Rodeado de pessoas... Como sempre.
Eram raríssimas as vezes em que eu o encontrava sem várias pessoas ao seu redor. Não está errado, ele definitivamente é incrível, o melhor.
Eu? Eu não sou nada.
Passei rapidamente ao lado do grupo de pessoas, indo em direção ao meu armário. Por que eles não iam para outro lugar?
Olhei de relance as pessoas que compunham o grupo e avistei apenas pessoas maravilhosas. A garota com as melhores notas, um jogador do time, o outro é o melhor desenhista que já vi, também tem a garota mais espontânea já vista e ele. Ele, rodeado de todos os outros, o garoto mais carismático e incrível que já tive a honra de ter em minha visão. Lindo? Sim ele é lindo, mas não é apenas isso o que faz incrível. Já o vi várias e várias vezes ajudando os outros, nos mais diversos problemas. É alguém de confiança e responsável, além de respeitoso. Incrível.
Eu? Eu não sou nada.
Ele olha para mim e percebe que eu observo. Me manda um sorriso e acena em minha direção. Droga!
Pego minhas coisas, fecho rapidamente o armário e saio imediatamente do local onde estou. Para ser mais específica, saio imediatamente de perto de todas aquelas pessoas deslumbrantes em direção do banheiro mais próximo.
Entro. Fecho a porta. Tranco.
Respiro repetidas vezes até me sentir calma. Quero ficar calma. Vou ficar calma. Estou calma. Pronto, problema resolvido.
Levanto a cabeça e avisto uma imagem no espelho. Me assusto. O que é isso? Me aproximo um pouco, podendo ver a imagem mais nítida. Sou eu. Me assustei com minha própria imagem. Uma imagem horrível é a que vejo no espelho, tão horrível que não quero nem olhar.
Uma garota pálida, meus olhos são horríveis, meus cabelos uma bagunça, minha boca um desespero. Isso apenas da parte física, mas eu vejo também além disso. Uma garota sem talento, sem carisma, sem habilidades... vejo uma garota sem vida.
Essa sou eu. Eu não sou nada.
Por que não posso ser como ele? Parece não ter fardos a carregar. Por que não posso ter todos ao meu redor, pessoas que me admirem e que eu possa admirar? Por que tive que vir ao mundo assim?
Não quero mais. Não quero mais ver essa imagem ao olhar-me no espelho. Como faço para acabar? Eu quero acabar com isso. Acabar com tudo de uma vez. Afinal, pra que continuar? Não importa quanto tempo passe, o que eu sou não vai mudar.
O que sou? Eu não sou nada.
Me sinto sufocada neste lugar fechado. Minha visão está turva. Quero sair desse lugar horrível e apertado.
Destranco a porta e saio correndo em busca de ar. Ar! Ar! Ar! Eu preciso de ar! Procuro em minha mente o lugar mais aberto que posso ter acesso imediato. Onde? Onde? On...? O Jardim! Sim, o jardim. É para lá que irei.
Movo minhas pernas o máximo que posso, sem me importar com o que está ao meu redor. Eu só preciso chegar lá, preciso ir para o jardim.
Chego no local e me sinto bem por um milésimo de segundo, antes do pulmão gritar e reclamar, exigindo o ar que gastei nesta corrida. Curvo o corpo, apoiando minhas mãos nos joelhos. Bem melhor.
Levanto levemente a cabeça e um olhar assustado entra em minha visão. Assusto-me tanto que acabo caindo sentada. Ele. Ele que é o melhor de todos os que já vi me olha com uma expressão assustada. Os olhos molhados e o nariz levemente avermelhado indicam que estava chorando. Por quê?
-Desculpe, assustei você?
Ele pergunta com a voz levemente embargada, enxugando as lágrimas de seus olhos.
-Não. Estou bem.
-Que bom.
Fico admirando-o no silêncio. Ele também me olha e nada diz. Ficamos assim, imersos no silêncio.
Aproveito o tempo para observa-lo. O cabelo bagunçado, os olhos em um lindo castanho agora estão avermelhados, está usando uma calça jeans e um tênis preto. A camisa verde o deixa extremamente charmoso. Verde, verde me lembra esperança, alegria.
Olho novamente seus olhos, ele continua me observando. Por que estava chorando?
-Aconteceu algo? Não me parece bem.
Ele me olha surpreso, talvez não esperasse que eu fosse perguntar. Realmente, eu não ia, porém a curiosidade foi mais forte e não consegui controlar-me.
A surpresa não dura 3 segundos e, após encostar-se no muro, ele dá de ombros.
-As vezes preciso chorar, serve para lavar tudo aquilo o que me atormenta.
-Tens algo que te atormenta? Me pergunto o que seria.
-Acha que não tenho algo a me atormentar?
-Em minha visão, diria que sim. És alguém incrível, carismático, talentoso. Estás sempre rodeado de pessoas. Por que teria algo a te atormentar?
-Não entendes? A pior das solidões é aquela que se sente sozinho quando se está rodeado de pessoas. Aliás, não me acho tudo isso que disseste, na verdade, não sou um terço das coisas boas que citou. Agora, se me permite, gostaria de fazer-te uma pergunta.
-Pois faça. Respondo-te se puder.
-Falaste várias coisas boas de mim. O que acha de si mesma?
-O que acho de mim? Eu não sou nada. Apenas isso.
-Nada? Pois eu vejo diferente. Tu és fascinante. A mais dedicada e esforçada entre as pessoas que conheço, isso não há nada que se possa comparar. Além de sua pele delicada que me atrai, sua boca sempre levemente rosada e seus olhos verdes. Verde, para mim, significa esperança e alegria. És bela de todas as formas, nunca duvides disso. Te direi uma coisa, sempre que precisar chorar ou gritar ao mundo para desabafar sobre os fardos da vida, estarei aqui para te escutar. Conte sempre comigo.
-Entendo enfim qual o fardo que carregas. -Ele me olha confuso e continuo- Carregas o fardo dos outros, procura ajudar a todos e tens medo de não conseguir, mas também se recusa a desistir. Pois bem, carregarei tal fardo contigo, pode dividi-lo comigo.
Ele me olha surpreso. Fica observando-me por alguns segundos antes de se levantar com um sorriso.
-És a primeira a perceber o que me atormenta. Agora percebo que mesmo sendo calada, na maior parte do tempo, tens muito a dizer. Agradeço-te.
E é com essas palavras que ele sai. Deixando-me para pensar.
[...]
-Por que está sempre observando ele?
Uma voz me tira dos meus devaneios, mas não paro de olhar o maravilhoso garoto em minha visão, a uma pequena distância.
-Porque o amo.
-Não acho que seja verdade. Nunca diz nada.
Olho para a garota que conversa comigo ao meu lado. Me olha com uma carinha de dúvida e esperteza.
-Quem disse que pessoas caladas não podem amar?
Ela parece não saber o que responder, então decido voltar a observar o garoto a poucos metros de mim.
Assim que meu olhar o encontra, percebo que ele também olha para mim. Ele sorri e eu devolvo com o meu sorriso mais sincero.
Ele? Ele é meu salvador. Aquele que me ajudou quando eu já não acreditava mais em mim.
Eu? Eu sou seu mundo. Aquela que o entende com poucas palavras.
E o verde? O verde é a cor da esperança, que nos uniu em uma tarde de fardos e tormentos.
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Contos E Cores
ContoPequenos contos baseados em cores diversas e assuntos aleatórios. Histórias curtas e simples que me deram muita vontade de escrever. Espero que apreciem.