Sério, eu devo ter a pior sorte do mundo! Talvez eu devesse me preocupar em estar andando por aí e uma bigorna ou uma âncora cair do céu direto na minha cabeça!
Tipo assim, não é que eu considerasse que o que eu tinha marcado com o Christopher fosse um encontro nem nada. Porque não era. Um encontro, quero dizer. Mas se eu disser que não fiquei nem um pouco ansiosa, vou estar mentindo.
Ah, ok, admito, para falar a verdade, eu parecia que tinha um milhão de borboletas batendo as asas no meu estômago. E, tipo, também admito que não era exatamente por causa das aulas de arco — embora eu adorasse atirar. Mas eu estava ansiosa o bastante para ficar distraída a semana inteira. O bastante para deixar cair no chão um vaso de flores em vez de colocá-lo sobre a mesa de jantar. O cristal do vaso se espatifou no chão, a água escorreu por todo o piso encerado, as rosas amarelas se espalharam aos meus pés.
Eu achei que a Cecília fosse ficar uma fera por causa do vaso, mas quando chegou, atraída pelo barulho, apenas me lançou um olhar reprovador. Não reclamou nem me deu bronca. Não naquele momento, pelo menos. Apenas recolheu as flores para colocar em outro vaso.
Só que, desajeitada como sempre, fui tentar recolher os cacos de vidro sem luvas ou qualquer coisa assim. Você pode imaginar o que aconteceu.
Sim, isso mesmo que você imaginou: me cortei com um pedaço grande de vidro. Sério, o corte quase atravessava toda a palma da minha mão esquerda. O sangue começou a fluir rapidamente. O meu grito de dor, chamou a atenção da Cecília. E aí ela me deu uma bronca:
— O que você está fazendo!? Por que foi pegar cacos de vidro com as mãos limpas? Vem, deixa isso aí.
Ela me ajudou a levantar. O sangue pingava da minha mão. Colocando as flores sobre a mesa, a Cecília deu uma analisada rápida na minha mão, imediatamente começando a me conduzir para fora dali objetivamente.
— Eu preciso terminar de limpar isso aqui — falei, sem convicção nenhuma. Felizmente, eu não sou do tipo de pessoa que passa mal quando vê sangue e tal, mas estava doendo para caramba o ferimento.
— Você precisa cuidar dessa mão, isso sim — ela rebateu. — Eu vou pedir para alguém cuidar daquela bagunça.
Com uma mão nas minhas costas, ela me guiava através de vários corredores do palácio que eu não conhecia bem, até chegar a uma porta onde se lia "enfermaria". Ok, não se surpreendi por ter uma enfermaria dentro do palácio, uma vez que lá também tinha uma piscina coberta, uma sala só para guardar troféus e até uma pequena sala de cinema — eu já queria dar essa ideia de cinema em casa para o meu pai quando eu voltasse.
Assim que entramos, eu ainda tentando evitar que os pingos de sangue caíssem no chão, uma senhora vestida de uniforme branco, com um rosto simpático e óculos redondos, veio até nós, alarmada.
— Ora, o que temos aqui?
Aparentemente, ela era a única ali e, embora ainda fosse uma enfermaria, era um ambiente muito mais simpático que a maioria dos hospitais que eu conhecia. Depois de concluir que eu estava em boas mãos, a Cecília saiu — provavelmente para dar um jeito no caos na sala de jantar.
Não demorei muito lá, já que eu era a única paciente — a única idiota capaz de fatiar a si mesma, claro. Depois de limpar o corte, ela deu oito pontos, enfaixou minha mão em um curativo e recomendou que eu encerrasse o expediente porque seria difícil fazer qualquer coisa com a mão daquela forma.
Assim que ela terminou de falar isso, eu meio que surtei. Sobre ser difícil fazer qualquer coisa, eu quero dizer. Porque, tipo, isso basicamente acabava com meus planos de treinar arco e flecha com o Christopher. Inconformada, tentei fechar a mão e a dor subiu até o meu antebraço, latejando. Trinquei os dentes e recebi um olhar reprovador da enfermeira.
