Capítulo I

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  ''Nada se compara à incrivel força do conhecimento dos Antigos Mestres. Criadores de Valcare e protetores de todas as partes da ilha, dos mais altos topos de Hol até as mais fundas ravinas de Mandgund.''

- Sacerdote Ohal de Ratgar



Helena Ardroc já estava cansada da vida sofrida na pequena vila de Dawnstorm. O constante ataque de dragões na região somado ao frio intenso e inigualável não favorecia em nada o pequeno comércio herdado pela garota que acabara de fazer 20 anos. O Condado de Authun - nome dado em homenagem ao primeiro dragão morto na região - estava em decadência. O esquecimento do lugar pelo novo rei Orc já era esperado, a vila de Dawnstorm foi uma das únicas a se manter fiel ao Decreto de Storkkel, que previa a anistia aos antigos imperadores magos devido ao aumento excessivo dos impostos por toda a ilha de Valcare. Tal questão trouxe problemas a família de Helena. A recente morte do pai e dos dois irmãos na luta contra o último dragão que atacou a vila à deixou no comando de tudo, visto que sua mãe estara doente de cama e sua irmã mais nova tinha apenas 4 anos. Somado ao frio extremo, pragas afetaram o pouco de plantação possível de ser produzida em tais condições, levando ao abandono da vila pelos moradores e ao intenso fluxo de corpos desnutridos rumo ao cemitério local.

— Hoje o deus da morte levou meu tio, Helena. — Disse um garoto esguio de mais ou menos 15 anos tentando colocar um balde de peixes em cima do balcão do bar.

— Essa lugar ainda dar muito trabalho ao deus da morte Dotri, não sei se vou dar esse prazer a ela. — Enquanto recebia duas moedas de ouro em troca dos peixes, o garoto esgueirou os olhos mas não questionou a garota, que agora estara virada de costas pra ele organizando as últimas garrafas de Hidromel na prateleira.

Ao sair, o vento frio entrou pela porta principal e Helena pôde ouvir a mãe reclamar no andar de cima onde dormia.

As duas minas da região e a pesca eram os únicos recursos possíveis de sobrevivência para os moradores de Dawnstorm. Por sua pouca experiência com viajantes e guerreiros, a vila nunca se preparou com ferreiros e trabalhos do tipo, visto que todo material das minas, que, por infelicidade dos moradores, pertenciam à duas famílias ricas habitantes de outra privíncia, era enviado para grandes cidades perto de Thedra, principal e maior vila de Valcare e morada do reino Orc.

— Helena, trate de fechar essa porta direito, quer que eu morra? Não basta tudo o que eu, seus irmãos e seu pai fizemos por você e sua irmã? Você não tem a capacidade de reconhecer tais atos de heroísmo a ponto de não conseguir fechar uma porta para que sua mãe demore um pouco mais para morrer? — A cara ossuda de Helena estava vermelha de ódio, os ataques de raiva da mãe contra a garota eram constantes desde os seus 14 anos, quando o filho mais novo de um dos donos das minas, Bert, pediu a mão aos pais da garota em casamento. Por não ter opção de não aceitar, a garota fugiu e se escondeu em uma caverna próxima, antigo abrigo Orc, por 6 dias, sendo encontrada pelo irmão mais velho beirando a morte.

— Bem que eu queria que a senhora morresse logo. — Sussurrou a garota para ela mesma enquanto ia em direção da porta, achava incrível a mãe se colocar no papel de heroína em toda a história da família, visto que nada tinha sido feito por ela para ajudar no combate. Ao empurrar aquilo que mais parecia uma colônia de cupins, um pé foi ao encontro da abertura que a mãe reclamara. Pelo assobio conhecido e os dentes amarelos, combinados com os olhos avermelhados e fedor de peixe podre, todos da casa sabiam o que estava por vir, era um Retsa. os Retsas eram um grupo de saqueadores temidos em toda Valcare. Tais pessoas, segundo relatos dos Antigos Mestres, faziam parte de uma linhagem de famílias amaldiçoadas por bruxas de Alto Hol por roubos e assassinatos na ilha, adquirindo doenças que espalhavam verrugas por todo o corpo, além de amarelar os dentes e envermelhar os olhos. Os dentes amarelos significariam todas as moedas de ouros já roubadas e os olhos vermelhos todos os sangues derramados por um Retsa. Possuem uma incrível habilidade de furtividade e extrema força em combates corpo a corpo e, na maioria das vezes, agem sozinhos. O característico assobio era conhecido como O Suspiro do deus Ladrão, usado como forma de proteção e amedrontamento por esses indivíduos. A morte de um Retsa era rara e, segundo relatos, trazia uma horda de outros saqueadores para a vingança.

Não era o primeiro ataque que a família Ardroc recebera, porém, no último, os irmãos de Helena expulsaram o Retsa antes mesmo de ele entrar no estabelecimento.

— HELENA, CORRE!! — Saja, mãe de Helena, estava deitada na sacada de madeira segurando a filha mais nova pelos braços quando viu a filha mais velha empurrando a porta contra o homem. Não havia mais o que fazer, a garota foi jogada ao chão e uma onda fria entrou para a casa arrebentando a porta velha. As ruas vazias e congeladas não ajudavam em nada a família naquele momento.

— Leva o que você quiser, só não faz nada com ninguém, por favor! — Suplicou Saja que mal conseguia se mover no andar de cima. O homem deu um sorriso largo e amarelado, Helena estava imóvel no chão, não sabia o que fazer naquela situação. O Retsa não emitiu uma palavra, adentrou a porta do balcão e enfiou na bolsa os vidros de hidromel restantes, 6 moedas de ouro e 5 peixes que Dotri havia trazido. Não foi o suficiente, irritado com a pouca quantidade de suprimentos o homem olhou para as escadas ao lado e deu outro sorriso para Helena, era o acesso ao andar superior em que estavam sua mãe e sua irmã. A subida acelerada do homem combinou com a veloz atitude da garota, que correra em direção a escada passando a mão embaixo do balcão e sacando uma velha faca enferrujada usada em emergências. Os gritos de Saja e a filha pequena ecoavam nas paredes de madeira e soavam com uma música de suspense juntamente com o vento uivante que adentrava a porta recém quebrada.

No meio da escada, num ato de desespero, Helena cravou com toda a força a faca nas costas no homem, que a recebeu com um grito rouco que superou o antes estabelecido no andar de cima. A mão da garota ainda estava fixada na faca,

Ela estava imóvel. O Retsa olhou para trás, girou o tronco e bateu com uma barra de aço que carregava na bolsa lateral no braço da menina, que agora agonizava de dor com o braço claramente quebrado, combinado a isso, sem dar tempo a Helena, o saqueador à acertou com um chute no meio do rosto, espirrando sangue na parede e fazendo-a cair desmaiada escada a baixo.

O Destino ArdrocWhere stories live. Discover now