Echoing...

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"Eu estou bem acordada em um sonho,
Você não me deixa dormir,
Porque eu sinto o cheiro da sua pele no meu travesseiro.
Eu vejo seu rosto no escuro
Caindo como uma estrela cadente,
Te desejo da minha janela"

- Dona Julieta, me perdoe o atrevimento, mas... - Olegário quase desistiu diante do olhar gélido da patroa – mas a senhora está – acenou para o cabelo dela com as mãos, como quem não sabia o que dizer – descomposta. Vai entrar assim mesmo?

O vestido parecia bem amarrotado e do cabelo se desprendiam mechas. Olheiras visíveis não cobertas e falta de rouge nas maçãs do rosto. Julieta parecia uma bagunça que não dormia há dois dias, mas uma bagunça igualmente elegante, como sempre. Pensou em responder de forma truculenta como era o costume, mas percebeu a preocupação nas palavras do empregado. Ele não era igual Susana.

- Vou sim. – Ela olhou para a porta da hospedaria, hesitando por um momento. – Eu preciso resolver isso o quanto antes.

- A senhora me perdoe mais uma vez, mas isso tem a ver com o sr. Aurélio, não é? Sua falta de descanso. - Julieta encarou Olegário como se fosse matá-lo, e percebeu que ele ruborizava, mas não conseguia lhe esconder nada que pensasse. – A senhora não precisa me responder, eu entendo melhor do que deveria. Ele é um bom homem.

A dama descomposta, vestida de preto, apenas olhou o homem à sua frente. Não sabia sequer verbalizar o que vinha sentindo, o que estava fazendo ali, todas aquelas coisas que perturbavam seu descanso há semanas. Como falar dos beijos, das carícias, dos sonhos impróprios que vinha tendo? Ele entenderia que deveria esperar. Naquele momento ela só queria sumir.

"Eu ainda sinto você deitado aqui comigo,
Eu ainda ouço o som dos batimentos do seu coração"

Caminhou lentamente, com cuidado nos degraus. Sabia o quarto onde ele estava; se é que ele estava, visto a hora. Talvez não tivesse dormido em casa. Talvez estivesse buscando consolo nos braços de alguém. Julieta parou abruptamente e fechou os olhos, tentando afastar aqueles pensamentos, aquelas imagens da cabeça. A imagem dele nos braços de outra. Aurélio não era assim, não era um homem libertino. Se o fosse, não estaria cortejando-a, pois poderia ter a mulher que quisesse, quando quisesse. Ela reparava, quando se viam em lugares públicos, os olhares discretos da ala feminina para ele. E ainda assim ele insistia nela, em esperá-la. Porém, ela vinha demorando tanto que talvez ele desistisse.

Muitos "talvez" e nenhuma certeza.

Certeza, sim, de estar ficando louca. Perdendo o juízo impresso em sua alma desde menina. Juízo quase arruinado por aquele par de olhos que pareciam duas joias, cravavam nos seus um mirar tão penetrante que devia ser capaz de perscrutar sua alma, sua pobre alma de mulher em corpo de rainha. Por aqueles lábios que a ela entregavam sensações nunca vividas, promessas irresistíveis, sonhos que ela pensava ter esquecido. Por aquelas mãos, aqueles braços, que pareciam feitos para seu frágil e pequeno corpo, onde ela só queria fazer sua fortaleza e morar neles para sempre.

"Não há nada a dizer agora,
Todas as palavras já foram usadas.
Você e eu estamos quase no fim,
Desaparecendo como uma canção falha.
E se eu ouvir com atenção,
Eu posso te ouvir à distância...
Querido, tudo o que resta de nós
São ecos de amor..."

Não percebeu quando voltou a andar, mas saindo de seus devaneios estava na porta indicada pelo recepcionista da hospedaria. Perdeu a força de sustentação nos joelhos, quis sair correndo e não cometer aquele erro estúpido. Mas já estava ali. Ela precisava falar que ele não mandava nela, que homem nenhum mandava. Que ela era senhora de si, dona de suas emoções, controladora única da própria vida. Ela precisava afirmar aquilo para ela própria, porque já não acreditava mais nas próprias palavras.

Echoes of LoveOnde histórias criam vida. Descubra agora