58 | Letter

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Faz três dias desde que aquela agora tentou algo comigo no vestiário. Estou hesitante sobre contar para Nina. Não porque ela não vai acreditar em mim, mas porque ela pode achar que provavelmente vou me apaixonar por outra enquanto ela não está aqui. Isso não está mais longe da verdade.
À essa hora, ela já saiu da aula de contemporâneo, que é a última do dia. Ela diz que adora e que é incrível, mas ainda não supera o balé. Mas ela diz que sua expressão é melhor quando dança algo mais fluido, que na rigidez do balé clássico.
Estou passando uns panos em seus livros porque estão bastante empoeirados e ela fica alérgica, assim todos nessa casa ficam.
Pego meu telefone no bolso para ligar para ela e perguntar sobre o seu dia, como faço todos os dias, e então contar sobre o ocorrido.
Disco seu número, mas sou atrapalhado pela voz de Tori me gritando do andar de baixo.
 
 
⠀⠀— Olá, querido. — Ela sorri assim que me vê descendo as escadas. — O que faz em casa?

⠀⠀— É quinta-feira, Tori. Não tem muito o se que fazer numa quarta-feira. — Rio.

⠀⠀— Tem razão. — Ela sorri. — Acabei de chegar da China. Fui resolver umas coisas depois de passar uns dias com a Nina em Londres. Ela se adaptou melhor que pensei que fosse. Planejamos tudo da melhor forma para que ela não fique triste.

⠀⠀— Ela está bem? Sabe, é semana que vem.

Sim, semana que vem. Terça-feira fará seis anos desde que nossos pais morreram no acidente no centro de Londres. Talvez Nina estar em Londres nessa data possa ser um gatilho para ela. E eu não vou, porque pode ser um gatilho para mim. Pode ser o fim de nossas sanidades. Não estou pronto, nesse exato momento, para estar em Londres. Me faz lembrar de como o cabelo da minha mãe se movia no vento, do seu rosto sujo de farinha enquanto fazia os bolos, ou então toda suja de tinta após chegar de um dia de trabalho. Eu era uma criança quando a perdi e soube lidar com a morte dela, entretanto, ainda acho que um dia posso não saber mais. Nós nunca estamos preparado para a morte, mesmo que a gente nasça sabendo que todos morrerão. Eu sempre soube que minha mãe iria morrer, mas eu não pensei que fosse quando eu acordasse para ir para a escola, com quase anos de idade. Ela não fez meu bolo de aniversário de doze anos e eu não disse um último adeus sabendo que ela não voltaria. Ainda tem um vazio dentro de mim que sente a falta dela, como eu nunca vou sentir a de alguém.

⠀⠀— Eu volto para lá segunda de manhã. Você pode ir comigo, se quiser. — Ela diz calmamente. — Eu sei que sente muito a falta dela. Entendo como é perder a mãe e eu vou entender se não quiser ir a Londres nunca.

⠀⠀— Eu acho melhor ficar. — Afirmo.

⠀⠀— Tudo bem. — Ela sorri. — Pode conversar comigo sobre isso quando quiser, ok? Dói muito na Nina, mas eu sei que também dói muito em você, Adam.

⠀⠀— Eu estou bem, juro. — Sorrio. ⠀⠀— Obrigada, Tori.

⠀⠀— Disponha. Agora, isso aqui é para você. — Ela me entrega uma caixa que estava nas suas mãos.

⠀⠀— Para mim?

⠀⠀— Sim. É da Nina. Aquela maluca devia ter me dado para eu te dar, mas ela enviou pelo correio. Totalmente sem noção. Tinha que ser a sua namorada. — Ela revira os olhos.

⠀⠀— E a sua filha. — Rio.

⠀⠀— Eu vou subir. Seu pai está em casa? Estou com saudades. Acho que seria legal se você saísse ou colocasse os fones de ouvido no máximo. — Ela diz. Que nojo.

⠀⠀— Meu deus, que horror.

⠀⠀— Pode parando, que você simplesmente transou com a minha pequena garotinha inocente e dócil. — Ela semicerra os olhos.

O Silêncio Entre Nós Onde histórias criam vida. Descubra agora