26 - neófito

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- Erich?!

Eu solto um gemido. Meu corpo está estranho, meio dormente. Meu rosto está todo coberto.

- ERICH! Erich! V-você tá vivo! Eu não acredito! E-eu jurava que tinha morrido, meu Deus! V-você... - e sem saber o que dizer em seguida, ela explode em prantos, soluçando e quase histérica.

- Fogo, está me apertando... - sussurro.

Mas continuo sendo abraçado por Fogo do mesmo jeito que se abraça um boneco de pano. O teto é iluminado, como o da sala enevoada, mas parece que eu estou numa fantasia. Meus olhos demoram a se acostumar com aquela visão nova. Vejo o cabelo ruivo da menina bater de leve em meu ombro e sinto uma felicidade tão grande por estar com ela, por regressar, por tudo. Apenas não consigo demonstrar; estou meio que recuperando as coisas.

- Me desculpa. - ela fala, mas as desculpas devem se referir a outra coisa, e não necessariamente à força do seu abraço. - Eu não acredito, você está... vivo.

Estou numa cama de hospital, com a mesma roupa preta de antes e com a máscara no rosto, quase fincada na minha pele, tornando a minha visão não muito diferente de quando eu estava sem ela. Há eletrodos na parte traseira da minha cabeça e no meu tórax. Não há máquinas ali perto, mas obviamente alguém estava monitorando minha atividade neural e cardíaca. Olho para os lados e percebo que a sala é muito menor que a sala enevoada. Ou talvez não seja. Será que eu não estava alucinando antes?

Ouço palmas.

- Parabéns, Erich. Você concluiu o teste. - a voz de Ceifeiro chega aos meus ouvidos, diferente. - Como está?

Olho para o lado de novo e o identifico. Como eu não havia o percebido?

- Ah, bem...

- Tente se sentar. Não precisa ter pressa.

Eu o obedeço. Noto que estou ensopado de suor quando minhas costas desgrudam do pano da colcha.

- Você se debateu bastante e seu corpo reagiu de forma bem intensa a tudo. Tente não fazer nenhum esforço muito grande.

De fato a sensação de dormência vai se tornando uma sensação de enfado, como se eu tivesse feito uma atividade muito potente. Músculos, órgãos internos, glândulas e a própria cabeça; todos se recuperando de algo. Bem, isso somado ao saldo do teste de infiltração.

Queria não me sentir tão esquisito agora, mas a situação é tão bom inusitada.

Ceifeiro faz alguns exercícios respiratórios e cardíacos comigo e vai me introduzindo a um alongamento moderado e lento. A máscara não facilita muito, mas eu sou aconselhado a não retira-la. Em relação ao meu cérebro, ele vai me trazendo pouco a pouco ao aqui-e-agora. Demora alguns minutos e Fogo fica apreensiva durante todo esse período. Nervosa, ainda chorando, mas bem mais recomposta.

E aí eu me levanto.

- Por que não se olha no espelho? - Ceifeiro sugere.

Fogo está emocionada. O próprio Ceifeiro parece estar ligeiramente animado com a minha conquista, embora eu ainda esteja muito confuso. É quieto demais.

Vendo bem parece a sala que eu entrei antes do teste de infiltração. Vagamente a tinha observado antes de desmaiar, mas aquela visão foi muito duvidosa. Agora é bem mais real. Há um espelho na lateral do quarto. Não sei o que espero ver ali, mas não penso muito nisso, apenas continuo andando até alcançar o vidro. Fogo tem um olhar quase complacente, o que é muito estranho.

Minha mente dá um solavanco quase que fatal quando me olho, como se ela estivesse reagindo a uma anestesia. O reflexo visto meio que me faz viajar abruptamente em uma jornada muito introspectiva. Minha mente transcende todo o transe experimentado, completando as lacunas incompletas com os fatos ocorridos, uma mistura de cores mexidas e vibrantes com efeitos paranoicos revelando-me vislumbres rápidos do tempo passado juntos com a imagem que vejo agora. De repente todo o teste pareceu ter me mudado por completo, quero dizer, mudado meu ponto de vista, minha identidade. Minha visão gira e me faz assistir todo o meu teste em um segundo ou milésimo de segundo. Só sei que quando desperto, meu estômago parece ter caído de uma altura de mil pés.

Máscara Negra - ImpactoOnde histórias criam vida. Descubra agora