23 De volta ao lar

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Ange traz alegria para casa, ainda estou rindo ao lembrar-me dela contando que pôs Bruno para fora de sua casa, e jogou suas coisas no corredor sem economizar gritos e ofensas.

— Sério que você fez isso com ele amiga?

— Foi pouco ainda. Sinto minha alma lavada.

— É muito bom ver você dando a volta por cima. Sei que é difícil, mas vai ser melhor daqui para frente.

— Vida nova Meg, e sonhos novos. — vejo um brilho nela que me deixa muito feliz.

- Não sabe como me deixa orgulhosa ouvir isso.

- Estou morta de sono, mas preciso trabalhar. Nossa noite de fofocas foi ótima, porém acabou comigo. - gargalhamos.

- Espera um pouco, vou descer com você. Quero caminhar, ando meio acomodada.

- Tá, mas tem que ser rápido, pois não quero me atrasar.

- Só vou calçar um tênis e podemos ir.

- Vou descendo, te espero lá em baixo.

- Já vou. - Assim que saio Ange volta correndo.

- Espera!! A menos que queira dar de cara com Carlos, melhor você entrar.

- Não brinca. O que ele está fazendo aqui?

- Te procurando amiga, eu disse que ele está louco atrás de você.

- Vai lá Ange, fala que viajei, qualquer coisa.

- Pode deixar.

Subo contrariada de volta para o apartamento. Não que eu seja covarde, mas não quero falar com ele, só preciso de um pouco de paz. Entro e vejo uma mensagem da Ange.

Ele se foi, mas não sei se engoliu a desculpa, uma hora vai ter que falar com ele.

Respondo:

– Eu sei, mas no momento prefiro evitar.

Jogo o telefone em cima do sofá, vou até à cozinha, pego uma xícara de café e caminho para a biblioteca. Quando foi que minha vida virou essa bagunça? Me pergunto. Sei que isso é culpa minha, deixei muitas coisas à deriva no passado e agora preciso encará-las de frente, chega de me esconder e deixar tudo por obra do tempo. Pego meu telefone e minhas chaves, e desço, preciso de ar puro. Caminho em volta do parque sem rumo, buscando apenas arejar a cabeça. Quando sinto a cansaço tomar conta de mim, acho que é hora de voltar para casa.

Entro, vou para o chuveiro e me arrumo. Combinei de passar o fim de semana na casa de Ange para ajuda- lá a mudar algumas coisas nesse seu novo recomeço. Vamos às compras, nada como um novo visual para começar uma mudança.

Passamos dois dias incríveis, trocamos a mobília de sua casa, com direito a roupa de cama e guarda-roupa novo.

- Precisava mesmo de tudo isso Ange?

- Claro, não quero nada que me lembre do Bruno. Coloquei meu carro à venda, toda vez que entro nele ainda sinto seu perfume . Quero me livra de todas as lembranças .

- Ele não te procurou mais?

- Claro que procurou. Especialmente quando bloqueie seu cartão em nossa conta conjunta. Não tinha nada dele lá, era eu quem fazia os depósitos. Ele alegava que gastava muito com os eventos, sempre tinha que comprar um instrumento novo, e ainda tinha o vestuário pois ele precisava estar apresentável sobre o palco . A trouxa aqui a seu lado dando todo apoio, hoje caí na real, eu não passava de caixa registradora que bancava suas regalias .- ela seca uma lágrima .

- Chega Ange passou. Lembra: seguir em frente.

-Com toda certeza. Sabe, vou tirar umas férias. Viajar, conhecer o mundo, tem tantos lugares que gostaria de ir.

- Sério? Vem, vamos planejar. Por onde quer começar? – Ela vai até sua bolsa e busca um folheto e me entrega.

- Angra dos reis.

- Que lindo! É um lugar maravilhoso.

- É sim, pena que não pode vir comigo.

- Que inveja boa. Quem sabe na próxima vez vamos juntas?- Abraço e ela me acompanha até o ponto de ônibus.

