Vivendo em dois mundos

Maria Elisa

Eu sou Maria Elisa, mais aqui na comunidade todos me chamam de Lisa. Moro do Complexo do Chapadão.

Fui criada e nascida aqui, meus choros e meus sorrisos foram aqui, foi aqui que perdi as duas mulheres da minha vida, a minha vó e minha mãe. Minha vó morreu de ataque cardíaco quando ela soube que meu tio entrou nessa vida, que ela sempre teve medo, não medo dele entrar mais sim nunca mais sair, morrer ou ir pra cadeia, apesar que minha véia acordaria o mais cedo possível pra ir ver ele, mais e a morte? Acredite é muito mais doloroso ver sua cria morta, do que sua cria ver você morta. Então ela teve um ataque cardíaco, pensa no que foi tudo isso, ela morreu quando eu tinha só meus 16 anos, foi a quarta-feira mais dolorida pra mim, pra todos, afinal dona Carmen movia esse morro, com sorrisos, ajuda e puxões de orelha. Já minha mãe morreu de câncer, ela descobriu assim que minha vó faleceu, foi três anos de quimioterapia, de luta, e então se foi em pleno sábado, dia de baile, que não teve, porquê aqui é assim, um morre todos de luto, eu simplesmente fiquei sem chão, durante uma semana eu não sai do meu quarto, no domingo sem ser o dia depois que minha rainha morreu, meu tio ajuntou com os amigos dele e colocaram meu colchão no meio da rua, vê se pode? E ainda por cima meus amigos tacaram ovo, farinha, bororoga em mim, meus 19 anos finalmente chegou, o que eu fiz? Simplesmente fiz meu tio comprar outro colchão pra mim, roupas de cama porque realmente a situação estava feia.

Três dias depois meu tio foi nomeado a dono do morro do Chapadão. Vocês devem estar se perguntando como, bom ele era braço direito do dono que morreu com um tiro bem no peito quando dormia, como isso aconteceu? A mulher dele pegou ele no flagra traindo e aconteceu isso, meu tio já tava nesse meio mais anos do que sabíamos, ele tinha entrado quando eu tinha 10 anos, e minha vó só descobriu 6 anos depois, e o resultado foi sua morte.

Meu tio mudou para uma casa maior, umas ruas acima da minha.

Des dos meus 16 anos eu trabalho em uma loja de roupas no shopping, e a três meses fui concedida a gerente, pensa só, Maria Elisa Ferreira gerente, mona mour, eu fiz foi um show, e foi na aonde? Isso mesmo na minha casa, na minha pia, lavando minhas vasilhas, sempre parando pra cantar com o meu Bruninho com o detergente de microfone, e as vezes apartando e sem querer caindo na minha boca, orra, minha vó fez eu lavar minha boca de lá de cima, nossa senhora em, se vocês amam também Sorriso Maroto, pessoas se juntem comigo e vamos fazer um grupo, vai que eles nos notem, felicidade mil.

Vem quente que eu tô fervendo queridos.

O meu luto em ralação a minha mãe, eu só sai pra trabalhar e faculdade durante uns três meses, quando eu voltei pra minha casa toda suja por causa das gororobas, ovos, fui no quarto dela pegar uma toalha, e achei uma carta pra mim, e nela dizia pra eu viver intensamente, e é isso que eu faço, irei fazer 21 anos daqui dois meses, e a felicidade a mil.

Desde criança minha mãe me colocou em cursos, dança, línguas, e diversas coisas, finalizei tudo com 14 anos, só continuei com a dança que é o meu lar, isso resulta em eu dar aula hoje em dia, fiz sim aula de balé e blá blá blá , mais o negócio aqui é dança contemporânea, ô meu amor, eu arraso em. Minha fia, eu sou pobre mais tenho cultura e inteligência.

Eu dou aula aqui pras crianças aos sábados de manhã. É muito bom vê eles amando algo.

Faço faculdade de arquitetura, e com isso vêm os estágios, tô louca pra começar.

Eu nunca sofri com decepção  amorosa, nunca namorei, eu tenho minha mãe como espelho, meu pai largou dela quando eu tinha três anos então eu cresci com um pensamento, namoro/casamento não, vai curtir tua vida primeiro e é isso. Mais vou te dizer, meu tio, a senhor, sofre comigo em, pensa em um homem ciumento, ele ouve aqui e ali dos meus casos que não são casos, e quando ele vem falar comigo eu simplesmente me faço de sonsa, porquê deixa eu falar uma coisa, irônica, debochada, sonsa eu sou, e uso na horas certas.