Está Tudo Bem.

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A Máscara.


Naquele mundo, as pessoas viviam normalmente, falavam normalmente, seguiam a vida normalmente. Será?

Ninguém percebia, mas todos usavam máscaras. Máscaras grandes e sorridentes, máscaras que nunca, jamais eram retiradas. Todos tinham medo de tirar ela, e esse medo só ia crescendo e crescendo...cada vez mais a sociedade evoluia, cada vez mais forte era o medo de retirar a máscara. 

Aquela máscara desgraçada, sorridente...aquele negócio na frente de seus rostos que escondiam sua verdadeira face, que jamais revelava quais eram seus verdadeiros sentimentos. O sorriso das máscaras..aterrorizava as pessoas. Mas, não dava pra realmente perceber - já que a máscara escondia todos aqueles pobres rostos traumatizados. E a cada dia que passava mais escuro o céu ficava, e mais frio o clima estava.

As folhas secas voavam e rodopiavam naquela cidade preta e dominada pela poluição e criminalidade - mas havia um garoto. Uma criança considerada normal, pois usava a mesma máscara sorridente que todo mundo usava. Mas, aquela criança, aquela pobre criança era diferente.

Muita coisa a incomodava, para ele, aqueles sorrisos estampados num pedaço de madeira não pareciam sorrisos de verdade, não o transmitia alegria. O mundo em que vivia, parecia ser feito de papel, de tão falso que era. As pessoas não conseguiam o passar qualquer sentimento bom, era muito desconfortável. Na verdade, todos sentiam isso, mas fingiam que estava tudo bem.

Até que percebeu, o que muitos ali não davam a mínima. O pequeno menino percebeu que havia que ter algo debaixo daquela máscara, e ficou dias curioso com isso. Será que, mesmo ele é de verdade? - ele se perguntava.

Era mais um dia normal, só que desta vez, a escuridão já tomava ainda mais conta daquela pequena cidade. A escuridão literalmente, ela estava quase toda escura, como se o dia agora fosse noite. Era o som dos carros, das pessoas buzinando sem paciência, de tosses, de gritos que vinham dos becos, onde normalmente as pessoas eram assaltadas, violadas ou assassinadas. Ali, o cheiro de sangue e de carne morta dominava.

O pequeno garoto, que acordou ainda mais atordoado do que antes, caminhava com seus pais para a escola numa sexta-feira, pensando e sentindo todo esse terror que ninguém mais parecia sentir, ou se sentia, não se pronunciava sobre ou não tentava mudar nada.

Por que tinham medo.

O menino larga a mão de seus pais e para no caminho. Ele olha para baixo...e começa a chorar. Seus pais nem ao menos percebem as gotas de água e puxam seu fino braço, o obrigando a caminhar. O menino se solta, dessa vez com mais força.

Então, mesmo morrendo de medo...

Ele retira a máscara.

E isso chamou a atenção de todos dali.

Todos ficaram encarando...

Por que ele tirou a máscara? Não, não, não. Ninguém pode. Isso está errado. Vai dar algo errado. Porque ele tirou? Ele não vai ganhar nada com isso. Ninguém pode. O que deu nesse moleque? Qual o seu problema? Ele está louco?  Mas o que é isso? Quanto drama. - todos pensam e sussurram, aterrorizados com o ato do garoto.

Todo mundo ali parou em volta dele. o trânsito parou, tudo. Todos encarando o menino, que também estava assustado, triste e com um olhar vazio. Triste pois queria poder salvar todos a sua volta, mas não era fácil. Não, as máscaras não caíram. Diferente disso, as máscaras ficaram ainda mais fortes e sorridentes do que antes, as pessoas se tornaram sombras enormes e tão escuras como um buraco negro. 

A escuridão finalmente tomou conta total daquele lugar, estava totalmente escuro, e só o que iluminava era o brilho vermelho daqueles sorrisos, que agora eram de raiva e ódio.

As sombras começaram a encurralar o garoto, que logo percebeu que tinha que correr. Ele correu, e correu muito daqueles vultos escuros, que pareciam cada vez mais fortes, mas...eles eram rápidos demais para apenas uma criança. Além disso, naquela escuridão, não se enxergava quase nada.

O menino, em desespero ainda correndo, não sabia mais para onde estava indo muito menos onde estava, as opções de caminho estavam cada vez menores, até ele tropeçar em um corpo morto e se encontrar em um beco sem saída. A máscara ainda estava nas mãos do garoto, que estava com a expressão ainda pior que de antes.

Agora ele estava encurralado, não tinha mais saída .

Agora tudo estava perdido, ele iria morrer ali, nada mais valia a pena...tudo ficou confuso para a pobre criança. Ele estava assustado, não sabia o que fazer. As sombras o encaram por um tempo, e então começam a forçar o garoto a colocar sua máscara de novo. Mas ele jurou que nunca mais a colocaria.

A pequena criança, lutando contra a força de toda a sociedade ali, naquele momento.

Uma simples criança. Uma criança qualquer. Ninguém nem sabia da sua existência até tirar a máscara. Ela já não aguentava mais ter que lutar frente a frente com tantas pessoas, até que se lembrou...

O vago sentimento que tinha de que ele teria que salvar todas aquelas pessoas falsas. Ele retirou a sua máscara por uma razão. Ele queria ver o verdadeiro sorriso daquelas pessoas perdidas. Ele foi o único a apontar que tinha algo errado, e não é porque está sozinho nesta luta que ele tem que desistir.

Estes eram sentimentos verdadeiros.

 Ele teria de descobrir um jeito para que suas máscaras também caíssem, para que pudessem perceber que tudo isso estava errado. Ninguém ali tinha que fingir ou ser algo que não era, agindo pela base do ódio e da agressão, com corações já partidos, partindo mais corações.

Ele não queria, e nem podia morrer ali e agora. Ele tinha uma razão para ser diferente.

O menino, pensando em tudo isso, conseguiu finalmente juntar força o suficiente, ele joga a máscara no chão com toda a força, fazendo-a quebrar em pedaços, e olha fixamente para todas aquelas máscaras aterrorizantes.

Está tudo bem.

Você não precisa fingir ser algo que não é,

sentir algo que não sente.

Ignorar todas essas coisas ruins, não te fará mais forte.

Enfrente-as. Chore o quanto precisar,

mas seja quem você é. 

Dê as mãos para quem você  realmente ama

Não tenha medo de gostar de coisas diferentes, de ser diferente

Não tenha medo de ser julgado pela opinião dos outros.

Olhe para si mesmo. Será que o quê você está fazendo, está certo?

Eu sei que vocês se sentem sozinhos, isolados, rejeitados...

Tristes, deprimidos.

Mas vocês não precisam esconder isso através de um falso sorriso.

Está tudo bem em se sentir assim. 

Está...

O garoto para de chorar, e abre um sorriso...um sorriso jamais visto antes. De tantos sorrisos falsos e enganosos, este sorriso atingiu o coração de todos. Pois era verdadeiro.

As máscaras começam a se rachar, e então, caem no chão.

Está tudo bem.


A MáscaraOnde histórias criam vida. Descubra agora