- Tem certeza que não quer que te leve?

- Tenho, você precisa voltar para sua última reunião no jornal. É pertinho, olha lá, vou pegar aquela van que para no portão do meu prédio.

- Então vá com Deus.

- Fica com ele também, até. -Desço na calçada, pena que ainda falta um dia para Tony chegar. Caminho distraída, quando sinto alguém segurar minha cintura.

- Ai espera! O que pensa que está fazendo Roger?

- Só tentando matar a saudade que estava de você.

- Me solta, já te pedi para me deixar, não quero nada com você. - Falo quase gritando, pois estou exausta de repetir sempre a mesma coisa.

- Algum problema aqui magrela? - Antony se aproxima, já me abraçando em seu modo protetor.

- Não Antony, Roger já está de saída, veio apenas me dar um oi.

— Ah, você e pai das princesinhas, dá um beijinho nas duas pra mim. - Ele me guia para entrada deixando Roger mais uma vez com cara de poucos amigos.

- Você é mal, hein? Tinha que mandar beijo pras filhas dele?

- Sem noção é ele, te cercando aqui na porta.

- Concordo. Isso já está se tornando cansativo.

- Mas mudando de assunto. O que aconteceu? Antecipou sua chegada.

- Sim, estava insuportável a presença daquele cara na casa da mamãe.

- Achei que você não se importava mais.

- A questão é que ele ficava perguntando de você insistentemente, queria saber tudo, se tinha namorado, morava sozinha, etc.

- Credo! O que ele tem com a minha vida?

- Nada, mandei ele para o inferno, disse que se escutasse seu nome na boca dele outra vez quebrava todos os dentes dele e me mandei.

- Você é louco mesmo. E a dona Amália?

- Sei lá, não disse nada, só ficou com cara de ofendida, como se eu tivesse destratando ela.

Apenas balanço a cabeça triste – Será que algum dia ela vai cair na real e ver o quando está enganada?

- Sinceramente não sei, mana. - seu telefone toca interrompendo nossa conversa.

- Oi Soraia. Calma, estamos indo.

Ele me encara pálido, o que me causa um desespero – Fala Tony.

- É o papai. Parece que passou mal, Soraia está apavorada.

Começo a chorar compulsivamente - Quero ir para lá agora, me leva Antony.

- Primeiro se acalme, não posso sair com você assim. Vem, vamos pegar umas peças de roupa.

Corro para o quarto, jogo qualquer coisa na mochila, pego minha nécessaire e volto para sala com o coração a mil.

- Vamos!

- Sim. Já falei com Soraia novamente, parece que é apenas uma gripe forte, ele vai ter que ficar em observação.

- Então vamos, quero abraçar meu paizinho ainda hoje. - Subimos na moto, sei que o caminho vai se cansativo, mas preciso ver com meus olhos que meu pai está realmente fora de qualquer risco.

Já anoiteceu quando vislumbramos as luzes de Santa Rosa, é uma bela cidade da qual só tenho lembranças boas. Vamos direto para o hospital, e encontramos Soraia deitada nas pernas de uma senhora muito bonita, que alisa carinhosamente os cabelos de minha irmã.

- Soraia – ela se levanta e corre a nosso encontro com os olhos cansados.

- Ele está lá dentro, o médico pediu um exame de sangue e algumas chapas do pulmão.

- O que aconteceu?

- Não sei, papai é muito teimoso, anda gripado há algum tempo, mas de uns dias pra cá parece cansado e sem apetite. Por mais que dona Rita insistisse, ele se recusava a vir ao médico. - E quando percebo a mulher se aproxima para abraçar Soraia.
- Tudo bem, minha filha, Otávio é forte, agora ele vai ser medicado e vai melhorar rápido.

- Como vai a senhora? Sou Margarete, a filha dele, e esse é Antony, seu filho caçula.

- Tudo bem querida? Te conheço apenas por fotos, seu pai fala com muito carinho de vocês. - Ela me abraça e retribui o carinho.

- Familiares de senhor Otávio? - pergunta um médico jovem.

-Sim, somos os filhos - Me antecipo. - Como ele está? Posso vê-lo?

- Calma senhorita. Ele se encontra estável, o caso dele é uma pneumonia muito forte, mas se medicado adequadamente ficará bem. Só que necessita de muitos cuidados. É só tempo dele acabar de tomar a medicação e darei alta, isso se prometerem manter o horário de remédios e repouso absoluto de meu paciente.

- Sim doutor, eu me comprometo a ficar por conta desse velho teimoso, tenho um jeitinho com ele. - falo mais calma ao saber que poderei levar meu pai para casa.

- Podem entrar de dois em dois. - Agradeço o médico e sigo em busca de meu paizinho.

Meu coração se aperta quando vejo meu pai deitado abatido, tomando remédio na veia. - Oi – minha voz se engasga e o abraço acalmando meu coração.

- Só assim pra você vir ver seu velho, né minha boneca?

- Não fala isso, sabe que te amo muito, quase morri de susto.

- Você sabe que esse velho é forte como um touro.

- E muito teimoso também. - ele sorri. Vejo Antony chegar perto e o abraçar.

- Que susto, paizão.

- Está tudo bem meu filho, detesto agulhas, mas valeu por ter meus filhos todos aqui comigo novamente. Não vejo a hora de irmos pra casa assarmos uma carninha.

- O senhor não tem jeito. - Me deito em seus braços sentindo a paz que sempre amei.

- Vem cá minha filha, não fica com esses olhos cumpridos aí da porta. - só então percebo Soraia encostada na porta. Ela se aproxima
- O senhor está sentindo algum desconforto?

- Não filhota, só desejo ir para casa o mais depressa possível.

- O doutor disse que vai assinar sua alta assim que acabar o medicamento - responde Antony.

- Tenho certeza que o senhor vai se recuperar rápido, afinal chegaram seus queridinhos. Bom, eu vou indo. - Meu pai apenas balança a cabeça, estamos todos acostumados com as cenas de ciúmes de Soraia.

- Antony vai com ela, eu vou ficar aqui com papai, descansa e vê se precisa comprar alguma coisa lá pra casa. - Tony apenas aquiesce e sai acompanhado de Soraia bicuda.

Assim que eles se retiram, entra dona Rita muito tímida, me afasto para dar mais privacidade, pois sinto pelo jeito dos dois que existe algo a mais que uma amizade. Mas vou dar tempo para que meu pai se sinta á vontade para me contar.

Ela sai e eu torno a sentar perto dele, conversamos. Já passa das onze horas quando o médico entra com a alta do meu pai assinada.

- Bom senhor Otávio, estou mandando você para casa pois essa senhorita me prometeu que vai monitorar seus medicamentos e cuidar bem de sua alimentação. O senhor está com uma leve anemia, o que agravou sua saúde. - Presto muita atenção nas recomendações do doutor, que seguirei a risca. Saio para que meu pai possa se trocar e aguardo na porta.

Antony chega e ajuda nosso pai a se locomover para o carro. No caminho recordo de cada rua, como senti falta de estar aqui, foi o único lugar que pude chamar verdadeiramente de lar, e onde uma certa menina deixou perdido em algum canto um pedacinho do seu coração.

É sempre assim

As lágrimas que escorrem

Em minha face não

Ficaram por marcar

E todos que um dia as viram

Se esquecem de lembrar.

E como uma saudade

Imensa que parece

Não caber em mim

Sinto cada batida em

Meu peito chamar

Por ti.

Tudo se vai mas

Um dia retorna

Tudo passa ou vira

Costume.

Nenhuma dor se esquece

Apenas tenta-se

Não lembrar.

É sempre assim.

Por mais que corra

Ou me esconda,

A vida insiste a me trazer

Pra perto de você.

Minha dor meu único

E verdadeiro amor.

R.M

Os Sonhos Que Ficaram Para Traz.Onde histórias criam vida. Descubra agora