Capítulo XII • Mais um dia

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Vejo o seu olhar mudar de confusão para dor, ele abre a boca para falar alguma coisa, mas a fecha em seguida. Seus olhos encaram os meus, mas é como se ele não estivesse ali, como se estivesse revivendo algo. Talvez aquele momento.

- Como você sabe disso? - Ele pergunta, depois de muito tempo em silêncio. - Foi o Lorenzo quem te contou? - Um resquício de raiva aparece em seu olhar.

- Quem é Lorenzo? - Pergunto, confusa.

Ele me encara novamente, sem saber o que fazer, sem saber o que falar. Apenas estático em minha frente.

- Como você sabe então? - Ele pergunta, novamente.

Abro a passagem para que ele consiga entrar em minha casa. Seu corpo se movimenta lentamente, como se ele sentisse vergonha de ser ele, seus olhos não encaram os meus, então não consigo saber o que ele sente naquele momento. Quando nossos corpos se cruzam, sinto um choque nos ligar, e me pergunto como que, nessa situação, ainda existia algo que nos ligue romanticamente.

Jonathan fica em pé ao lado do meu sofá, encarando o chão, e novamente tenho a impressão de que ele não está ali mentalmente, parece que somente seu corpo está em minha frente, sem uma alma por dentro.

- Sente-se, Jonathan. - Eu digo.

Ele se senta sem discutir, como se fosse um robô apenas seguindo ordens. Tenho vontade de abraçá-lo e depositar beijos em seus lábios até que ele perceba que está tudo bem, mas a questão é que não está nada bem, depois que eu li as palavras de minha mãe, nada ficará bem, nunca.

- Eu sou filha dela. - Digo, sem rodeios.

Ele parece confuso, mas depois de um tempo, vejo o choque aparecer em seus olhos que me encaram assustados.

- Como assim? - Sua voz é apenas um sussurro.

- Eu sou filha da Madalena, Jonathan. A mulher que cuidou de você quando era pequeno.

Jonathan coloca as mãos no rosto, e apoia seus cotovelos em suas coxas. De repente ele começa a chorar desesperadamente, e eu apenas fico o observando. Observando o garoto de 22 anos ser substituído pelo garoto de cinco anos. Não sei quanto tempo se passa, mas aos poucos ele começa a se acalmar, e eu continuo no lugar em que estava quando seu choro havia começado.

Ele me encara novamente, seus olhos vermelhos, exatamente da mesma cor que eles estavam quando Jonathan e eu nos encontramos no cemitério. Há dor, raiva, desespero, ódio, tristeza. Uma mistura de sentimentos que novamente me faz querer abraçá-lo e dizer que tudo ficará bem, mas parece que meus pés mergulharam em um concreto molhado, e agora que ele se secou, não conseguem mais sair do lugar.

- Ela se matou. - Ele diz, e é como se alguém enfiasse uma faca em meu coração. - Ela se matou, e eu nunca vou poder me desculpar por não ter feito nada.

Sorrio melancolicamente.

- Você tinha cinco anos. - Falo. - O que uma criança de cinco anos poderia ter feito?

- EU TINHA CINCO ANOS! - Ele explode. - Eu poderia ter feito qualquer coisa!

E é quando eu vejo o quanto Pedro Albuquerque havia destruído seu filho e, principalmente, a sua vida. Jonathan havia se culpado durante todo esse tempo pelo que aconteceu, e ainda se culpava, mesmo com a morte de minha mãe.

- Ela, ao menos, foi feliz? - Ele pergunta, um pouco mais calmo.

Balanço a cabeça afirmando, mas não podia ter total certeza sobre isso. Como uma pessoa que foi estuprada pelo cunhado poderia ter sido feliz?

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