Não quero isso pra mim de novo, Víctor; portanto, faz favor de se controlar e não dar pinta que você curte a parada. Eu não quero pagar mico de novo, entendeu?
- Nossa! Não precisa falar assim comigo, mano...
- Precisa sim. Precisa sim porque parece que é só assim que você entende.
- Está me chamando de burro?
- Não, estou te chamando de sem noção.
- Eu não sou sem noção!
- Imagina se fosse.
- Pelo amor, Caio. Você está fazendo tempestade em um copo d'água.
- Você fala isso porque não é com você. Recado dado. Espero que você se policie.
- Sem comentários. Isso foi totalmente desnecessário – ele ficou com cara feia.
- Cara feia pra mim é fome, meu filho. Desnecessário foi o jeito que você olhou pro Fabrício. Isso sim foi desnecessário.
- Ai, tá bom, Caio. Já entendi.
- Acho bom.
Eu só parei de brigar com o Víctor porque o Fabrício apareceu com as nossas bebidas.
- Obrigado, mano.
- Por nada. Bem gelada, hein?
- Do jeito que eu gosto, valeu.
- Cuidado para não ficar bêbado – Víctor me lançou um olhar fuminante.
- Não ficarei, eu sei me controlar.
- Caio, já falei com o Vinícius e com o Éverton. Eles vão vir depois da faculdade – disse Fabrício.
- Ah, que bom! E com o Maicon? Você não falou?
- O anão de jardim vai chamá-lo. Eles estudam na mesma sala, esqueceu?
- Ah, pode crer.
- Mudando de assunto, você está animado para ir pra São Paulo?
- Não muito – fui sincero.
- Mas vai ser bom, não vai? Você vai poder ver a sua família. Ou não?
- Na verdade, não.
- Por que?! – ele se surpreendeu.
- Uma história muito longa, parceiro. Qualquer dia desses eu te conto.
- Desculpa, não queria ser indiscreto.
- Imagina, você não foi indiscreto – eu sorri. – Prometo que qualquer dia desses eu te conto tudo sobre a minha família.
- Quando quiser.
- Queria muito que você fosse trabalhar comigo, mano.
- Não posso, Caio. Já te disse que não troco o certo pelo duvidoso. E tem outra: eu não poderia fazer esse treinamento em São Paulo, cara.
- Por que não? – o tonto do Víctor se meteu na nossa conversa.
- Por causa da faculdade – ele respondeu.
- Ah, é – eu não havia pensado naquilo. – Uma pena, porque você iria se dar muito bem lá.
- Quem sabe mais pra frente?
- Fabrício, você faz faculdade de quê? – indagou Víctor.
- Engenharia Química.
- Nossa. E está em qual ano?
- 5º semestre. Eu me formo ano que vem, se Deus quiser.
- Você e o Vini, né? – eu falei.
- Isso. Nós terminaremos juntos. Não vejo a hora.
- E isso significa que no ano que vem vocês vão embora do Rio? – eu fiquei triste.
- É provável que sim – ele deu risada. – Passa rápido, né?
- Muito rápido. Já vai fazer 2 anos que eu cheguei aqui.
- Sério?
- Uhum. Nem dá pra acreditar.
E não dava mesmo. Já iria completar 2 anos que eu havia sido expulso da minha casa... Como o tempo estava passando rápido!

BrunoOnde histórias criam vida. Descubra agora