Sete

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Após o longo silêncio para o conforto de Daniel, todos voltaram para suas cadeiras e Thiago pediu que eu me apresentasse. O medo tomou conta de mim, cada pedacinho do meu corpo tremeu, e eu, como sempre, não tinha ideia do que falaria.

     A voz de Thiago pedindo para que Daniel expusesse seus medos. O sorriso aconchegante, a mão quente. Cada um naquela sala em uma roda onde apenas amor e companheirismo eram capazes de entrar.

     E ainda não era suficiente.

     Eu sempre tentei conversar com alguém. Desabafar, falar como me sentia péssima e desolada sem Pedro. Como a comida parecia sem gosto, os dias eram todos iguais, com nomes diferentes. Que eu não estava preparada para recomeçar a faculdade ou conseguir um trabalho. O mundo literalmente havia parado para mim, mas obviamente seguia para os outros.

     Quando perdi minha mãe, eu estava ciente. Não preparada — nunca estamos —, mas conformada, talvez. Não conseguia ser egoísta ao ponto de vê-la sofrer e não querer que fosse para um lugar tecnicamente melhor. Era diferente. Eu com certeza gostaria que fosse ela a me abraçar quando eu chorei até vomitar com a notícia do carro batido, ou quando tentei por meses voltar à rotina, ou tivesse sua companhia para ir até o cemitério com flores. Mas tia Luíza fizera tudo isso e muito mais por mim, porque minha mãe estava me guiando de algum lugar, e isso foi sempre o bastante.

     De qualquer forma, eu sabia que a reunião era o primeiro passo para continuar uma jornada longa, uma luta diária para sobreviver. E ali estava eu, sentada em uma cadeira, rodeada de pessoas que me encaravam de forma menos intimidadora possível.

     — Você pode passar, se quiser — Sara sussurrou para mim.

     — Não — sussurrei de volta — eu consigo.

     E claramente não consegui. Mesmo sentada, mesmo que todos pararam de me olhar para encarar o chão branco que os refletia. Não era possível, mas um dia seria. Um passo de cada vez, até que não me doesse tanto a ponto de querer morrer.


Como todas as outras vezes, as coisas seguiram normalmente, enquanto eu estava no meu próprio mundo, repassando sem parar o trágico dia, que já estava perto de completar um ano. Thiago soube retomar a reunião quando Sara lhe deu um toque, e todos falaram de sua semana, riram, alguns choraram, e todos pareciam renovados para aguentar mais sete dias, até o próximo encontro.

     No fim, quando todos estavam se levantando, Thiago anunciou:

     — Na semana que vem, vocês irão me dizer como foi conhecer a vida de um companheiro de reunião. Isso quer dizer, que vocês farão dupla e, se possível, sairão um dia na semana. Caso isso não possa acontecer, troquem mensagem, liguem um para o outro, mas se comuniquem.

     Todos ficaram de acordo, e Sara se ofereceu para ser meu par. Eu não queria fazer parte disso, mas estava disposta a saber até onde iria a tentativa de me reerguer, então trocamos números e fomos para o andar de baixo, onde teria um encontro de salas.


No elevador, Sara disse que esse era o segundo desafio proposto por Thiago. O primeiro havia acontecido na primeira semana, que era o esforço máximo para enxergar as coisas positivamente. A nota mental do dia foi agradecer por não estar presente, pois claramente falharia no desafio.

     — Sabe, eu gosto daqui — Sara se apressou em falar assim que as portas se abriram. — Todo mundo tá passando por uma barra, o que significa que ninguém julga um ao outro. Isso é muito bom.

Filhos do AmanhãOnde histórias criam vida. Descubra agora