Quando saí da enfermaria, era pouco mais de sete da noite e o jantar já estava servido, mas achei que não seria, sabe, elegante aparecer para comer com as outras pessoas com o uniforme sujo de sangue.
Acabei aproveitando o banheiro vazio, fui tomar banho — o que não foi tarefa fácil de executar com uma mão só e sem molhar a outra. Me vestir foi um pouco mais fácil, ainda que não tão fácil assim. Vesti um vestido preto com gola polo, que mais parecia uma camiseta grande demais e enfiei os pés nos tênis. Já o cabelo, com muito custo, consegui prender em um rabo-de-cavalo de qualquer jeito.
Resultado: quando finalmente voltei ao refeitório, o horário de jantar já estava encerrado — agora só seria servido para os guardas que haviam ficado em seus postos.
Saí do refeitório aborrecida e com fome — que, para mim, são sinônimos —, cogitando se a Virgínia me arranjaria alguma coisa para comer, como da última vez e sabendo que seria um abuso da minha parte — afinal, não era obrigação dela ficar guardando comida para a atrasada aqui.
Com a cabeça baixa, no corredor, praticamente dei de cara com o Christopher — teria realmente esbarrado nele se ele não tivesse denunciado sua presença com um:
— Oi. — Ele foi bem contido. Quase tímido, na verdade.
Ergui a cabeça tão depressa que quase ia parar na enfermaria de novo, dessa vez com torcicolo.
— Oi — respondi, sentindo irracionalmente meu coração começar a martelar freneticamente.
Ele devia ter chegado há algum tempo, uma vez que parecia já ter tomado banho e agora, em vez dos ternos usuais, usava uma camisa, que devia ser de flanela, xadrez azul-claro — ele devia ser proibido de sair por aí usando azul, sempre destacava seus olhos —, um jeans e tênis. Por pouco não deixei meu queixo cair enquanto fitava-o.
— Eu estava mesmo indo procurá-la.
Senti um nó no estômago e quase — quase — perdi a fome. Eu estava completamente derrotada, porque a última coisa que eu queria dizer a ele o que eu ia dizer.
— Ah, então... sobre hoje... — meu coração se contraía mais a cada palavra — eu acho que não vai rolar. — Levantei a mão para mostrar o curativo. — Sobre o arco e tal, quero dizer.
Ele tombou a cabeça de lado e me olhou, intrigado.
— Esse é um daqueles momentos em que você inventa uma desculpa para me dispensar?
O encarei de volta completamente estarrecida. Ele não tinha um tom acusatório, aborrecido ou qualquer coisa assim. Comecei a cogitar seriamente a possibilidade de a sanidade mental dele estar comprometida. Claramente estupefata, respondi veemente:
— Não! Claro que não estou inventando desculpas. Veja bem, eu levei oito pontos na mão!
Ele dessa vez não pareceu sentido nem nada. Em vez disso, ele apenas acrescentou objetivamente:
— Bem, porque nós podemos apenas não treinar tiro com arco hoje.
Continuei encarando-o, sem saber exatamente onde ele queria chegar. Será que alguém já tinha inventado alguma desculpa para evita-lo? Era difícil de acreditar. Percebi, então, que eu não tinha respondido. Mas ele falou como se estivesse continuando a conversa displicentemente:
— Você jantou?
Lancei um olhar rápido para a porta do refeitório de onde eu acabara de sair. Pensei em mentir porque eu tinha a impressão de que ele sempre me encontrava comendo ou com fome. Porém, antes que eu respondesse, como se lesse meus pensamentos, ele emendou:
— Imagino que não. — Ergui uma sobrancelha, um pouco surpresa. — Vamos procurar algo para comer.
Ele começou a voltar por onde tinha vindo e eu não hesitei em segui-lo.
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Real
Novela JuvenilSarah achava que já tinha problemas demais para lidar entre a escola, as cobranças da família, o seu namorado secreto e o fato de ser uma princesa em um país prestes a entrar em guerra com seu vizinho. Mas percebe que as coisas podem ficar ainda mai...