O ALAMBIQUE FANTASMA e outros poemas

Silêncio Estridente

Que seria o silêncio,

            Sem o amor fraterno da estridência?

            Poemas, palavras, poesias, estrofes

            Alguém há de ler o branco das lacunas?

            Ou o oculto das entrelinhas?

            Ou as letras miúdas do rodapé?

            Pois até o fim da página

            Acotovelavam-se os versos não-escritos

            Quando as elipses

            Falam mais alto do que todo o palavrório

            Mas o que seria a palavra

            Sem o sentido carregado do não-dito?

            A Verdade nunca se furta aos erros

            Pois nunca desvenda o Real

            Quem jamais experimentou do falso

            As vitórias trazem mais erros do que triunfos

            Tal como estultice é a sabedoria cansada

            E o sucesso é o desfecho dos fracassos

            Pois como haveria a luz de ofuscar

            Sem nenhuma nesga de escuridão para torná-la bela?

            Pois como se estenderiam as estrelas

            Senão sob um lençol de trevas?

            A Ordem, como um fruto passa do verde ao ocre,

            É o Caos maduro de sol, pronto a cair de pesado do pé

            Deseja-se o ausente

            Assim como se sofre a saudade do distante

            Pois faço o Bem quando o Mal me prejudica

            E pratico o Mal quando o bem se enfraquece

            Mas o fraco há de se fortalecer (buscando o que lhe falta)

            Enquanto o fatigado repousa (desejando o ausente)

            Pois o que seria o desejo

            Se ele já estivesse saciado?

            Pois como seria possível escrever um poema

            Sem nenhum verso e nenhuma estrofe?

            Uma poesia livre de palavras

            E de sentidos dissonantes e consonantes?

            Sem sins e sem nãos

            Sem imagens e, ao mesmo tempo, sem ideias?

Pois onde procurar o sentido da poesia

Senão em suas faltas e em suas névoas?

Como falar do não-ser

Já sendo?       

            Como testemunhar o Vácuo e o Vazio

            Dentro de seu não-espaço?

            Como procurar as respostas

            Sem saber ao certo quais perguntas fazer?

            Pois o sentido da poesia

            Está no coração de suas lacunas

            Em toda parte e em parte alguma

            Ao mesmo tempo e aos mesmos tempos

            Que seria o silêncio

            Sem a irmã estridência?