- Mamãe, quando crescer serei um marinheiro e usarei aquela roupa branca com chapéu amassado...
- Não se diz chapéu e sim quepe e para usar roupa branca não precisa ser marinheiro, pode ser...vamos ver: médico ou enfermeiro, ou...
- Mas mamãe, assim não irei todos os dias para o mar. E se for médico ou enfermeiro vou ficar preso num hospital e não gosto de ficar preso e também não gosto de hospital. Vou ser mesmo marinheiro e viver livre no mar, usando minha roupa branca e viajando de cidade em cidade, trocando só de navio. Vou ver os pássaros voando bem baixo para pegar peixes para o almoço e até eu poderei pegar peixes para o almoço. Vou ficar olhando o mar, às vezes verde, noutras azul, bem de pertinho e, se quiser, poderei mergulhar. Quando acordar, poderei olhar o mar e o céu, os dois se juntando lá longe e deixando muito espaço livre para quem quiser passar e...
- E... e...e...E está na hora da escola. Vamos logo para não se atrasar.
- Escola...Lá vou eu de novo. Aquela sala é muito pequena, a janela é muito alta, não consigo ver nada lá fora, nem dá para ver o céu. E o pátio: é só um quadradinho, fica todo mundo preso e amontoado e já faz anos que falo para você: aquilo parece uma prisão e não gosto de ficar preso lá.
- O que você entende de prisão menino? E já faz anos, mais ou menos cinco, que todos os dias escuto essa reclamação. Deixa de reclamar e pega a mochila. Aliás, mais uns quinze anos pegando a mochila e pronto: estará livre para usar sua roupa branca, ser um marinheiro e ir para o mar. Vai fechando a porta enquanto vou tirar o carro.... Não esquece o lanche, fiz torta de frango, ainda estará quentinha no intervalo.
- Oba, pelo menos a comida é boa naquela "prisão"!!!!
Esse lampejo de recordação me fez ver nesse jovem, que estão vestindo com a roupa branca, o meu menino.
Esse jovem é o meu menino!
Às vezes não reconheço o meu menino nele, mas sei que é ele. Sei que o meu menino e os seus sonhos estão escondidos, presos dentro dele.
Essa roupa branca com a qual o estão vestindo não é o seu uniforme de marinheiro e nem a liberdade sempre perseguida será encontrada para onde vão levá-lo, ao menos por ora.
Os gritos pararam. Colocaram nele a camisa e deram uma injeção. Foi se acalmando aos poucos. O puseram numa maca e agora ele já não luta pela liberdade.
Meu coração não está cabendo dentro do peito, está transbordando, explodindo de dor, de agonia. Como gostaria que tudo fosse diferente. Quando foi que perdi meu menino? Quem exatamente o roubou de mim? Quando me distraí para permitir que o vício o transformasse tanto?
O rostinho redondo e os olhos brilhantes desapareceram e deram lugar a um rosto magro, sempre barbudo e com olhos vazios...
A alegria espontânea e a reclamação já não existem no meu menino. Deixaram em seus lugares um ser inerte, que já não se importa com coisa alguma. Mas eu me importo por ele. Não permitirei que o vício, as drogas, os drogados e os traficantes me vençam.
Toda a minha força, todo meu dinheiro, tudo o que tenho dentro e fora de mim usarei para resgatar o meu menino.
Esse jovem sem vontade, sem coragem não é o filho amado e companheiro; é só um farrapo, como um corpo sem a alma, sem o espírito... Por isto sou eu sua vontade, sua coragem, sua alma e seu espírito. A dor de vê-lo sendo levado para a internação é nada, comparada à esperança de ver novamente a luz nos olhos do meu menino.
Meu menino cresceu, mas ainda poderá ser um marinheiro...ter sua liberdade...
A ambulância partiu. Tudo é silêncio e dor.
Na parede: seu retrato, quando seus olhos ainda brilhavam. É esse brilho que me dará forças para lutar e esperar por sua recuperação. Logo abaixo do retrato, escrevi: "O amor de mãe pode ser ainda mais forte, quando for corajoso! E, por ora, tudo é mesmo: silêncio e dor.
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ROUPA BRANCA
Historical FictionOlá, leitor! Conheça a história de um garoto cheio de sonhos, que vai fazer você se apaixonar e depois pode fazer chorar seu coração. Esta obra está publicada completa aqui na plataforma e não será retirada. Aproveitem, tenho certeza que irão se emo...