Sentimentos em discurso

Diálogo de uma perda

-Alô, Carlos, é você, está tudo bem? Ela perguntou com a voz cheia de preocupação. -Eu fiquei sabendo agora, como você está?

Do outro lado só se ouvia um fungar de quem estava a chorar a horas.

-Responde amigo, quer que eu vá para aí?

-Eu to péssimo Viviam, de que outra forma eu poderia estar, ele se foi para sempre.

-Eu sei que é difícil Carlos, mas você precisa ser forte.

-Não diz isso, ele era o forte, eu não sou nada sem ele.

-Para Carlos, ele te amou, muito, não ia querer que ficasse assim.

-Ele... Ah meu Deus, ele não vai voltar. As lágrimas recomeçaram de uma forma involuntária, ele simplesmente não podia segurar.

-Eu sei amigo, mas a vida é assim, infelizmente, você tem que lembrar de todos os momentos bons e focar nisso, e na Nina.

-Eu não consigo, só lembro que ele não vai entrar por aquela porta, que ele não vai me dar meu abraço, meu beijo. Eu não sei se consigo, como viver sem ele?

-Eu entendo o quanto é doloroso Carlos, mas pensa na gente, seus amigos, e na Nina, nós não podemos te perder também. Me promete que não vai fazer nenhuma besteira?

-Droga, porque ele tinha que ir naquela maldita entrevista, se ele não tivesse saído estaria aqui ainda, comigo. O choro aumentou, antes ele estava sentado no sofá, mas não aguentou mais, seu corpo parecia pesar uma tonelada, ele se deitou e afundou no sofá ficando em uma posição quase fetal segurando o celular na orelha com uma das mãos.

-É a vida Amigo, por pior que seja, funciona assim, e você sabe que ele foi na entrevista porque queria uma vida melhor para vocês.

-A verdade é que a culpa é minha, se meu emprego fosse melhor ele não teria que procurar um em que ganhasse mais.

-Não fala assim, você sabe que não é verdade, ele iria igual, por ele mesmo.

-Eu deveria morrer, não ele Viv, é tão injusto, ele é tão melhor, era...

Carlos respirou alto, a cabeça doía, mas não mais que o aperto em seu coração. Ele sentia como se tivesse perdido algo dentro de si, um buraco que nunca mais seria preenchido.

-Não diz isso, nenhum de vocês deveria morrer, mas a vida é assim, e você está aqui e tem que ser forte pela Nina e por ele.

-Eu só consigo pensar no rosto dele ao acordar, ao me ver, do sorriso dele preparando o café para a gente, do carinho antes de sair para o trabalho, do abraço apertado, do toque frio e macio da mão dele em mim, do eu amo vocês que dizia enquanto olhava para a gente com um olhar de que fez tudo certo, eu nunca mais vou ter isso, nunca mais vou dormir com ele, conversar sobre coisas banais do dia e sobre nosso futuro, droga, eu queria até brigar mais com ele e depois me sentir mau por tudo que falei no momento da raiva. Eu nunca mais vou sentir ele em mim. Eu não sei se consigo.

-Não diz isso, você precisa conseguir. Como a Nina está?

-Eu não contei para ela ainda, vou esperar ela levantar. Como eu digo para ela Viv, como dizer para uma criança que o pai dela se foi, que o melhor pai dela se foi.

-Eu não sei Carlos, não sei mesmo, desculpa, mas você precisa estar aí para ela entende? Lembra que ela sempre terá um pouco dele vivendo aí, talvez te ajude, mas você tem que ser forte, tem que cuidar dela, eu tenho certeza que é o que ele iria querer.

-Eu sei, ele iria querer que seguíssemos e fossemos felizes, mas eu não posso ser feliz sem ele.

-Finja então, por ele e pela Nina, nesse começo você não tem que viver, mas sim sobreviver, e com o tempo tudo vai melhorar

-Eu jamais vou esquecer ele Viv, nunca...

-Eu não disse isso, estou dizendo que a dor vai amenizar e as lembranças boas ficarão, e você conseguira viver com a perda, mas eu sei que jamais ele será esquecido, por qualquer um que teve o prazer de telo em sua vida.

-Eu o amo sabe, mais que tudo, mais que eu mesmo, tenho medo de não ter lhe dito isso.

-Ele sabia Carlos, tenho absoluta certeza.

-Papai, papai, ta chorando?

-A Nina acordou, vou desligar para conversar com ela.

-Eu vou me arrumar e ir para aí, vou para passar uns dias, e nem adianta dizer que não.

-Obrigado Viv, obrigado mesmo, te espero. Ele desligou.

-Que houve papai?

-Vem aqui meu amor.

Ele a abraçou com toda força e amor que podia, o cheiro dele de alguma forma estava nela, isso o reconfortou. Ele sabia que precisava continuar, por ela, e porque se desistisse ele ficaria muito bravo seja onde estivesse, e quando pensou isso sorriu, sorriu em meio as lágrimas que escorriam enquanto abraçava a filha. e a única coisa que passou pela sua cabeça depois disso foi.

-Eu te amo amor, e eu sempre te amarei.