Capítulo XIV • Bolo e surpresas

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Fecho os olhos tentando não pensar nos últimos acontecimentos. Tento não pensar em minha mãe em uma cama tendo sua privacidade sendo tirada de sua vida, como areia fugindo pelo buraco de seus dedos. Tento não pensar em Jonathan e em sua ligação com tudo isso, mas nada que eu faça, me inibe de ter esses pensamentos.

Sozinha em minha cama, eu penso nos últimos dias de minha mãe, e no quanto ela deveria estar sofrendo por ter sido estuprada, por ter perdido um filho e por ser infeliz durante todo esse tempo. Ela não pode conversar com ninguém, e muito menos tentar mudar as coisas. Era algo impossível.

Deito em minha cama pensando que eu tenho sorte por ainda estar nesse mundo, tenho sorte de ter Jonathan e Pandora em minha vida, independente das circunstâncias.

Muitas vezes, achamos que nossa vida toma proporções incalculáveis, mas geralmente, somos nós que tornamos as coisas difíceis e não a resolvemos. Jonathan e Pandora não foram os culpados por tudo que aconteceu com a minha mãe. Ele foi. O pai deles, o monstro que destruiu cada resquício de luz em minha mãe, que foi o culpado. Pedro Albuquerque.

Fecho os olhos tentando imaginar como ele era. Meu sangue começa a ferver e abro um sorriso por saber que, nesse momento, ele está morto. Eu arderia de ódio se eu descobrisse que ele respirava enquanto minha mãe estava morta. Eu odiaria saber que ele sorria enquanto ela passou seus últimos dias seu colocar um sorriso no rosto. Mesmo não sendo culpados, é difícil olhar para Jonathan e Pandora e não pensar no pai deles.

A porta do meu quarto se abre, e meu pai aparece em minha frente.

- Olá, querida. - Ele sorri, um pequeno e simpático levantar de lábios.

- Oi, pai. - Digo, feliz com a sua volta.

Ele se senta em minha cama, e observa meu quarto.

- Sabe do que eu sinto mais falta? - Ele me pergunta, retoricamente.

Balanço a cabeça negativamente.

- Sinto falta de voltar de uma viajem de duas semanas, abrir a porta, e ouvir a sua risada e de Madalena ressoando pela casa. - Ele sorri melancolicamente, encarando seus pés. - Sinto falta de ver você e sua mãe completamente sujas de farinha preparando algo que eu nunca comeria na cozinha.

Sorrio, lembrando desses momentos.

- Eu realmente sinto falta de tudo. - Ele sussurra, pegando a minha mão e a apertando. - No começo, eu acho que estava fugindo de você mesmo. - Ele admiti, e mesmo sabendo disso, ouvir aquilo em voz alta me machuca. - Porque cada detalhe seu me lembra dela, me lembra a mulher fantástica que ela era, até mesmo o seu jeito de falar me lembra a sua mãe, e no começo, era insuportável para mim. - Vejo que ele está prestes a chorar, então eu o abraço, mostrando que está tudo bem. - Mas você foi a única coisa que me sobrou, filha, e eu não posso te perder também!

Quando ele termina de falar, percebo que eu estou chorando.

- Você também foi a única coisa que me sobrou, pai. Eu sinto sua falta! Não posso perder dois pais de uma vez só. - Enxugo as lágrimas com as costas da mão, e sinto seus braços me envolverem, ficamos naquela posição por um tempo.

- Ás vezes eu sinto que eu não a conhecia. - Ele diz.

Penso em falar sobre tudo que eu descobri em relação a ela, mas algo dentro de mim me impede, então fico apenas em silêncio.

- Ás vezes eu sinto isso também, acredite em mim. - Resolvo dizer.

Ele suspira e se levanta de minha cama.

- Daqui algumas semanas, farei uma viagem de negócios para Paris, irei passar um mês lá. - Ele diz.

Tento fingir que aquilo não me afeta, mas de todas as suas viagens, aquela era a que duraria mais.

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