26.

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Naquele milésimo de segundo em que o viu colocar o dedo no gatilho e firmar a mira, Carolina descobriu que ainda não tinha vivido seu pior pesadelo. O medo que sentiu de perder Carla foi aterrador e o ar lhe faltou quando se jogou em cima do amigo, tentando lhe tomar a arma. Mesmo assim, ele conseguiu efetivar o disparo e ela não conseguiu evitar o grito rouco que escapou de sua garganta, nem as lágrimas que lhe chegaram aos olhos, mas não ousaram cair.

Bento apertou o gatilho repetidamente sob o olhar perplexo de Carolina e outro divertido de Carla que sorria. Ouviam os disparos, mas as balas não a atingiam e ela se mantinha de pé à frente deles, inabalável, enquanto dizia:

— Lição número um: uma arma é sempre mais eficiente com balas de verdade. Achava mesmo que não revistei sua mochila antes de devolvê-la quando o trouxe para cá? Não sou uma amadora, Bento. Estou nessa estrada há muito tempo e não confio tão facilmente na sorte.

Ainda tremendo pelo susto, Carolina deixou um suspiro de alívio escapar e se livrou do aperto da mão dele em seu braço no momento em que Carla deu um passo à frente, as mãos enfiadas nos bolsos do jeans preto que usava, e Bento arremessou a arma nela que se esquivou com facilidade, mas ele aproveitou a distração momentânea e se jogou em cima dela. Carla atirou-se de costas no chão, os pés no abdômen dele, empurrando-o por sobre sua cabeça. Bento deu uma cambalhota no ar e caiu de costas no chão sentindo a dor do impacto lhe arrancar o ar dos pulmões, mas logo se recuperou e quando se colocou de pé, a loira já o aguardava com os punhos erguidos.

Ela deixou um gemido irritado escapar e deu um passo para o lado se esquivando de um soco, mas não o atacou.

— Chega, Bento, para com isso! — Carolina gritou.

— É melhor ouvi-la — Carla aconselhou e lhe deu uma rasteira.

Ele caiu de cara no chão, mas voltou a ficar de pé. Estava cego de ódio e continuou tentando atingi-la. Era mais alto, mais forte fisicamente, mas não era habilidoso, nem sabia o que fazer além de socar o ar na esperança de tocá-la. Durante toda a sua vida, jamais brigou com alguém.

Continuou avançando e socando o ar, ignorando os pedidos de Carolina que, cansada de gritar para lhe chamar a atenção, se colocou entre os dois tentando segurá-lo.

— Eu vou te matar! — ele gritou para Carla livrando-se das mãos de Carolina que o empurrava para trás. — Não tenho medo de você!

— Deveria — ela provocou, mas baixou os punhos, ligeiramente entediada. Não valia a pena o esforço, Bento mal conseguia se aproximar dela. Era patético.

Furiosa, Carolina impediu um novo avanço dele, dando-lhe um tapa e o empurrou com força no chão poeirento.

— Já chega!

Surpreso, ele levou a mão a face marcada pelos dedos dela. O olhar colérico da amiga o atingiu mais certeiro que sua mão e engoliu em seco. Carla deixou um risinho escapar e Carolina girou sobre os calcanhares, o dedo em riste tocando o ombro sadio dela.

— Você também! Pode ir fechando esse sorriso.

Ela ergueu as mãos em sinal de paz e tentou obedecer, mas Carolina estava linda zangada e voltou a ampliar o sorriso recebendo dela um olhar atravessado. Apesar do momento tenso, reconhecia que dificilmente agiria daquela maneira meses antes e recordou as palavras de Diana: "Você parece leve" e assim se sentia.

Maria, que com toda aquela gritaria e sons de tiros havia acordado, surgiu à entrada da casa com olhar confuso e olhos inchados de sono. Em poucos segundos, compreendeu a situação, então deu de ombros e resolveu fazer um café, deixando as "crianças", como pensou, resolverem seus problemas.

Crimes do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora