LIFE is a ruthless game

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Nada de bom começa em um carro de fuga. E ela sabia disso.

Caos. Sua cabeça, o espaço ao seu redor, o mundo lá fora. Caos. Era o que havia se tornado, o que era ela e sua vida agora. Flashes passavam por sua cabeça, fazendo seus olhos arderem como se tivessem sido atingidos por dois faróis: garrafas espalhadas pelo chão, o vestido de festa jogado em um canto do quarto daquele motel de beira estrada, uma mala aberta ao canto, memórias que ela não queria revisitar, mas que estavam ao seu lado enquanto dirigia um carro sem respeitar os limites de velocidade daquela rodovia escura.

Lacy era uma criminosa. Sem eufemismos, sem rodeios, uma criminosa. Roubara, mentira e seduzira para conseguir o que queria. Se saía muito bem no que fazia, até ser tola o suficiente para misturar os negócios com o amor. A história de como sua vida se tornou um circo de coisas bizarras e situações perturbadoras começou em um baile de gala, mais um evento pomposo e espalhafatoso que lhe cheirava a pessoas ricas, alheias e ingênuas demais a realidade do mundo, bobas demais para confiarem nela apenas por seu rostinho bonito e sorriso encantador. Ela sabia o que tinha que fazer naquela noite: seduzir com mentiras luminosas e roubar, então voltar para os braços do amante que a esperava em uma espécie de covil para comemorarem o sucesso - e, claro, para que ele se aproveitasse do que ela havia roubado - de mais uma jogada de sucesso de Lacy O'Brien, mesmo que tudo que ela quisesse fosse uma razão para deixar aquele cara. Mas não foi o que aconteceu. Lacy foi seduzida, envolvida por um par de olhos azuis, um sorriso de canto, gravata preta cara: Kurt Johnson foi o grande criminoso aquela noite. A encantou, se encaminhou para ela com o whysky caro em uma mão, e na outra um Old Fashioned que ela aceitou. Ah, aquilo não acabaria bem, nem mesmo se eles quisessem. Estavam amaldiçoados, uma queda livre que os destruiria, mas Lacy não podia evitar.

Kurt era um criminoso, como ela, mas tratava-se mais de um golpista de primeira, não um surrupiador como ela era. Ele seria sua luz da liberdade, pensou ela. "Nos aliamos e damos o fora daqui", sussurrou ao pé do seu ouvido naquela primeira noite juntos, os corpos ainda ofegantes e suados, os seios colados no peito dele, as mãos dele por toda parte. Toda parte, pensou, eles estão por toda parte, não vamos conseguir, eu deveria ir embora, nunca vamos chegar longe. Ele lhe sorriu, gargalhou, falou que nunca imaginou aquilo, uma proposta como aquela, mas ele sabia os riscos, sabia com quem ela estava metida e que estar com ela era problema. Mas ele não a deixou. Os encontros continuaram, os planos de fuga cada vez mais mirabolantes. Até que aconteceu.

25 de agosto. A quebra da prisão. Naquela noite Lacy seria livre do seu passado de subordinada, quebraria um ciclo vicioso. Mas antes de tudo, ela era uma traidora. Traidores nunca ganham, pensou ela. Mas não importava mais. Havia saído com tudo que conseguiu pegar do covil do desgraçado que se aproveitou dela por meses, estava no carro dirigido por Kurt, o coração dele soando como uma sirene, mas ela estava entornando uma garrafa de vodka e ria escandalosamente, o vestido amassado no corpo. Então aconteceu, um farol alto apontou no retrovisor, iluminando os olhos azuis de Kurt, tiros atingiram o vidro traseiro do carro. Então é isso, pensou, morrerei antes mesmo de viver. Lacy se abaixou antes de Kurt manobrar o carro para uma estrada de terra, a mulher ouviu a própria voz gritar "vai, vai, vai!" como se essas palavras pudessem afastar o mal que os perseguia. Mas afastou, surpreendemente eles o despistaram. Mas Lacy não se sentiu aliviada ou feliz quando Kurt e ela transaram no quarto de motel barato, quando ele declarou seu sentimentos por ela, quando sussurrou que a amava, quando sorriu para ela com a boca e os olhos, mas ela não correspondeu, apenas o abraçou mais forte, esperando que ele pudesse entender o seu "sinto muito" silencioso. Se sentiu suja, se sentiu uma traidora mais do que nunca, se sentiu mais vazia do que jamais esteve.

Já fazia um mês que Lacy e Kurt eram classe alta juntos, Bonnie e Clyde, mas ela não superava a podridão que se tornou por dentro, como podia deitar com o homem que a amava enquanto não sentia nada? Como podia continuar o usando como válvula de escape, quando ela era o porto seguro dele? Então fez o que fez. Em uma noite, enquanto Kurt bebia no bar do motel, Lacy voltou ao quarto mais cedo, observou a bagunça de suas roupas pelo chão, secou as lágrimas que insistiam em cair, puxou a mala aberta sobre a mesa de centro e encheu com o dinheiro das noites de assaltos e dos golpes aplicados, mas deixou as jóias furtadas. Pegou as chaves e correu. Não se preocupou com as roupas ou acessórios, não queria lembrar quem ela era, não queria fantasmas do passado, seguiria em frente, teria uma nova identidade. Correu pelos fundos do motel até o carro, um carro de fuga agora, entrou e deu partida. Traidora, traidora, traidora, traidora. Bateu as mãos no volante e sentiu as lágrimas queimarem enquanto desciam pelo rosto e escorregavam para o colo. Ouviu as sirenes, viu as luzes. A polícia havia chegado. Lacy entregara Kurt. Precisava entregar Kurt para ser livre. Ele não podia fingir que era um mistério, sabia onde tinha a conhecido. Lacy havia passado para o outro lado, e passara de forma suja, assim como tudo que a envolvia.

Então ali estava ela, indo para longe, diringo um carro de fuga, chorando, morrendo num carro de fuga. Dizendo adeus em um carro de fuga. Lacy era passado. Parou o carro em um matagal na beira da estrada, pegou a mala, tomou o trem e, ao sair da estação, andou até um hotel em Nova York, onde se identificou como Taylor.

Getaway CarWhere stories live. Discover now