A Carta

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Em algum momento me senti sufocado pela festa assim como por todos os que estavam nela. Ter visto Augusto ao lado de Priscila não ajudou muito a melhorar o meu humor. Eu tinha ido ali para entregar uma carta e ir embora, mas...

  O ponto positivo é que ninguém sabia quem se encontrava embaixo da fantasia de pânico – no caso, eu. Poderia continuar ali e mal seria notado. Mesmo conversando, pois o modulador vocal faria minha voz ficar robótica e psicopata.

  Não tem nada para mim, aqui.

  O pensamento foi o suficiente para me direcionar até a varanda no segundo andar e pedir um táxi. O taxista atendeu no terceiro toque. Fui ignorado ao perguntar quanto custaria a corrida e o motorista encerrou a ligação após me repreender diversas vezes.

  – Droga – praguejei.

  – Talvez seja sua voz – alguém disse. Não alguém, ele. Reconheceria aquela voz em um milhão de anos e vidas.

  Augusto!

  Ele estava fantasiado de bruxo da saga Harry Potter, portava uma varinha nas mãos e um cachecol da casa de Corvinal no pescoço. Mesmo ali, no escuro daquela noite, o jovem possuía traços únicos e encantadores.

  – Você sabe – ele começou. – Sua voz está...

  Logo voltei ao atual presente e entendi sua fala.

  – Ah sim – ri ao dizer. – É só o começo dos meus jogos.

  Foi a vez dele rir, e alto.

  – Eu sou Augusto. E você é?

  – Se eu revelar minha identidade vou precisar te matar. Lance de serial killer.

  Ele riu mais uma vez.

  – Tudo bem. Prefiro não saber, então. – O rapaz permanecia de pé, com as mãos encostadas na cerca da varanda. – Por que você já está indo embora? A festa mal começou.

  – E por que você está aqui fora e não lá dentro?

  – Justo, mas eu perguntei primeiro.

  Sorri do comentário, embora ele não pudesse ver.

  – Eu apenas não sei mais o motivo pelo qual vim até aqui.

  – Espera. Você não tinha elaborado nenhum plano maligno para executar com uma possível frágil vítima?

  Era exatamente isso que eu adorava nele.

  A capacidade de me fazer sorrir mesmo quando também era o motivo das minhas lágrimas. Eu odiava e adorava esse sentimento.

  – Não sei se maligno e nem se tão frágil assim...

  – Mesmo robótico você soa melancólico. Com certeza não pertence a casa de Sonserina.

  – O quê? Claro que pertenço. Minha família é sangue puro. E por favor, quantos anos se passaram para continuarem a ter essa imagem de existirem apenas pessoas ruins em Sonserina?

  – Você tem razão... – Então ele riu e completou: – Engraçado, o assassino em série tem sentimentos...

  – Todo mundo tem – o que mais eu poderia dizer?

  De repente ele pareceu preocupado.

  – Ela está dançando com outro cara? – perguntou.

  – Ele – a pausa ocorreu mais pelo nó na garganta que pela necessidade de criar um clima dramático – está dançando com uma garota. E provavelmente gostando dela.

A Carta (Romance Gay) Onde histórias criam vida. Descubra agora