A cada cinco ou seis horas uma pequena fresta se abre abaixo do que parece ser uma porta. Não existe maçaneta por dentro, mas pelo fato percebe-se ser de metal. A luz adentra pela fresta e uma bandeja é arrastada pra dentro, logo depois a fresta se fecha. Isso acontece a cada cinco ou seis horas, eu sei porque por que contei cada segundo ontem. Pela quantidade de vezes que ela se abriu imagino ter se passado três dias.
Três dias na escuridão.
Não estou sozinho. Tem um homem, tem a minha idade, não pude ver de sua fisionomia, mas tive literalmente um pequeno flash dele duas vezes.
Eu me assustei quando ele bateu no vidro a primeira vez. Na verdade eu ja estava assustado antes disso. Sua voz rouca me disse para ficar calmo. Nervoso perguntei quem ele era e o que eu estava fazendo ali. Obviamente achei ser ele meu raptor. Educadamente a voz me explicou que sua situação era a mesma que a minha.
- Meu nome é Klint. - Ele disse.
Sua voz tinha um tom grave e bonito de ouvir, mas isso não importava mesmo agora, pois eu estava assustado demais pra perceber belezas.
-Kevin. - Falei, minha voz saiu mais ríspida do que eu queria, mas não percebi.
- Não adianta gritar, nem tentar bater nas coisas. - Sua voz era tão calma. - Eu já tentei.
- Por que estamos aqui? - Eu eu queria chorar, eu queria tanto.
Alguns segundos de silêncio se seguiram após isso só é estava prestes a chama-lo novamente quando ele voltou.
- Eu não sei.
Começamos a conversar desde então. Eu estava com muito medo e Klint me apaziguou da melhor forma que pode. Ele parecia ser muito centrado e calmo.
Quando a bandeja foi arrastada a primeira vez, ele me explicou que era a comida. Uma espécie de ração e uma garrafa de água. Como no escuro mesmo e Klint brincou sobre o sabor, mas não vi nenhuma graça.
Ele me contou sobre o que se lembra antes de acordar ali.
Klint é vocalista de uma banda de rock da região. Ele estava na cidade por causa de uma apresentação que faria numa danceteria esta semana. Junto dele haviam mais quatro, Leonardo, guitatrista, Pedro, baterista, Diogo baixista e Murilo tecladista. Estavam todos animados, a banda recentemente começou a fazer um sucesso pequeno. Ele lembra de sair num domingo, queria ver a praia. Acabou indo sozinho, porque seus colegas estavam de ressaca. A praia estava fazia, o tempo frio e as ondas calmas. A última coisa que viu foi um cachorro correndo na areia e então, escuridão.
Comigo foi mais ou menos parecido. Eu tinha ido ao shopping com Lorena, ela queria comprar umas roupas e eu queria ver um filme no cinema. Lembro que fui comprar os ingressos enquanto ela visitava as lojas, tive medo de não pegar um bom lugar. O plano era comprar o ingresso e depois voltar até onde ela estava, mas entre uma coisa e outra eu acabei acordando aqui.
Conversamos sobre muitas coisas, as vezes fazíamos silêncio por um longo período, as vezes conversávamos sem querer nunca parar. Ele conseguia rir de uma coisa ou outra eu apenas queria chorar.
É incrível como apenas o sim de uma voz pode trazer tanto conforto dependendo da situação.
Em um dado momento houve um flesh. Me assustei obviamente e Klint riu. Ele sempre se diverte com tudo, mesmo nesta situação apavorante.
- Calma. - Ele disse. - Isso sempre acontece. Tem uma lâmpada no teto, espero que uma hora ela se assenda de vez. Quero poder ver alguma coisa.
Um dia pareceu ter se passado, mas imagino que na verdade não foram nem doze horas. A pequena escotilha já havia se aberto uma segunda vez e a bandeja deslisou pra dentro.
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Vidro
Misterio / Suspensoquando Kevin desperta percebe que foi raptado e aprisionado em um local cuja a finalidade é testar sua sanidade, ele embarca em um jogo perigoso pra tentar escapar de lá. mas todas as suas tentativas acabam falhando e o desespero aumenta gradativame...