Festividades

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               Como o esperado, muita chuva no Natal brasileiro. Chegar no sítio do meu tio torna-se tarefa complicada, mas muito bem recompensada quando você avista aquela porteira de madeira bem gasta e comida pelos cupins, porque você sabe que vai ser recompensado com um cumprimento acalorado e um café pronto. No Natal, com certeza um refrigerante para as crianças e cerveja gelada pra quem merece, pois a maioria da família ainda trabalhava no Natal e tinha vários motivos para querer sentir o gosto de álcool na boca. Eu tinha o privilégio de poder chegar antes de todo mundo pois, como eu era o único dos meus irmãos que tinha ensino superior, pude arrumar um trabalho de carteira assinada e ter férias e tudo mais que a lei nos garante por enquanto. Mesmo sendo o trabalho de um professor, que é cansativo e mal valorizado, ainda assim era um trabalho onde eu pelo menos não tinha que trabalhar por turnos e dava para aproveitar a comida de minha tia Célia integralmente.

Cheguei primeiro como de costume, sentei na cadeira de balanço e esperei calmamente a noite cair, demorada como sempre e quente como sempre também. Abri uma ou duas cervejas para aproveitar minha própria companhia antes do resto de minha família chegar, já que tia Célia estava cozinhando e meu tio Benedito dormindo como sempre. Usei esse tempo livre que tinha antes de todos chegarem pra pensar um pouco na situação atual em que eu me encontrava.

- O que é que está faltando?

As palavras fugiram da boca como saliva escorrendo, que você tenta segurar, mas não consegue. Era inevitável e eu sabia. Palavras traduzem pensamentos, e, ainda mais nessa época do ano. Dei sorte de ninguém ter ouvido e não ter que explicar coisas que até para mim não fazem mais sentido, quanto mais para outras pessoas. Ainda mais nessa época do ano.

Cai a noite e eu consigo ver o brilho de faróis na estrada de terra. Eu tinha tempo de preparar quais frases pré-definidas eu usaria para os parentes que estavam naquele Uno 2002. Talvez um "como vai a família" ou algo não tão invasivo como "vamos marcar de encontrar" e coisas nesse estilo. Com as frases na ponta da língua, estava preparado para responder a quaisquer dúvidas que meus parentes poderiam ter. Ainda mais nessa época do ano.

- Fábio, e aí cara? Como vai?

- Vou bem, graças à Deus, e você? Como vai a família?

- Vai bem também...

- Assim que é bom! Quanto tempo não vejo vocês, vamos marcar de encontrar qualquer dia desses!

- Com certeza meu bem! – A esposa de meu primo sabia o que estava acontecendo, e foi levando meu primo para dentro de casa, já que as crianças essa hora já tinha corrido até o quintal para fazer o que quer que crianças façam.

Passam-se mais alguns minutos e chega a outra leva da família. Ao longe parecia uma carreata política, mas eu sabia que eram meus tios do Rio. A família era grande e, como meu tio sempre adorou viajar de carro, mesmo a viagem sendo longa, ele sempre "obrigava" seus genros – ele tinha 5 filhas – a dirigirem com ele. Devia ser um clima bom de viagem, talvez devesse experimentar futuramente.

- Falando no demônio, olha ele aí. Levanta essa cabeça rapaz, tem um rangaço esperando a gente lá dentro!

- Oi para você também, tio Cláudio. E família...

E fiquei uns 10 minutos cumprimentando cada genro, cada sobrinho e sobrinha, cada primo, primo de segundo grau e por aí vai. Nesse momento, já tinha chegado mais da metade da família, então resolvi entrar e aproveitar agora da companhia deles para ver se afastava alguns pensamentos da minha cabeça.

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⏰ Last updated: Jan 04, 2019 ⏰

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