a caixa e a estátua

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oi, seja bem vindo(a)!

antes de tudo eu gostaria de esclarecer uma coisa: abra sua mente e permita-se viajar por universos distantes e reflexivos, caso contrário, será uma leitura de difícil entendimento uma vez que essa é uma oneshot repleta de metáforas e com diversas interpretações.

Você percebe que ainda não encontrou o seu próprio "eu" quando não passas a odiar o que é, mas o que fostes obrigada a ser durante muito tempo. O que, em todos os casos, são temáticas completamente distintas.

És aquilo que há dentro de ti, quem sabe uma mescla do sossego com o mavioso ou da insanidade com o êxtase, talvez um pouco de todos eles podendo assim dizer, e é disso que o mundo está repleto, de inumeráveis misturas todas elas dessemelhantes entre si.

Não sei se você já percebeu, mas essa é a beleza da coisa: a infinita aquarela de aspectos dentro de cada ser pensante que vaga por esse planeta hostil.

Há milhares, bilhares – ou um número o qual se quer conseguimos pronunciar – de individualidades espalhadas por toda essa imensidão de almas, cada uma sendo tão original e nova da sua forma a medida em que mais pessoas chegam ao mundo. Por mais que isso seja belo e queiramos apreciar a diversidade, há sempre uma parte corrompida, porque, mesmo que lutemos para acabar com o mal, sempre haverá um pouco de ying no yang.

Cada ser desce à terra com suas particularidades, tais essas que não podem ser encontradas em mais ninguém, adquirimos conhecimentos e desejos, idealizamos aquilo que almejamos ser.

A parte corrompida age como uma caixa maciça e opaca, onde você guarda tudo isso e esconde a sua pequena aquarela.

Não adquira conhecimento ao não ser aquilo que te é permitido, não deseje e não idealize. Eu farei por você, insinuavam eles.

E então, quando menos espera você passa a ser um projeto vivente de alguém, sem conhecimento, desejos ou idealizações, e é exatamente por isso que Doyeon fazia sua mala com tanta urgência e empenho.

Ela não sabia que tinha um limite até atingi-lo. Estava prestes a explodir, cada centímetro do seu corpo formigava por efeito da euforia de fazer algo no pico de um sentimento, normalmente o pensamento sensato de que iria arrepender-se mais tarde a impediria, mas naquela vez foi diferente, naquela vez Doyeon tinha a completa certeza do que queria e não havia nada que poderia impedi-la de o fazer.

Tudo sempre foi milimetricamente planejado, uma vida caprichadamente cromatizada de uma cor a quem não teve a chance de escolher pois não era ela quem estava a segurar o pincel, pode-se admitir que havia certa beleza em toda a imagem produzida, mas aquela não era uma obra de arte na qual poderia orgulhar-se mais tarde, uma vez que não foram suas mãos a qual haviam moldado e dado forma àquela escultura.

Apenas uma estatuária qualquer desprovida de toda a vitalidade e energia era posta ao lado de Doyeon, e miseravelmente no rosto da garota sempre faltava-lhe o seu característico sorriso cintilante.

Esse é o problema de permitir que alguém faça algo por você, no fim das contas não irá haver honra porque os elogios não serão direcionados a ti.

Estás a tornar-se uma grande mulher — diziam os rostos aos quais ela conhecia muito bem. — Seus pais fizeram um bom trabalho.

Trabalho este que não era deles, ela tinha vontade de dizer.

Preenchida pela fúria e excitação – uma mistura um tanto distinta mas ainda sim capaz de fazê-la funcionar – deixou que seus desejos a envolvesse tomando conta do próprio corpo, resultando na cena daquela estrutura de mármore triste e sem vida ao chão estraçalhada e com seus fragmentos por toda as extremidades do quarto. A frustração era aparente mas o regozijo começava-lhe a pedir espaço em seu peito, crescendo da raiz mais profunda como uma flor que desabrocharia assim que permitido.

Pegou a canastra onde continha a sua aquarela. Como pode algo tão belo ser omitido de tal forma? libertou-a daquela caixa maciça que se desfez em pó na sua mão e quando menos esperou esboçava um sorriso contente, daqueles que cintilavam palavras bonitas e adocicadas. Era como nascer de novo.

Destemida, encontrava-se preparada para partir. Seus pés fervilhavam ansiando a corrida que estava por chegar, era de tarde e o sol chamava-a na porta como um estímulo para prosseguir, porque o dia estava belo, belo demais para um ser tão gracioso como Doyeon ficar escondido dentro de casa.

Não demorou muito até que disparasse na direção a qual ela sempre almejou, seus sapatinhos de um amarelo vivo foram boas escolhas por permitir-lhe conforto durante o trajeto.

Ela não olhou para trás, apenas fincou seus olhos em um dos horizontes a qual seu peito ansiava, gritando por liberdade absoluta sorriu para o sol e ele sorriu de volta, assim como sempre fazia quando os seus raios adentravam as janelas do – agora antigo – quarto de Doyeon.

Ela corria ininterruptamente em direção àquela estrela tão reluzente que emanava o seu brilho mortal capaz de engolir seu pequenino corpo, o sorriso alargava a medida em que a luz ficava mais forte porque ela sabia que o momento estava chegando.

O momento em que Doyeon finalmente comandaria o leme e iria direcioná-lo para onde quisesse, o momento em que seria engolida pelo sol e a flor em seu peito tão carecida de raios-ultravioletas faria por fim a fotossíntese, sendo assim capaz de desabotoar.

Ela não parou de correr.

A estrela que uma dia fora tão distante agora estava tão perto que envolvia todo o seu torso pela luminosidade – que era fulgente de tal maneira que poderia ser palpável.

Seus olhos doíam mas ela podia sentir seu peito abrindo-se dando espaço àquele belo floreado.

Mas foi quando fechou os olhos que a magia acabou. Assim que os abriu novamente o calor solar havia esvaído-se para um lugar desconhecido, o ambiente estava obscuro novamente e uma áurea fria permeava o ar. Mais uma vez o rosto carecido daquele sorriso silencioso que pronunciava um milhão de sonhos e certezas estava esboçado em seu semblante.

Olhou para o lado e lá estava a estátua inanimada e triste, a caixa maciça onde continha a sua aquarela – que provavelmente, depois de tanto tempo já não tinha cor alguma a não ser um cinza apagado – estava em suas mãos.

E obedecendo o habitual, ela chorou.

Porque mesmo com tanto anseio em correr na direção do sol, Doyeon se quer havia saído da sua própria cama.

O botão de flor em seu peito ainda sufocava no próprio espinho, chegaria um momento em que ele não desabrocharia mais e ela ficaria presa. Presa àquela estátua ridícula, a caixa maciça, e ao desprovimento de qualquer liberdade apetecida.

Porque Doyeon nunca conseguiu ser destemida o bastante para tirar seus sonhos do papel e colocá-los em prática, e certamente, esse era o seu destino.

Ser a garota que não correu em direção ao sol.

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⏰ Última atualização: Jan 09, 2022 ⏰

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