Capítulo 5

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Heitor

Segunda-feira, 4 de março de 2002

É incrível o quão incerta a vida o é, nós pensamos ter tudo sob controle, pensamos que tudo é certo, que nada vai mudar, que tudo ficará assim para sempre. Assim era o que eu pensava quando estava casado com a Mari, pensava que ficaríamos juntos para sempre, que a crise em que estávamos passando era temporária, cometemos ambos o grande erro de nos calarmos, empurrar os problemas para debaixo do tapete, fingir que nada estava errado, sorrir para os vizinhos, sorrir um para o outro, quando na verdade estávamos gritando por dentro.

Se tem algo que aprendi com a nossa separação, é que um casamento nunca vai dar certo sem um diálogo, temos ao nosso lado o amor da nossa vida, a pessoa que escolhemos para formar uma família, uma vida. Ficar em silêncio sobre nossos sentimentos é um erro terrível, além de ser desleal com a pessoa que amamos, é desleal com nós mesmos. Temos que ser honestos, por mais que doa falar, por mais que doa ouvir, é a verdade e todos merecemos saber a verdade. Se há um problema, converse a respeito, se abra, pois, guardar para dentro de si apenas, aquele sentimento, aquela magoa vai virar ressentimento e creio que não há nada mais corrosivo em um relacionamento do que isso.

A Mari era a minha esposa, não era mais a minha melhor amiga, não era mais a minha parceira, a minha companheira e por fim não era a minha amante e nem sequer a minha namorada. O ressentimento a tornou fria, ela sorria com os lábios, mas não com o olhar. Eu cometi um erro terrível, infelizmente não tenho o poder de voltar no tempo, de mudar isso, de consertar isso e nem sei se seria o correto a fazer. Pois com esse erro estúpido aprendi tantas coisas, aprendi a dar mais atenção a minha mulher e ao meu filho. Mesmo não vivendo mais com eles, vi ela crescer, se formar na faculdade, realizar seu sonho e a cada realização sua que eu observava de longe, só fazia com que eu me apaixonasse por ela cada dia mais e mais.

— Senhor? Posso entrar? — Despertando-me de meus pensamentos, que era o que eu mais andava fazendo ultimamente, o entregador da floricultura chegou na minha sala.

— Sim, pode entrar por favor. — Acenei para que ele entrasse, ele carregava um esplêndido buque de flores do campo em sua outra mão uma caixa de trufas de chocolate com pimenta, as favoritas de Mari, assinei o cartão e coloquei em um envelope. — Pronto, aqui está. — Remexi em minha carteira e lhe dei uma gorjeta gorda. — Já passei o endereço a você, certo?

— Sim senhor. — Sorri imaginando sua reação ao receber as flores no meio de uma de suas aulas, assim que ele sumiu de minha vista, verifiquei se meu celular estava no alto, sabia que receberia uma ligação sua a qualquer momento, não pude conter o sorriso, estava sorrindo muito ultimamente, depois do que vivenciei com ela aquela noite, senti que ela ainda me amava e tudo o que eu precisava agora era que ela me perdoasse e me desse uma segunda chance.

Eu precisava dela, parece que agora em que tive ela novamente em meus braços, aquela sensação cresceu ainda mais, precisava dela comigo, de nenhuma mulher mais, apenas ela me completa, queria mais filhos com ela, por Deus eu deixaria de trabalhar 10 horas por dia por ela, viveria no meio do mato por ela. Eu precisava reconquista-la como na época do namoro. Fui avisado de uma reunião pelo interfone, iria começar dali a 5 minutos, coloquei o celular no bolso, queria atender prontamente quando ela ligasse e foda-se se eu teria que parar a reunião no meio, eu iria atende-la, pois ela era a minha prioridade e nunca mais eu deixaria o meu trabalho atrapalhar isso.

A reunião seguiu tranquilamente, era sobre um novo projeto de trafego na cidade, uma estrada que reduziria o transito, o que é claro eu estava um tanto em dúvida. A ilha de Florianópolis estava se tornando superpopulosa e ainda acredito que um dia tudo iria parar, os carros não conseguiriam mais se mover, mas aquela estrada ajudaria muito. Sabíamos que era um projeto ousado e sem contar que o governo não nos daria muito apoio, é claro exceto nos jornais, com os qual eles alegariam ter investido 5 milhões, mas na verdade o que receberíamos era um terço disso. Se tem uma coisa que os políticos brasileiros são bons é passar a perna no povo. Acabei focando tanto na reunião que levei um enorme susto quando meu celular começou a tocar, olhei a tela e vi seu nome, apenas ler seu nome no visor do meu celular já fez meu coração disparar.

Cicatrizes de uma vida - Ed2 - L 1  - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora