Eren invejava as esculturas. Não pela maneira como Levi as tocava, manipulando o gesso, criando figuras belíssimas, mas sim por sua imutabilidade, sua resistência perante o tempo. Uma resistência que seu corpo nunca teria.
Levi nunca se cansava de falar no quanto o namorado era lindo, mais do que qualquer uma de suas esculturas, mais do que ele jamais poderia criar com as próprias mãos, mas não era o suficiente.
A beleza de Eren, assim como tudo o que ele sempre foi, um dia acabaria. Ele e envelheceria e murcharia até sua morte.
Essa imagem mental o nauseava, o entristecia saber que algum dia estaria a sete palmos abaixo da terra, sendo devorado por vermes até que nada restasse além de ossos.
Sozinho no ateliê de Levi, Eren costumava ficar parado por horas, contemplando a arte de seu namorado com olhos cobiçosos, ansiando ser como aquelas peças. Desejando que o frio do gesso preenchesse o vazio de sua existência.
Sua obsessão não passava despercebida por Levi, na verdade, chegava a fasciná-lo. Levi, assim como qualquer artista, queria que sua arte fosse apreciada, mas nenhum elogio, leigo ou crítico, poderia ter o mesmo efeito que uma simples frase que saísse dos lábios de Eren.
-Uma verdadeira obra de arte - diziam os críticos.
-Um pouco sem graça - rebatia Eren.
E Levi começava do zero, até receber aprovação do namorado. Eren era inteligente, tinha bons olhos e Levi sabia disso, quando fazia os ajustes sugeridos por ele, o público ficava ainda mais estupefato do que antes.
Levi podia ter as mãos de um escultor, habilidosas e calejadas pelo trabalho, mas a genialidade por trás de tudo vinha de Eren, mesmo que ele não recebesse nenhum mérito no fim das contas.
Eren não desejava glória, fama ou dinheiro, seu único desejo era permanecer ali, para sempre, ao lado de Levi e suas obras, sonho impossível de ser realizado dentro da limitação humana.
-Eu posso fazer uma a sua imagem - Levi disse a ele, certo dia.
Fazia tempo que queria criar algo a partir do namorado e talvez, com isso, acalmar sua obsessão.
Poderia dizer que esculpir a semelhança do homem que mais amava era sua própria obsessão.
Eren aceitou posar para ele e, em questão de poucos dias, a escultura estava pronta. Era magnífica, imponente, em tamanho real.
Levi gastara todo seu suor e capacidade em sua criação e esperou pacientemente que Eren dissesse alguma coisa.
Eren encarou a escultura longamente, com olhos brilhantes como Levi nunca havia visto.
-É isso - disse, finalmente - essa é a minha resposta.
Levi esperou por uma explicação, de braços cruzados e ansiedade crescente. O namorado o encarou, os grandes olhos verdes cheios devida.
-É isso o que eu quero ser, Levi.
-Você não está fazendo sentido - respondeu o artista, perdendo a paciência - Você gostou ou não?
-É perfeita.
Levi relaxou um pouco ao ouvir aquilo, mas ele sabia que havia algo mais. Nunca havia visto Eren calmo de uma maneira que não fosse mórbida.
-Eu quero ser como ele, ou melhor, quero ser ele - continuou Eren, apontando para a estátua, empolgado como se tivesse encontrado o sentido de sua vida.
-O que raios isso quer dizer?
Eren se levantou, aproximando-se do namorado para envolver seu rosto com as mãos.
Seu toque era frio.
-Cubra-me com gesso. Faça de mim a maior obra, conceda-me este presente.
Era loucura, insanidade, mas não impossível. A loucura é a virtude dos artistas e Levi sentiu sua mente sucumbir ao ouvir aquelas palavras.
-Claro, Eren, tudo o que você quiser.
"Será a minha maior criação. Não haverá outros olhos além dos meus que o contemplarão. Meu Eren, somente meu, para sempre."
Pensava ter atingido seu limite quando Eren aceitara posar para ele em sua última escultura, mas estava enganado. Seu ultimato se apresentava agora. O universo exigiria seu preço, o sangue de suas mãos e as lágrimas pelo que estava prestes a fazer.
Aquela seria sua mais magnífica obra, nascida a partir homem que desejava o dom de um Deus. Seria também seu maior sacrifício, o qual lamentaria pelo resto de sua existência.
Riu de sua desgraça, sabendo que o conceito de eternidade de Eren não lhe incluía, mas isso não importava, ele estaria feliz e isso bastava.
Começou seu trabalho. Os dedos ágeis moldavam o material a sua vontade, sem mudar detalhes, sem acrescentar nem tirar, construindo por cima de Eren exatamente o que ele era. Marcando cada mecha de cabelo, cada traço do rosto cansado, delineando cada curva do corpo nu que, desacordado pelo veneno, passivamente aceitava todo o processo.
Em algum momento, Levi sentiu seu rosto molhado de choro, mas não se atreveu a parar.
A posição da escultura era algo que já havia imaginado por dias afio, repassando-a mentalmente infinitas vezes antes de reproduzi-la em tamanho real. Não havia dúvidas, seria a forma perfeita.
Ficaria de pé, com nada além de um manto para lhe cobrir a intimidade, um dos braços estaria levantado aos céus, clamando dele o presente da imortalidade.
Jaeger agora era arte, puro e completo, eterno como sempre sonhara.
Para Levi, aquele seria seu santuário particular, a frente do qual se colocaria de joelhos e confessaria seu amor nos anos solitários que viriam.
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Divine
Fanfiction- Cubra-me com gesso. Faça de mim a maior obra, conceda-me este presente. A loucura é a virtude dos artistas e Levi sentiu sua mente sucumbir ao ouvir aquelas palavras. - Claro, Eren, tudo o que você quiser.