A bicicleta estava em perfeito estado, e o jantar com Alice e Augusto foi divertido. Porém, logo depois do jantar, Anahí fez o café, deu um jeito na cozinha e se recolheu para o seu quarto. Havia coisas para fazer, como lavar e passar suas próprias roupas. E jantar com eles era uma coisa, passar a noite toda na companhia deles era outra, completamente diferente.
Por isso, foi ridículo ela se sentir solitária e rejeitada no seu pequeno aposento. Mais ridículo ainda porque, logo que se sentou, Pebbles veio e se enroscou no seu colo para dormir. A gatinha tinha passado dias maravilhosos no jardim ultimamente. Não tinha subido para o outro andar, segundo Anahí, mas esteve no escritório, enchendo o lugar de pelos.
Ela limpou o local e foi obrigada a não mexer mais nas caixas. Especialmente aquela que tinha a foto de Catherine. A foto estava no canto da mesa de trabalho de Alfonso, e ela a examinou.
Os olhos dela eram frios. Frios e calculistas, mesmo com aquele sorriso forçado. Anahí não gostou dela desde a primeira vez, e achou engraçado que Alice não tivesse gostado também. Ela se perguntava o que teria acontecido entre eles. Talvez Alfonso lhe contasse um dia.
Quando alguém bateu, Anahí deixou a gatinha de lado e foi abrir a porta.
— Desculpe incomodá-la — disse Alfonso. — Mas Alice quer lhe falar sobre a horta. Está toda animada com uma ideia que teve, um formato meio geométrico, e quer saber sua opinião.
— A minha opinião? — Anahí começou a rir. — Não sei nada sobre legumes e verduras. Só quero plantá-las. Como nunca tive um jardim, achei que seria interessante.
— Bem, ela quer falar com você, de qualquer maneira. Por que você não vem se juntar a nós, já que não está ocupada?
— Como sabe que não estou?
— Porque está toda cheia de pelo de gato — ele disse e saiu rindo.
E ela foi atrás.
Era impressionante.
Em apenas dois dias Alice, com alguma ajuda, tinha transformado a pequena área atrás do apartamento de Anahí em um lindo jardim interno, com trepadeiras para esconder os muros do terreno, uma pequena horta com um canteiro de ervas no centro, cercado de caminhos de cascalho. Ainda ia haver espaço para um banco, virado de frente para o mar e protegido do sol com a sombra de uma árvore próxima.
E de bicicleta nova, Anahí foi até a loja de jardinagem, ao lado do supermercado, comprou sementes de vagem, abobrinha, alface e cebolinha para plantar em volta da horta. Trouxe com todo cuidado na cesta da bicicleta para plantá-las no dia seguinte.
Quando se aproximou da casa ela reduziu a velocidade ao ver duas mulheres no portão olhando para a propriedade.
— Posso ajudá-las? — ela perguntou, descendo da bicicleta. As duas se viraram sorrindo, visivelmente constrangidas.
— Ah, não. Estávamos só olhando — disse a mais velha das duas mulheres. — Eu morei aqui com meu marido até ele morrer, depois a vendi. Era uma casa de manutenção cara e com o incêndio... Eu só estava curiosa de ver como tinha ficado, mas isso não é da minha conta. Preciso esquecê-la. Mas, depois de 75 anos, não é fácil esquecer.
O olhar da senhora era tão melancólico que Anahí não resistiu, e num impulso perguntou:
— Gostaria de entrar para vê-la?
— Não pretendíamos incomodar ninguém, mas será que podemos? — a mulher mais jovem perguntou, enquanto sua mãe observava a propriedade com um olhar triste que comoveu Anahí.
— Não está incomodando — ela disse abrindo o portão e deixando-as entrar.
— Você mora aqui? — perguntou a filha.
— Sim, eu trabalho aqui. Mas meu patrão não vai se importar — ela disse com os dedos cruzados nas costas.
Alfonso estava exausto. Tinha trabalhado o dia todo, correndo de um lado para o outro, para cima e para baixo, verificando detalhes e decidindo várias coisas ao mesmo tempo quando os fornecedores traziam problemas atrás de problemas. E entre uma coisa e outra, ele esteve procurando pelo testamento, sem sucesso. Ele só queria tomar um banho, vestir roupas limpas e relaxar no jardim com um bom copo de vinho.
Só não esperava chegar em casa, na sua casa, e encontrar Anahí sentada com duas estranhas tomando chá na sua sala de jantar! Ele parou na porta e ela lhe lançou um olhar suplicante, dizendo:
— Ah, Alfonso, chegou bem na hora. Esta é a senhora Jessop. Foi o marido dela quem construiu a casa original, era ela que morava aqui, antigamente. E esta é sua filha, sra. Gray.
Ele respirou fundo e foi cumprimentá-las, mas seu olhar para Anahí era de crítica. Anahí ficou firme e não desviou seu olhar até que ele desistiu de enfrentá-la, e sorriu para as duas senhoras.
— Sra. Jessop, que prazer conhecê-la. — E ao segurar sua mão frágil, de dedos retorcidos, e fitar seus olhos cansados, que já tinham visto muita coisa e que perderam tudo, sua raiva desapareceu.
— Espero que não se importe com a nossa presença — disse a sra. Jessop, segurando sua mão. — Não queríamos forçá-lo a nada, mas Anahí nos garantiu que não se importaria, e foi tão maravilhoso poder entrar aqui novamente... Pedi a minha filha Joana para me trazer aqui, para olhar da rua mesmo; nunca imaginei que seria convidada a entrar.
Nem ele imaginou isso, mas ficou extremamente feliz por Anahí ter recebido estas senhoras. Então, ele puxou uma cadeira e sentou-se do seu lado, ainda segurando sua mão.
— Não me importo de maneira alguma. Estou feliz de poder conhecê-la e ter uma chance de conversar com a senhora. Não sabia que foi seu marido quem construiu a casa original, do contrário já a teria procurado.
— Ah, foi sim. Ele construiu esta casa logo depois de nos casarmos, em 1934.
— Em 1934?! Mas foi há mais de 75 anos!
— Por isso me sinto como se tivesse 96. — ela disse, sorrindo.
— Nossa! Tomara que eu fique tão bem quanto a senhora quando tiver sua idade.
— Não se sinta obrigado a elogiar.
— Mas sou obrigado a reconhecer como está bem.
— Gostei de você, meu jovem, e gostei da sua casa. Meu marido teria gostado de conhecê-la. Não tivemos dinheiro para construir algo assim tão grandioso, mas, se pudesse, ele teria adorado. E você ainda tem um belo gramado. Ninguém entendia o motivo de não plantarmos nada nele, mas com esta vista linda quem precisa de mais alguma coisa?
— Concordo plenamente. — Ele se virou para a outra senhora e se desculpou: — Perdoe-me, não lhe dei atenção, meu nome é Alfonso — disse. — Então, você deve ter muitas lembranças de infância.
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Lar da Paixão (ADP)
FanficSem dinheiro, grávida e sozinha, Anahí Puente queria se estabelecer e criar raízes. Afinal, recebera alguns golpes duros da vida. Quando Alfonso Herrera a encontrou morando na casa vazia que ele acabara de comprar, sabia que deveria ter pedido que e...