Hoje é mais um daqueles monótonos dias, em que sintocomo se estivesse pouco a pouco vivendo roboticamente,todos os dias a mesma rotina. E, depois de preparar e tomar orotineiro café com leite, dou aquela checada básica nas redes sociais, e, recentemente, em alguns sites de namoro, que de tantoAlícia insistir me cadastrei. Acho que ela acha que preciso deum homem. Um banho rápido, uma calça social preta. Camisapreta, o cabelo preso a um rabo de cavalo, e o rosto com tantamaquiagem que seria difícil me reconhecer se me vissem de caralimpa. Estou pronta para mais um dia de trabalho.
Trabalho há 5 anos como gerente de um restaurante, nãoodeio o que faço, pelo contrário, adoro. É lá que minha vida saium pouco dos eixos, é lá que minha rotina muda, todos os diasuma coisa nova, clientes novos, experiências novas, mas, mesmo assim, estou extremamente cansada, não diria fisicamentecansada, mas mentalmente, espiritualmente, se é que existe essetipo de cansaço. Não quero mais isso, quero que a vida mude.E que ironia, exatamente, neste dia, ela começou a mudar, masnão da forma como eu desejava, e sim para pior.
Para muito pior."Carol, o restaurante não está indo bem, precisamos fazercorte de custos, e, por isso, decidimos te dispensar". Foram essasas palavras usadas, mas no rosto do meu chefe eu li: Não preci-10samos mais de você sua imprestável, caia o fora daqui.
Se há uma coisa que tento controlar desde a minha infânciaé esta mania ridícula de chorar por tudo, aliás, por quase tudo,dificilmente choro por tristeza, saudade, mas sempre, sempremesmo, por raiva, estresse, e muito mais quando me sinto umaimprestável. Não sei explicar, já tentei mudar isso, talvez seja umtrauma da adolescência, ouvindo de minha mãe que eu nuncaseria ninguém na vida, mas quem liga, não quero ser alguémna vida, quero apenas um bom emprego e viver em paz, maspaz é uma coisa que eu não teria nos próximos dias da minhavida. Se eu soubesse de parte de tudo que estava por vir, curtiriameus momentos de sossego, iria para casa, tomaria um bom vinho, um banho relaxante, e me deitaria na minha deliciosa camaquentinha.
Mas não foi bem isso que fiz, saí do restaurante chorandohistericamente, corri para o banheiro, tranquei a porta, senteino vaso, peguei meu celular e liguei para Alícia, minha eternaamigona, sempre junta, metida em minhas confusões.
- Alícia, fui demitida.
- Como assim? Sério isso, amiga?
Era sério, e esse tom surpreso dela se repetiria com a maioriaque ficasse sabendo, afinal era vista por todos como uma menina responsável e profissional. Mesmo assim eu ainda era vistacomo uma menina, talvez pela estatura, baixinha, magrinha ede rosto redondo. Mas Alícia não poderia ouvir minhas lamentações, estava no trabalho. Precisava desligar o telefone.
Mas que droga! Odeio quando a vida sai dos eixos, quandoas coisas acontecem sem eu planejar, quando tenho que mudaros planos rapidamente; gosto da rotina, gosto de todos os diasfazer a mesma coisa, acordar, tomar meu café, ir até a academia, 11voltar, fazer almoço, almoçar e ir trabalhar, e o melhor de tudo,saber que, no final do mês, teria meu salário para pagar o aluguel e parte guardar para o tão sonhado apartamento.
Eu sabia que meu desempenho no trabalho havia caído bastante, talvez por causa da monotonia. Por vezes, sentia-me umainútil, e, no fundo, sabia que esse era o motivo para a minhademissão. Mas eu odeio perder, ficaria tranquila se eu tivessetomado a decisão de sair e isso partisse da minha boca, e não daboca de meu chefe.
Sentada no banco da praça, novamente pego meu velho celular, olho por instantes para a proteção de tela, uma imagemde São Miguel Arcanjo, meu anjo protetor, seu semblante forteme inspira e me encoraja. Envio uma mensagem para o grupoda família, já sabendo que viria muitas respostas, afinal, quando se trata de família, nenhuma opinião bate, um discorda dooutro, e uma formiguinha acaba virando um elefante. Agora eusó precisava me acalmar, estar em paz comigo mesma. Mas queironia, paz é uma coisa que eu não teria nos próximos dias daminha vida.
Viriam dias difíceis pela frente. Ter que trabalhar por mais23 dias em um lugar onde minha presença não era importante,até que chegasse o dia da minha saída. Lá eu não era mais bemvinda, nem bem vista.
Era sábado, dia do aniversário de uma das amigas do nossogrupo, ela resolveu comemorar justo no lugar que eu mais odiava, e, até aquele dia, estava decidia não ir, pois, da última vez quefui para aquela casa de shows, só me lembro de estar tomandoum copo de vodca com energético, e depois vagas lembrançasdo estômago ruim, da cabeça pesada, de eu tentando vomitare minha irmã segurando o cabelo, e da vergonha de ter abandonado a festa no meio , apesar de, até hoje, eu não entender 12como passei mal com dois copos de bebidas, e desconfiar de quealguma droga foi colocada em minha bebida.
Mas, como diz o ditado, não importa o lugar e sim as companhias, decidi ir à festa. Alícia não iria, dizia estar cansadademais, sei que talvez não fosse esse o motivo, e sim sua novapaixão.
Parece que eu estava mesmo enganada, a festa estava boademais, fui até o bar e peguei uma garrafa de Skol Beats, umacerveja mais adocicada, porém com teor alcoólico mais elevado,a ideia era tomar somente uma ou duas naquela noite, mas nãoé assim que acontece em todas as vezes que saio. Quando medou conta, a cabeça já está girando, já devia ter tomado umas 4,Angel, minha amiga, logo me trouxe uma água, sentei em nossocamarote e a tomei na esperança de melhorar um pouco.
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Na Rotina do Medo
Mystery / ThrillerCarol é uma ingênua menina que se apaixona pelo encantador Will. Um homem sedutor, e aparentemente muito rico, mas ele lhe revela um grande segredo, no momento não possui absolutamente nada, nem mesmo um lugar para morar e trabalha para uma perigosa...