Londres, maio de 1956

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Duas semanas sem Charles.

Jamil contava os dias. Charles havia ido embora de Paris no dia seguinte ao beijo, nem sequer, tinha dado notícias.

O apartamento alugado contava com o aluguel pago até junho, mas nada do inquilino. Rita tirou um tempo para investigar, mas tudo o que encontrou foi algumas fofocas de que Charles havia embarcado para Londres.

Naquela manhã, Jamil empurrou um copo de soda para Genevieve e voltou a lavar os copos. Fermín mexia no caderno e Rita o olhava, triste.

- Me parte o peito vê-lo assim - Genevieve viu Jamil fungar e enterneceu.

- Meu amigo, há tanto para amar - Fermín fechou o caderno - Tinha que ser ele?

- Não controlo eu, meu peito - Jamil se virou, olhos cheios de lágrimas - Eu não sei, só sinto que é ele.

- Jamil, apenas foi um beijo - Rita suspirou - Está tão apaixonado assim?

- Eu não sei - Ele jogou o pano no balcão - O que eu sei é que ele se fora. Foi-se embora para não ver a mim, pois deve ter sentido nojo e asco de mim. Um homem barbudo o beijando.

- Ele que te beijou, não é? - Fermín indagou-se - Então? Porque tanto se sente culpado?

- Não sei, eu sou completamente confuso - Jamil esfregou os olhos - Tardo a mim, que ele já deve estar com outra.

- Não está - Rita suspirou - Ele deve estar na casa dos pais, em Londres.

- Será que está? - Genevieve duvidou. Rita assentiu.

- Minha cara, eu sei como acontece em uma mente confusa após toda a descoberta. Acredite, Charles está tentando processar o que aconteceu.

- E magoando meu amigo assim?

- Genevieve, Charles está confuso. Entenda o lado dele. Também eu ficaria - Rita suspirou - Ás vezes, não entendemos o que acontece. Acha que comigo foi como? Que fiquei feliz? Fiquei perdida, me senti enojada. A igreja já me odiaria, meus pais também. Por ora, entendo o lado de Charles.

Jamil encostou no balcão.

- Eu queria também entender, mas algo me impede de ter empatia por ele.

- E o que seria esse algo? - Fermín perguntou.

- Que sabe, uma súbita saudade dele - Jamil suspirou e então, os amigos o consolaram.

A casa em estilo vitoriano da família Payne ficava situado em um bairro histórico, onde sentia-se a presença de luxo e riqueza. Em uma família de militares, Charles Payne sempre esbanjou um tanto de dinheiro, de graça e poder. O nome de seu avô constava na lista de soldados da Primeira Grande Guerra e do seu pai, na Segunda. Seu irmão, Jonh Payne estava listado no exército, para ser chamado ao caso de apoio. Sua irmã, Alice Payne, estava casada e sendo mãe de dois meninos de um ano e meio, morando ao Leste do Reino Unido.

Como filho mais novo, Charles Payne era visto como um vagabundo pelo pai. O general Payne repudiava o filho.

Desde que voltara de Paris, Charles trocava os discos na vitrola, e acendia um cigarro atrás do outro, bebendo vinho e saindo de casa tarde da noite e retornando apenas de manhã. Sua mãe, Isabelle Payne, ficava preocupada com o filho, mas de nada falava, para que não contrariasse ele.

Mas o General Payne tinha planos para o filho rebelde. E esse planos incluíram casamento com a filha de um amigo, um católico fervoroso.

Em uma noite, após sonhar com a boca de Jamil sob a sua pela tarde, Charles bocejou e abriu os olhos, ao ver que Vicenza estava na porta do seu quarto. A governanta que cuidou dele desde que saíra do ventre da mãe, tinha seu sotaque italiano, cabelos negrumes como o céu e um jeito maternal intenso que não se apagara mesmo com sua ida para a vida adulta.

Alabama Song (HISTÓRIA OFICIAL)Onde histórias criam vida. Descubra agora