"Mais uma vez, saio de casa e volto com as sacolas do supermercado. Cheias de comida para evitar que eu morra de fome, apesar de não ser uma má ideia. Entro e procuro um cigarro, acendo e aspiro o prazer que me arrancará dessa vida algum dia. O prazer efémero que me traga aos poucos para a morte. Sento no sofá e ligo a televisão, olho em volta e não vejo ninguém. Vejo apenas fotos de um rapaz e uma mulher, meu peito aperta e uma sensação de que algo está faltando me toma. Não esqueci nada da minha velha rotina. Apenas lembrei de que não a tenho mais comigo. Lembrei que a saudade se tornou parte da rotina. A única, dentre todas as coisas, que não falta no meu dia é a ausência de um alguém que já não tenho mais comigo. E, o aperto no peito que isso me causa."
Sete dias. Sete dias. Sete dias. Se-te dias. A raiz quadrada de quarenta e nove. O número de dias que a garotinha amaldiçoada esperava para matar aqueles que assistiam a fita proibida.
Não, ele não tinha assistido nenhuma fica, tampouco se aproximava da morte física. Sete dias significava que uma semana atrás sua casa minúscula aparentava ser tão vazia e deprimente. Vozes ecoavam do quarto. Vozes elevadas e carregadas de palavrões, expressões pesadas e desarmônicas. Mas, nenhum adeus ou silêncio.
Toda a casa reverberava os sons de um casal normal, cuja briga girava em torno de uma bebedeira com os amigos. E de uma toalha em cima da cama. E de algumas mensagens de texto um pouquinho suspeitas no celular dele. Nada demais, nada que o amor não pudesse superar. Ou pelo menos era isso que ele pensava.
Uma semana atrás as paredes brancas não pareciam tão brancas. Na verdade, elas pareciam mais cheias, entupidas de memórias, reboco, tinta, tijolos, e uma declaração de amor em letras cursivas. Ela escreveu aquilo sete dias depois da mudança, quando tudo que eles tinham na casa era um sofá, uma cama, e dois recipientes lotados da cabeça aos pés de paixão.
" Que sete dias se transformem em setenta anos. Que não seja infinito enquanto dure, mas que seja. E dure o infinito."
Não foi. Ele pensou. Não foi infinito enquanto durou e nem durou um infinito. Foram três meses de amor incondicional e perfeição, um mês de brigas e agora ele já contava o sétimo dia após a separação.
Ele não sabia se devia se culpar ou tentar fazer aquela pose de solteirão feliz. Não parecia justo, nem consigo e nem com o mundo, adicionar mais um iludido à lista dos recém-separados-aparentemente-felizes. Ele não ia prestar esse papel, parecia tolice fingir que estava bem num momento tão miserável como aquele.
A verdade é que ninguém ia conseguir restaurar seu relacionamento, nem ele, nem a frase de amor, nem a garota amaldiçoada dos sete dias e nem mesmo as paredes brancas. Ele estava sozinho. Ele sentia falta dela. Ele não podia suportar pensar que a sua missa do sétimo dia mais triste se realizaria no seu sofá, durante uma maratona de Supernatural, e com uma lata de cerveja nas mãos. Ele não poderia imaginar que sofreria tanto por causa da morte de um relacionamento. Ele não poderia imaginar que sua casa se tornaria seu campo de batalha. E a guerra era contra a saudade.