No fundo das catacumbas, uma figura estava assentada em um trono, e ao centro da sala, borbulhava um caldeirão. Dentro do caldeirão, assistia-se Richard, Roger, Henry, Boris e Antonilli, lutando bravamente contra as hordas em uma quase total escuridão. Quem os assistia era nada mais nada menos que o segundo rei mago, Amontilado. Coberto da cabeça aos pés com uma magnífica túnica negra com detalhes dourados e escondendo sua esqueletal face atrás de uma máscara feita de pedra-sabão, ele apreciava desvendar a mente dos invasores. Notou que eles haviam deixado alguém para trás.
- Ingênuas crianças. Agora, permita-me dar as boas-vindas....
Levantou-se do trono, e materializou em mãos um cajado feito da mais seca das madeiras. Com força, o bateu contra o chão. As paredes tremeram, grunhidos ecoaram, a podridão de sua suja aura tomando conta de todas as salas e corredores do lugar. Os jogos estavam abertos.
A descida era longa e tortuosa, mas o otimismo era a maior das ferramentas. Richard ia se colocando na frente, autoproclamando-se líder sem ao menos perguntar. Uma aura densa passou por eles.
- O quê? Gente, espera!
- Vai arregar, uai? Para com essa bobeira e anda logo Roger! Pensamento positivo, pessoas! - ele disse, sorrindo de nervosismo.Eles entraram em uma câmara semelhante à um coliseu, com vários portões ao redor da arena. Apenas uma delas era a saída. Os portões lentamente se abriram, revelando hordas de todos os tipos. A batalha havia se iniciado, e quanto mais se matava, mais monstros apareciam. Richard já estava exausto, e não demorou para que todo o resto também ficasse.
- Vamos cair fora daqui! - Rick ordenou. Todos recuaram, menos Henry.
- O que diabos você tá fazendo!? Isso é suicídio!
- Alguém precisa ficar e conter esses caras. Vão procurar outro caminho, que eu vou logo atrás!Os outros correram para o mais longe que se podia. Boris abriu um pote de maionese, e foi deixando para trás uma trilha para que seu amigo não ficasse perdido.
- Boa sort', camarada! 'Spero que saia dessa! - Boris olhou para trás, sentindo pena.
As hordas eram inevitáveis. Acharam que estavam se dando perfeitamente bem, mas as coisas só pioraram. Todos eles perderam a noção do tempo, só sabiam que precisavam continuar lutando e correndo. Antonilli pegou o celular pela primeira vez em horas. Haviam se passado 3 dias, e nenhum sinal de Henry. Quando as coisas se acalmaram, era hora do plano B.
- Boris!
- Ui?
- Lig' pra senhorita Delore! Manda ela usar o Scutsman, daí vamos recuarr!
- Bua, Antonilli! Já tinha me esquecido diss'! Me dá o telemóvel. - Boris arrancou o celular das mãos do primo, e ligou para Sophia. - Ui? Sinhorit'? Será que puderia usar a aura do Scutsman? É "pra ontem", como dizem pur aqui.
- Tudo bem. E o Henry? Deixa eu falar com ele.
- Henry num tá aqui. Ele tá lunge, atrasando os monstros. Apesarrr de f'zer 3 dias qui num vemos ele...
- Como assim?
- N-nada num!Ele desligou. Do outro lado da linha, Sophia estava extremamente preocupada com o que havia ouvido, mas afastou os sentimentos em prol dos outros.
- Nathi, está me ouvindo? - ela deu leves batidinhas nas rodas da locomotiva. - Será que poderia fazer "aquele lance da aura"?
A locomotiva chacoalhou, e logo, uma pesada aura melancólica cobriu os 5 km e um pouco além. Com os inimigos atordoados, Boris e o resto puderam fugir.
- Não vai esperar o Henry?
- Talvez, mas não temos tanto tempo assim, Roger.Os monstros aos poucos começaram à virar pó, e a presença maligna ia se dissipando. Eles se olharam, olharam os agora vazios corredores e foram procurar o que se perdera.
Após andarem muito, encontraram Henry, sujo de poeira e sangue, com um corte profundo no ombro e vários ferimentos menores pelo corpo. Em uma das mãos, carregava a máscara de Amontilado, que fora brutalmente arrancada.
- Você tá vivo!!
- Viu Roger? Pensamento positivo.
- Que foi? - Henry viu a cara de espanto dos russos. - Acharam que eu havia morrido?
- Clar- AI!! - Roger foi interrompido por um soco na barriga dado por Rick.
- E a Sophia?
- O Boris já avisou à ela. E à propósito, ela conseguiu fazer contato direto com o trem-fantasma.
- Já é um grande avanço. Ela tá bem?
- Sã e salva, compadre.
- Bom saber... - Henry disse, aliviado.Estavam exaustos, mas felizes. Sujos, mas vitoriosos. Agora só restava um e o país estaria livre de influência maligna. Chegaram onde haviam começado, e cada um teve a honra de ganhar um abraço apertado de Sophia. Ela quis contar de imediato o que aconteceu para sua avó, apesar de se sentir como o peso morto da expedição.
- Vô?
- Filha! Quanto tempo, em? E aí, conseguiu?
- Sim! O segundo rei já foi pro saco, só falta um agora.
- Impressionante. Nunca achei que as novas gerações pudessem ir tão longe à ponto de fazerem isso. - ela debochou.
- Vó!
- Tá, desculpa.
- Er.. Tenho que te contar uma coisinha..
- Conta logo antes que eu desista.
- Vó, eu... Bom, me apaixonei.
- Ai menina, que bom! Espera sua mãe e sua irmã saberem do babado!
- Isso eu conto.
- Quem é o felizardo, filha?
- O primo do Roger.
- Hm... Boa escolha. Ele é bonitinho, mas o Roger é um pouco mais, sabia?
- O amor é cego.
- Eu sei. Todavia, espero que seus filhos sejam como vocês e não desistam assim como eu.
- Assim espero.Os Delore retomaram sua posição imponente, e Rick estava mais famoso do que nunca. Seu ego havia inflado, mas não era maior que o de Roger, tão grande quanto a Muralha da China. A máscara de Amontilado ficou linda na parede da casa de Carolina, que sorria de orelha à orelha, cheia de orgulho dos netos. Ela não cumpriu com o combinado, e contou à Bruna sobre o namoro de sua irmã. Bruna sentiu-se feliz, e esperava um dia se casar com um homem rico.
Boris, Antonilli e Roger foram para a Austrália, atrás dos segredos do Outback (com aquela ajudinha básica do Nathaniel, é claro). Henry e Sophia não se desgrudaram. Aproveitavam a paz que tinham conquistado. Os frios invernos já não eram desmotivadores, o tempo corria normalmente, já não haviam monstros se escondendo nas sombras. O que o futuro aguarda? A derrota do último rei não tardaria.
FIM DA PARTE 1
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Contos Noturnos
BeletrieA família Delore caça criaturas das trevas há décadas, mas na maioria das vezes que encontram um inimigo maior que seu ego, fogem. A nova geração desta família terá de lidar com as cartadas do Destino e até mesmo brincar com o fogo das trevas.....