17 - Livros, Vasos de Flores e Documentos

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Atravessei o palácio e surpreendentemente não encontrei ninguém, exceto os guardas, que já me conheciam e não deram muita bola em me ver por ali "à paisana". A Cecília certamente me submeteria a um interrogatório se me encontrasse naquela área no meu dia de folga. Bem, não é como se eu tivesse contado a ela que o príncipe permitira que eu usasse a biblioteca, então não fazia ideia do que ela iria achar disso se descobrisse — no mínimo, ela pensaria que eu me oferecera para usar a biblioteca real; no máximo, que eu estava mentindo e tentando roubar os livros do palácio e me demitiria. Por via das dúvidas, ela melhor que ela não soubesse por enquanto. Só por precaução.

Por sorte, consegui chegar à biblioteca sem encontrar obstáculos. Qual não foi a minha surpresa ao encontrar o próprio príncipe na biblioteca — eu e essa minha mania de entrar sem bater. Sério, quais as chances? Tipo, quantos cômodos tinha naquele lugar? Uns quinhentos? E eu tinha que encontrar justamente ele ali? Ele estava sentado à mesa acompanhado de uma pequena pilha de papéis. Estava tão concentrado que não reparou na minha entrada. Ele lia um dos papéis, enquanto tamborilava uma caneta na superfície da mesa, distraidamente. Embora estivesse sozinho — ou, pelo menos, era o que ele achava —, ele sentava de uma maneira rígida, estava usando uma camiseta simples de malha cinza com as mangas compridas arregaçadas. Outra vez, seu cabelo caia no rosto sem que ele se importasse. Era uma visão realmente hipnotizante — ou seria, se eu não tivesse um namorado, eu quero dizer.

Antes que ele pudesse me ver, voltei a sair silenciosamente. Quero dizer, tentei sair silenciosamente. Porque, na verdade, enquanto tentava voltar a fechar a porta, esbarrei em um vaso de flores em uma mesinha perto de mim. Virei o vaso e quase o deixei cair. Amparei o vaso de vidro bem a tempo de evitar que se espatifasse no chão e o coloquei de volta no lugar. Mas é claro que eu já tinha feito tanto barulho quanto uma escola de samba na Sapucaí. Seria melhor se eu tivesse tocado uma sirene avisando a minha presença.

Ergui a cabeça e dei de cara com aqueles olhos azuis-escuros me fitando, surpresos. Constrangida, murmurei:

— Oi... — Mas essa não era a saudação correta certamente — alteza...

Tarde demais, tentei fazer uma reverência — eu sempre acabava esquecendo porque eu não costumava fazer reverências e sim recebê-las —, mas acabei apenas conseguindo esbarrar outra vez no mesmo vaso e observá-lo tremer perigosamente antes de parar no lugar sem grandes problemas.

— Boa tarde, senhorita Sarah — o príncipe disse, com educação.

Me voltei para ele rapidamente.

— Boa tarde — balbuciei. Tenho certeza que meus olhos estavam arregalados. — Me desculpe pela interrupção. Eu não sabia que você estava aqui. Quer dizer, vossa alteza... Eu não queria atrapalhar.

Ele não parecia aborrecido. Na verdade, seu olhar parecia até um pouco descontraído.

— Não atrapalha. Pode entrar, se quiser. Fique à vontade.

Discretamente, assenti e me encaminhei para as várias prateleiras de livros. Apenas por hábito percorri cada uma delas, me apaixonando por dezenas de volumes. Finalmente encontrei O Mundo de Sofia exatamente no mesmo lugar que o deixara antes.

Voltei até a entrada quase meia hora depois e o Christopher ainda estava exatamente no mesmo lugar, mas dessa vez ele lia com uma expressão de estranheza. Eu pretendia sair de fininho, sem incomodá-lo dessa vez, mas ele ergueu os olhos quando entrei. Era difícil acreditar que alguém com aqueles olhos tão transparentes pudesse ter declarado uma guerra contra o meu país.

— Eu já vou indo — murmurei. — Não vou atrapalhar mais. Quer dizer, você parece estar fazendo uma coisa importante e eu fico aqui interrompendo... Certo, já estou falando muito de novo.

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