Carla havia tomado uma decisão.
Sempre andou de mãos dadas com a morte e nunca lhe importou realmente se voltaria para casa ao fim do dia ou não. Sobrevivia um dia por vez e fazia o necessário para chegar ao fim dele respirando.
De fato, havia trilhado um caminho sangrento e cheio de desvios sombrios, onde fez coisas que, em seus piores pesadelos infantis, jamais imaginou. Sim, era o monstro que Carolina afirmou, mas até mesmo as feras amavam e ela amava Carolina desde o instante em que seus olhares se cruzaram pela primeira vez, embora fosse ainda uma menina. Encontrou vida na escuridão de seus olhos e quando Marcos lhe propôs trabalhar para ele ou morrer, mesmo a morte lhe parecendo bem-vinda, escolheu a vida que viu no olhar dela.
Naquelas íris escuras, também encontrou forças para manter em equilíbrio a luz e a escuridão dentro de si. Era monstro, mas também era humana e prova disso era o amor que sentia pela moça.
Situações como a que havia acabado de acontecer não eram incomuns em sua vida. Havia sempre a possibilidade de ser sugada pelas trevas em seu caminho, afinal, poucas eram as pessoas em seu ramo de negócios que morriam de velhice e, tinha certeza, não faria parte desse grupo.
Sendo assim, queria que Carolina soubesse suas reais intensões e o quanto significava para ela, principalmente, porque apesar de ter se livrado de Joaquim, seus problemas estavam longe de acabar.
— Eu te amo — repetiu.
Abalada com a força com que suas palavras a atingiram e as lágrimas em seu olhar, Carolina quis se afastar outra vez, mas Carla ainda mantinha firme a pressão em sua mão. A loira podia ver a incredulidade em seus olhos, mas também observou com alegria o rubor em sua face. Carolina gostava dela, talvez não da mesma forma que se sentia, mas nutria sentimentos por ela, mesmo que fosse apenas desejo.
Carolina puxou a mão com força e recuou um passo no instante em que a bolsa de gelo que segurava atingiu o chão. Seus olhos vagaram desnorteados para longe da figura dela, enquanto suas mãos tremiam de emoção.
— Eu preciso ir — disse com o coração aos pulos e começou a se afastar, ciente de que se ela voltasse a repetir aquela frase não teria mais forças para sair daquele quarto.
— Não fuja — Carla pediu.
Ela já havia alcançado a porta e apertava firme a maçaneta, mas não a abriu e nem se voltou para fita-la quando continuou a falar.
— Se quiser partir, é um direito seu. Não irei impedir. Mas, poderia me ouvir antes?
Carla mantinha-se parada no mesmo lugar observando-a por segundos intermináveis, ansiando fazer o que jamais se permitiu: desnudar sua alma.
Como Carolina permaneceu algum tempo imóvel e sem dar indicativos do que iria fazer, com passos leves e ligeiros, Carla cruzou a distância que as separava e pousou a mão sobre a dela na maçaneta no exato momento em que se decidiu e abria a porta.
— Por favor — pediu. — Sei que não é o momento mais adequado, mas gostaria que me ouvisse antes de "partir".
— Não sei se quero ouvi-la — confessou, temerosa de que as palavras dela a fizessem mudar de ideia sobre as decisões que havia tomado mais cedo.
— Por favor! — Carla voltou a pedir, aumentando a pressão em sua mão. Precisava, desesperadamente, que ela a ouvisse. — Serão apenas alguns minutos e a deixarei livre para partir com a promessa de que jamais voltará a me ver e nem mesmo Marcos voltará a incomodá-la.
A ideia de que nunca mais se veriam soou dolorosa para ambas.
Carolina mordiscou o lábio, cedendo. Não pela possibilidade de cruzar aquela porta como uma mulher livre e com um futuro longe de toda a escuridão que envolvia o padrasto e aquela mulher terrivelmente linda e cruel ao seu lado, mas sim, porque queria ouvir o que tinha a dizer. Ansiava por beber de suas palavras, saber de seus sentimentos, enxerga-los em seu olhar como havia feito segundos antes.
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Crimes do Amor
RomanceCarolina via em Carla Maciel apenas uma assassina, uma mulher linda e cruel a quem devia temer e aprendeu a odiar. No entanto, jamais seria capaz de imaginar a verdade que se escondia por trás de seus gestos e olhares frios, até que ela a "aprisiono...