Capítulo Um

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Escutem a música Feel Something do Jaymes Young pra ler. A fic é inspirada nela.

Boa leitura sz

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Eu andava por aquela rua fria e úmida da cidade como quem não se importa com a hora passando. As pessoas passavam por mim feito jatos, apressadas para chegar em algum lugar, são todos tão iguais, mesmo sendo pessoas diferentes. É monótono. Não que eu me visse diferente deles, eu nem sabia mais quem eu era àquele ponto do campeonato. Só estava ali existindo, esperando a morte vir até mim, porque nem pra ir até ela sozinho eu tinha capacidade.

Acontece que quando se vive demais, as coisas vão perdendo a cor, o brilho. Não digo no sentido de viver vários anos, mas sim de ter vivido muitas coisas. Eu já fiz tantas coisas nesses vinte e sete anos de vida, que mais nada tem graça para mim. Estou entorpecido. Acho que minha cota de coisas novas a fazer já se excedeu. E eu não me importo com isso, já tive minhas crises por não ter ou não saber o que fazer da vida. Agora passei da fase de aceitação.

Depois muitos empregos perdidos; depois de brigar com todos os amigos possíveis e me afastar deles; depois de aceitar que eu não sei que vocação seguir para ser capaz de fazer uma faculdade; depois de descobrir que ninguém iria querer algo amoroso comigo justamente porque sou um zé ninguém que não tem onde cair morto; depois de ser ignorado pelos próprios pais como se eu nem tivesse sido concebido por eles; e depois de várias outras experiências não tão relevantes mas que deixaram uma baita cicatriz, eu passei a só seguir em frente. Alguém me deixou? Ok, é só mais um. Perdi outro emprego? Ok, mais um. Deu algo errado pela enésima vez? Tá. Nada funciona nessa merda de vida que eu tenho. Foi por causa de tudo isso que eu acabei caindo onde estou atualmente e não pretendo sair tão cedo.

Abri a porta do apartamento em que eu moro, que está mais para uma kitnet, sentindo o cheiro das bebidas que eu compro nas noites em que ninguém me quer. Sempre acabo derramando alguma garrafa por aí. Eram sete horas e eu estava chegando em casa da boate em que eu atualmente trabalho. Foi minha última opção trabalhar lá. Eu já havia ajudado algumas vezes como barman quando perdia algum emprego e não tinha dinheiro pra pagar o aluguel do mês. Não era um local que eu gostava, mas eu também não desgostava.

O dono do lugar é meio camarada, gente boa, disse que eu trabalhava bem e me ofereceu uma vaga, mas dessa vez não seria de barman e eu ganharia mais. Eu sempre soube que aquela boate tinha um salão separado para os ricos gays encubados que se casavam com mulheres igualmente ricas para aumentar os lucros dos negócios. Era lá que eu trabalhava agora, como dançarino. Não que eu fosse bom dançarino, era só eu ficar sensualizando em cima de uma mesa cheia de luz azul e vermelha que eles se contentavam e jogavam dinheiro aos montes. Eu não me importava nem um pouco de usar roupas que mostrassem até demais do meu corpo, confesso que sempre fui meio vaidoso, talvez até um pouco narcisista.

Enfim, eu dançava na boate mas, algumas vezes também ia para os quartos. Quando ofereciam uma bela de uma grana, ou simplesmente quando o cara me chamava a atenção. A segunda opção era bem rara, a maioria dos caras que iam naquela parte da boate eram velhos, feios e gordos. Mas eram ricos. De que importa a beleza se você não tem onde cair morto? Era o meu caso.

Comecei a tirar a roupa da noite anterior enquanto já largava os sapatos na porta. Fui jogando tudo pela casa no caminho para o banheiro, eu voltaria para pegar quando fosse limpar todo o resto do local.

Já no banheiro terminei tirando a calça e a cueca boxer, liguei o chuveiro e fiquei por um bom tempo debaixo daquela água quente sentindo todos os meus nervos relaxarem. Acho que essa é a única sensação que vai sempre ser boa pra mim, nunca vou me cansar de um bom banho quente depois de uma noite cansativa.

Feel SomethingOnde histórias criam vida. Descubra agora