Arquivo 11 - O retorno do Inquisidor

Prólogo - Contagem regressiva (3)

Os relógios sempre fazem tic-tac, e, se não fazem, alguém imagina o som irritante, por algum motivo os dois sempre se associam.

Aquele som era o que a mantinha sã naquele momento, não que fosse uma pessoa propensa à loucura, mas eles se esforçavam todos os dias para que ela dissesse algo muito útil e suspeito, uma coisa que as outras já não tenham dito antes.

Aquele dia tinha começado com sopa de feijão branco e sol de meio-dia. Geralmente não a deixavam ver a luz do sol, só quando o interrogatório era profundo e a tortura psicológica.

- Você é diferente, não é?

Eles também estavam tentando fazê-la falar mais rápido, as outras só tinham durado semanas e, por mais que meses já tivessem passado, não queriam perder um dos últimos espécimes.

- Quando a gente vive muito tempo no meio militar... -rodeou a cadeira suja de urina onde a tinham acorrentado nua- Percebe que existe um jeito específico de olhar os superiores. Quanto mais você sobe, mais claro isso fica. Também existe um jeito específico para os inferiores. Você me olha como se eu fosse menos que você em alguma coisa, isso lá tem suas verdades...

O cabelo dela estava imundo de toda a sujeira da antiga cela, mas ele o tocou mesmo assim, como se a sujeira dela não fosse igual à de qualquer humana.

- Não posso curar um corte na jugular nem flutuar ou voar, mas tem uma coisa que eu consigo e você não... Sabe o que é?

Ela riu de um jeito meio sombrio, como uma espécie de condenado ri diante da sentença de morte porque não há mais o que fazer.

- Além de tomar banho, comer e vestir-se?

- Sim, além disso. -ele não pareceu irritado- Eu posso sair daqui, você não. Será que vou precisar esperar anos para que resolva perceber a realidade? Veja bem, nada do que disse a pouco vai te ajudar a sair daqui, e nós vamos te torturar todos os dias. E todos os dias você vai mijar em si mesma, vai passar fome e vai pedir um cobertor quentinho. Amanhã veremos sua regeneração. Espero que não se importe.

- A vontade.

Iriam arrancar algumas parte do corpo dela todos os dias e observar o tempo de regeneração, concluir o que já desconfiavam: algumas partes não podiam se regenerar simplesmente.

Bom... Vamos torcer para que não descubram quais, pensou ela.