Suicídio em câmera lenta

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Eles já estavam perto da gente.

"Você pode correr, mas não pode se esconder, seu viadinho", ouvi um deles gritar de longe. Agarrei a mão do meu amor e continuamos correndo no meio do mato. Meus pés pulsavam de dor, não estava pronto fisicamente para essa travessia. Tudo aconteceu tão rápido que não tivemos tempo de nos preparar.

Infelizmente, desde que ele foi eleito os ataques e agressões a homossexuais só cresceram. Entre os meus amigos foram vários casos. "Ano que vem vocês vão ver, a mamadinha acabou seus merdas", ouvi um dizer uma vez antes de acelerar o carro e sair como um covarde. Eles nunca ficavam para ouvir a resposta e eu sempre tinha uma na ponta da língua.
Desde que saí de casa, aos 18 anos de idade, nunca escondi de ninguém que eu sou gay. Nem tinha como, pois mais afeminado do que eu impossível. O arco-íris está estampado na minha cara desde criança e já estava acostumado em ouvir agressões verbais e sofrer ataques físicos contra a minha pessoa. Tive que aprender a andar com um canivete no bolso, pois apesar de ser contra armas não queria perder a minha vida de graça... mas jamais imaginei que estaria correndo de um bando de loucos para me salvar.

Eu chorava e soluçava enquanto fugia, segurando a mão da pessoa mais linda que já conheci na vida. Justamente quando a felicidade havia batido na minha porta! Como não percebemos que este dia estava chegando? Tanto amigos nossos já tinham preparado os passaportes e vendido todos os móveis da casa um ano antes! Chamamos eles de lunáticos. Esse tipo de coisa só acontece em série, dizíamos.

Por que isso está acontecendo conosco, Deus? Diabo? Alguém aí em cima, olhe pra gente! Nos salve! Eu sou um prisioneiro na minha própria casa. Será que eles não entendem que nascemos assim? As vezes eu penso que não é o fato de sermos gays que os afetam e sim a nossa liberdade. Simplesmente não conseguem aceitar alguém viver a vida da maneira que quer. É inconcebível para eles, que nunca souberam o que é isso.

Eu nunca deixaria que fizessem alguma coisa com o meu amor. Vi tanto corpos enforcados e queimados durante essas semanas que fugimos por entre os matagais perto da praia. Encontramos pessoas que também estavam na mesma situação, todas as caras tristes e desesperadas, com sede e fome, fugindo da morte. Assustados! Mas jamais deixaria que nos pegassem.

Eu fugiria até o fim do mundo, eu morreria mil vezes antes de ver qualquer um deles me segurando pelo pescoço, ditando o que fariam comigo. Amor, estou cansado de correr, não seria melhor voar? Infelizmente perto da praia, pessoas não ganham asas e nunca aprendi a nadar. Gays não respiram debaixo d'água, não é verdade?

Conflitos Internos da Cabeça de um HomossexualOnde histórias criam vida. Descubra agora