Crônicas e esbarradas

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Crônica das 3 horas

"Já devia ser três horas da manhã. Eu já tinha varrido cada milímetro do apertado apartamento e feito outras tarefas mais. O sono não havia aparecido nem a meia noite, nem a uma hora, nem agora as três.
Orlean estava aconchegado num pano fofo e felpudo, aposto que o pedaço de tecido tinha mais pelos do próprio gato que originais do pano.

Pensei em desenhar, mas não havia ideias. Pensei em brincar com Orlean, mas o gato cinza de olhos verdes parecia tão imerso naquele sono que senti pena de acorda-lo para que me acompanhasse no tédio vazio. Porém aposto que ele não demoraria a dormir. Então decidi escrever na velha máquina da vovó, e ali estava eu.

Deitei na cama meio macia meio dura e fiquei agarrada, um tempo, a almofada rosa. Ela dispersava totalmente o sombrio quarto cinza claro e preto que eu mesma havia pintado. Tinha cores como rosa vibrante, amarelo e azul e tinha o formato de uma flor, daquelas que desenhamos quando temos, sei lá, 5 anos?. No cantinho, anotado na etiqueta com caneta permanente estava escrito "encio, com amor".
Parece coisa sem nexo mentes leigas da minha vida, parecia estranho ate para mim no início. Mas se pensar bem verá certo nome, e a letra de um amor, talvez, tão colorido quanto a almofada manchada.

Falar do colorido chega a ser cômico, pois o colorido é apenas uma junção de cores que no fim tem algum significado. Mas que significado? O que cada cor representa para que sua junção simbolize algo? Okay, algo confuso. Se você  estiver lendo isso, de duas uma: primeiro você levou a sério meu questionamento e está refletindo neste exato momento. Ou segundo você não entendeu nada e apesar de ter relido resolveu pular essa parte.

Bem aqui está minha conclusão sobre ao amor e as cores. Se o amor fosse uma cor seria algo como verde água. É uma cor derivada do verde? Ou mais pro azul? Quem sabe?
E não é isso o amor? Quem sabe o que ele é, como é, se é mais paixão ou raiva, decepção ou alegria? Ninguém conhece sua origem exata e cada um tem uma opinião. Assim é.

Deixo essa reflexão, para quem quiser ler e pensar a respeito. Boa vida, gatinhos pretos."
 
F

.E.G
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Acordei deitada em cima da máquina de escrever e provavelmente  as páginas estariam manchadas com minha saliva.

Droga, eu estava atrasada!

Banho rápido, barrinha de cereal cotidiana, beijo no Orleans e rodas na estrada.

Já havia ligado para a turma e avisado do atraso, não daria para tomar café da manhã na Parada, nosso food truck oficial.

- Caramba Feg! Você tem que parar de dormir tarde. Já é a terceira vez que desmarca com a gente aqui na Parada.

- Desculpa Mai só que eu não tenho culpa de ter insônia. Além do que, nesse horário, ou eu vou na Parada ou mato aula. Prefiro me formar que comer um lanche que posso desfrutar outros dias.

- Desfrutar? Seu pai te bateria se ouvisse você usando esse palavriado Feg.

- Ele me bateria ao ouvir que prefiro me formar.

Ouvi risadas do outro lado da linha e um " eai gata" com um "shhh" logo em seguida.

- Não se preocupa Mai. Vocês podem ir me buscar na escola hoje se quiserem. E por favor, não precisa esconder o Bruno, Eu sei que ele está aí.

- "Liberdade para os 'Brunos' "!- Ouvi do outro lado. - Cala a boca! Okay a gente se encontra mais tarde.

E desligou.
Você deve estar pensando " uau ela deve fazer parte de uma gangue de motoqueiros", mas não exatamente. Meu pai era desse ramo, os Descendentes do Chumbo são meio que os filhos da gangue original. Não somos uma gangue, com todo aquele preconceito envolto onde acham que somos bandidos, saqueadores e assassinos. Somos motoqueiros que só saiem de moto e passam as férias na estrada.

Ou uma gangue Light.

Cheguei a escola e desci da moto, tirei o fone único do ouvido e guardei na bolsa. Sai em desparado quando vi Seu Alberto fechando o portão.

- Ellena, minha filha! Achei que ia faltar aula!

- Nunca Seu Alberto. Só insônia de novo. - Eu nem o corrigia mais, ele se acostumou a me chamar de Ellena então tudo bem.

- Deveria tomar uns remédios pra dormir, menina!

- Talvez. Mas acho que vou acabar esquecendo de tomar.

- Se você acha. Mas deixe de conversa e corra ainda tem 2 minutos!

O obedeci no mesmo instante. Entrei no bloco e corri para a sala 8. Passei pelos blocos de laboratório, biblioteca e cheguei ao bloco das salas.
Sala 1... 2... 3... 4... 5...6...7... Au, esbarrei num garoto que provavelmente  brotou do chão para me atrapalhar.

- Caramba! Será que não olha por onde anda?

- Digo o mesmo. Corredor não é pista de corrida! - resmungou se levantando.

O olhei de cima a baixo. Mas não conseguia realmente ver seus detalhes, estava cheio de papéis nas mãos e estava inquieto com seus óculos redondos.

- Ah faça-me o favor! Estou atrasada.

Entrei bati a porta atrás de mim. A atenção foi voltada a mim. Clarice estava com seu olhar fuzilante para mim junto de suas seguidoras fiéis. Não vou dar atenção para ela agora.

- Então, atrasada de novo Dona Flórida Ellen. - Disse o professor com seus óculos fundo de garrafa e blusa dentro da calça.

- Desculpe, prometo que não vai acontecer de novo. 

Ele assentiu e eu me sentei no meu lugar demarcado. Ele gostava de mim, mas suspeitava de minhas intenções. Ainda mais quando me via com a jaqueta de couro preto dos Descendentes. Todos desconfiavam.

E ali estava eu. A aspirante a escritora, pronta para mais um dia.

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