Capítulo Único

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Foi tudo culpa do meu melhor amigo.

Se ele não tivesse me obrigado a ir encontrar com o seu novo namoradinho no parque praticamente abandonado atrás da escola, eu nunca teria o visto.

Nunca teria sentido essa curiosidade absurda de conhecer alguém, nunca teria sentido o meu corpo paralisar por alguns segundos apenas porque estava em transe ao observar aquele ser, nunca teria me sentido constrangido por causa de coisas idiotas da minha vida. Eu realmente nunca me sinto constrangido, nunca me importo com o que acham de mim ou com opiniões alheias.

Por que me preocupar com essas coisas sendo que a vida é minha?

Mas quando ele citou coisas que o bando de fofoqueiros do colégio fazem questão de espalhar, eu me senti constrangido pela primeira vez.

Obviamente ignorei o que ele dizia e tentava não ficar encarando muito os seus dentes que mordiam o seu lábio inferior vez ou outra por conta da timidez, ignorei o fato de que ele dizia que alguém como eu não deveria conversar com alguém como ele, que éramos pólos opostos. E eu, como uma boa pessoa que não sabe segurar a língua, acabei dizendo que os opostos se atraem. Isso foi o suficiente para que ele abaixasse a cabeça e não encarasse o meu rosto mais até o fim daquele "passeio".

Meu melhor amigo estava em algum lugar se pegando com o namorado e havia simplesmente me deixado com um desconhecido sem sequer nos apresentar, e o garoto também não fazia questão de tal coisa. Então ficamos em um silêncio mais ou menos desconfortável depois que acabou o pequeno início do nosso diálogo. Ele não fazia questão de falar e eu, por incrível que pareça, não conseguia puxar assunto.

Sentamos embaixo de uma árvore, em lados opostos, apenas aproveitando o fim de tarde e início da noite.

Eu queria sentar ao seu lado e poder olhá-lo melhor. Mas tenho certeza que ele acharia estranho se eu ficasse observando as pintinhas do seu rosto, principalmente a que ficava próxima ao seu olho, essa que foi a mais difícil de se encontrar devido aos seus cílios e os óculos que usava. Poderia imaginar perfeitamente seu rosto ficar coradinho por eu ficar olhando demais seus lábios rosados ou os seus olhos castanhos. Olhos que tinham um brilho especial que eu nunca conseguiria comparar com algo, são tão intensos e bonitos.

E o que falar das suas mechas verdes em meio aos seus fios castanhos?

Nunca tive tanta vontade de tocar nos cabelos de alguém como tenho de tocar nos dele. Sei lá, é como se a minha mão tivesse algum tipo de coceira e não ficasse sossegada enquanto não estivesse em contato com aqueles fios que ao meu ver parecem ser muito sedosos e cheirosos. Conseguia até mesmo imaginar sua expressão ao receber os meus toques e eu tinha certeza que ele ficaria ainda mais fofo e adorável do que já é.

E, novamente, eu estava o olhando ler um livro que eu não fazia ideia qual era. Minha mesa não era tão afastada da sua, afinal, o meu propósito é ficar o observando concentrado em sua leitura e suas expressões faciais enquanto faz tal coisa. Elas variam de fofa à irritada, de triste à alegre, de surpresa à confusa. São tão engraçadas e ao mesmo tempo tão encantadoras. Pena que isso vem se tornando raro ultimamente e que ele algumas vezes não aparecia na biblioteca, eu não fazia a mínima de onde ele ficava quando não ia...

Eu sabia que os motivos dele não ir frequentemente até o local era por minha culpa, eu podia ver seu desconforto enquanto eu ficava o observando sem parar, pouco me importando com o livro que eu tinha pegado apenas por pegar mesmo, sequer me lembrava do objeto depois que ele entrava na biblioteca.

Eu tentei me aproximar e muitas vezes, mas ele sempre se afastava e me dava uma desculpa qualquer para não conversar comigo. Estava estranhando a mim mesmo, nunca fui um cara insistente e pouco me importei com pessoas que não me queriam por perto, mas com ele é diferente. A vontade incontrolável de conhecê-lo melhor era tão grande ao ponto de que tive que implorar para o seu amigo – que é justo o namorado do meu melhor amigo – para dizer coisas sobre ele. Consegui descobrir algo, mas tão pouco que não foi capaz de saciar a minha curiosidade.

Detrás de suas mentirasOnde histórias criam vida. Descubra agora