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25.02.2019

Querido Renjun,

Não sei por onde começar esta carta, até porque, nunca sei como começar algo quando é com você. Seu sorriso me faz querer derreter, seus olhos me encarando me fazem querer sumir por vergonha, sua risada me contagia e faz querer rir junto, não importa o quão triste eu esteja.

Isso tudo porque eu te amo. Eu simplesmente te amo. Duas ou três palavrinhas que significam tudo para alguns, e, ao mesmo, nada para outros. Mas para mim particularmente, significa o mundo, porque significa você, e você é meu mundo. Você é meu chão quando tudo vai mal, é o que me mantém firme quando tudo coopera para que eu caia.

Estávamos bem como melhores amigos, quase irmãos, mas eu me apaixonei por ti, pela pessoa incrível que você é, ou melhor, você não é uma pessoa, as pessoas são horríveis e fazem de tudo para acabar com você. Você é um anjo. Meu anjo, que Deus colocou aqui para cuidar de mim.

Para minha sorte, você também nutria sentimentos por mim. Você não sabe o quanto eu fiquei feliz ao saber disso, saber que meu melhor amigo que eu amo, me ama da mesma forma, mesmo que seja ela "incomum".

Começamos a namorar.

Estávamos muito felizes. Poder te abraçar, poder enfim beijar os lábios que eu tanto admirava, poder te chamar para assistir um filme em casa, mas acabar por trocarmos carícias em vez de assistir de fato.

E então, tudo começou.

O mundo não podia nos ver felizes assim, ele não conseguia. Precisava fazer algo para acabar conosco. Nos destruir internamente de pouco a pouco.

Então vieram as pessoas nos julgando após saber de nosso relacionamento. Até amigos próximos que eu pensei que estariam comigo para tudo me abandonaram. Não sei o que fiz de errado. Namorar alguém que eu amo não é errado, independente do sexo, da cor, da etnia, da altura. Não importa. Eu escolho quem eu quero amar, meu coração escolhe.

E então, nossos pais, que até então não sabiam totalmente. Minha mãe começou a me olhar torto sempre, meu pai me xingava e as vezes chegava ao ponto da agressão. Eu não estava nem aí. Alguns roxos e cortes nunca me impediriam de continuar te amando.

Mas então, você apareceu com machucados. Graças aos garotos do seu condômino, você estava péssimo. Tanto física como mentalmente. Isso me destruiu. Você sorria dizendo que estava bem, que aguentaria aquilo por mim, por nós. Eu acreditei.

Acreditar naquilo foi minha pior decisão.

A cada dia você aparecia com mais machucados. A cada dia seu sorriso sumia de seu rosto. A cada dia os "eu te amo" e "estou bem" ficavam repetitivos, quase como uma reza em que você apenas repete as palavras sempre, sem atentar para o significado delas.

Eu tentei, tentei realmente te proteger. Eu falhei. Falhei miseravelmente. Tentei denunciar à polícia, que ignorou por também serem homofóbicos. Tentei falar com seus pais. Minha segunda pior decisão. Eles tiraram daí a desculpa que tanto procuravam para terminar esse relacionamento. Eu não terminaria. Não assim. Não por eles. Tentei falar com os garotos do condomínio. Irônico eu também ter levado uma boa surra.

Eu quis desistir ali, sentado no chão, sentindo o sangue em mim, a dor me consumir, as lágrimas descerem pelo meu rosto. Então você chegou correndo. Até hoje me pergunto como me reconheceu ali, naquele estado. Você me ajudou, sorriu confortante e cuidou dos machucados, me abraçando cuidadosamente, como se eu fosse desmanchar se você me apertasse um pouco. Ah, amor. Eu já estava desmanchado.

Eu fingi que aquilo não havia acontecido. Sim, eu continuaria, ainda te amava demais para desistir. Já havia me acostumado com o mundo me atacando de todos os lados, afinal, você estava comigo, então eu aguentaria tudo.

Até aquele dia.

Lembro como se fosse hoje mesmo. 25 de fevereiro de 2018. Sua mãe me ligou dizendo que você havia se suicidado. Não me deixou lhe ver, tampouco me disse como você havia feito tal coisa. Eu chorei. Berrei. Esperniei. Estava abalado e frustrado, meu amor havia ido embora e eu não pude sequer me despedir. Até que seu irmão um dia me entregou uma carta. Era sua para mim, e mesmo ele não gostando tanto desse relacionamento, tinha maturidade e empatia para entender o que eu estava passando.

Na carta dizia que você me amava, que você queria muito aguentar por mim, mas não conseguia mais voltar para casa todo dia ensanguentado, ouvir palavras duras de seus progenitores e então acordar sorrindo como se nada tivesse acontecido. Você estava cansado, e eu entendo. Só não queria que fosse assim. Queria poder ter te protegido, mas, como dito antes, eu falhei. Miseravelmente.

Eu me sinto péssimo sem você. Todos os dias perderam a cor, porque eu sabia que não poderia te abraçar, te beijar ou sequer ver seu sorriso. Você não estava ali.

E mesmo sem ter algum relacionamento com um garoto, meus pais continuavam da mesma forma, e eu não sabia mais o significado de amigos. Minha rotina se resumiu à ir para o colégio e então quando voltar, me trancar no quarto. Eu sequer comia ou dormia.

Fui diagnosticado com depressão e anemia. Mas eu não dava a mínima. Minha doença eram essas pessoas próximo à mim.

Eu aguentei um ano. Um longo ano, do qual eu me olhava no espelho e não me reconhecia. Eu não era mais o mesmo, e sentia vontade de morrer ao lembrar do menino alegre que eu já fui. Você levou minha alegria com você, mas não se culpe, a culpa nunca foi nem nunca será sua. A culpa foi minha por em algum momento acreditar na felicidade. A culpa foi do mundo por não nos querer felizes.

E agora, eu desisto. Assim como você desistiu, eu estou desistindo. Escolhi o mesmo dia que você, me deixa de alguma forma mais perto de ti e decidido quanto à isso.

Sei que nunca irá ler isso. Sei que talvez não nos encontremos se não existir isso de "vida após a morte". Sei que na sua carta você me pedia para ser forte e aguentar aquilo, mas eu simplesmente não consigo sem ti.

Então, prestes a tomar uma enorme quantia de antidepressivos e ir dessa para melhor, eu termino de escrever esta carta e faço minha última declaração à ti.

Eu te amo demais. Meu Huang Renjun, meu pequeno anjo, minha antes motivação de continuar, meu melhor amigo que se tornou algo mais e que poderia ter se tornado mais ainda se a vida não nos tivesse separado.

Eu simplesmente te amo.

Com amor, Mark Lee.

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