03. Santa Barbara

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Nathan Prescott;

A viagem seria longa. Estávamos dentro do trem já faziam de três à quatro horas. Meu estômago começava a dar sinal de falta de alimento. Logo começaria a roncar, eu tinha certeza. A locomotiva era rançosa, me surpreendia que não caía aos pedaços apenas por ver a cor externa apagada. Não havia maneira de se segurar ali dentro, portanto, eu fiquei sentado no mesmo lugar, recostado ao mesmo caixote. Hayden estava logo na minha frente e o trem seguia para mais uma estação. Já tínhamos passado por umas cinco e sempre era a mesma coisa: Torcíamos para que nós não fôssemos pegos, afinal, era uma viagem um tanto quanto clandestina. Estávamos em um vagão poucos metros atrás do meio, o que significava que  iríamos desembarcar no ponto final. Mesmo assim, o medo era inevitável. O barulho dos encaixes dos trilhos soava aos meus ouvidos como tortura. Eu estava de mau-humor por conta da fome, apenas. Estava de noite, haviam poucas estrelas no céu pelo que dava para se ver dali de dentro. Hayden e eu brincávamos com uma bolinha de papel que ele havia feito com um recibo que ele tinha encontrado largado. Ele jogava pra mim, deslizando-a pelo chão sujo e eu fazia o mesmo, devolvendo-a para ele. Era o único método de não morrer de tédio por ali e distrair o estômago.

Mais uma estação se passou. Ficávamos cerca de dez à vinte minutos parados em cada uma. Eu bufei, irritado com aquilo. 

— O que foi, irmão? — a voz de Hayden chamou a minha atenção.

— Eu tô com fome. — respondi emburrado.

Ele sabia bem como eu ficava quando estava com fome: insuportável

— É, não tem o que fazer. Vamos ter que esperar.

— Eu sei. — virei o rosto na direção do exterior. Não conseguíamos ver a estação de onde estávamos. Batuquei meus dedos no chão, sentindo a consistência da poeira invadir as pontas onde continham minhas digitais. — O que você acha que vai acontecer com a gente? Digo... Quando chegarmos na Califórnia.

— Eu não faço a mínima ideia. — disse ele em seu tom mais sincero. — Vamos ter que correr contra o tempo, essa é a verdade.

Nos calamos durante um bom período. Eu passei a língua entre os lábios.

— Você acha que... Que tem alguma chance de nossos pais... Você sabe... 

— Não. — ele estava convicto. — Eu... Estava esperando um pouco pra te contar, mas... — uma pausa longa. Ele desviou o olhar de mim para o chão, coçando a nuca, hesitante.

— ...Mas? — incentivei-o a continuar, erguendo uma sobrancelha. Nada do que ele falasse seria pior do que havíamos enfrentado na baía.

Hayden suspirou e voltou seu olhar para mim. Era visível que ele segurava algumas lágrimas. Seus olhos castanhos estavam marejados e avermelhados. 

— Mas eu vi, com... Com meus próprios olhos, a minha família inteira debaixo de destroços, feridos.

— Eu sinto muit... — não consegui terminar a frase.

— ...Seus pais também.

Me calei. A frase ressoou pela minha mente mais algumas vezes. Meus olhos azuis estavam arregalados, minha boca entre-aberta. Eu queria falar alguma coisa, mas não saía nada. Eu não queria saber como eles tinham morrido. Se uma casa tinha caído em cima deles, uma placa, eletrocutados ou afogados, não importava. Eles estavam mortos. Eu estava sozinho, isso é, se não fosse pelo meu melhor amigo e minha irmã, no Brasil, esta com quem eu não falava a um bom tempo. Ela tinha me mandado alguns e-mails, mas eu nem tive a chance de respondê-los. Sem celular agora seria ainda mais difícil. E falando em celular, Hayden tinha um em mãos, retirado do seu bolso da calça. Ergui o olhar pra ele. Pude ver que o aparelho estava todo quebrado, a tela não funcionava, estaria completamente apagada se não fosse por uns tilts. Ele suspirou. O clima tinha ficado pesado. Quando enfim abri a boca, fôra pra falar o que já sabíamos.

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⏰ Última atualização: Jan 08, 2019 ⏰

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