O vampiro e a flor do Diabo ⋆ knj + pjm

CAPÍTULO ÚNICO ─ O preço de uma flor

Reza a lenda que há muitos séculos um jovem rapaz que residia em um dos três reinos coreanos invadidos pelo grande império da China, que na era moderna passamos a chamar de Seul, foi transformado em vampiro contra sua própria vontade.

Não creia, com isto, que o rapaz em questão foi vítima de uma mordida ou de pactos malsucedidos como tanto se prega na literatura contemporânea. Em fato, o vampiro que, apesar de conservar a boa aparência de uma era longínqua nada mais tem de jovem, é o único de sua espécie e nada se parece com aqueles tantos outros que são retratados comumente.

Tendo sido amaldiçoado por um demônio vingativo durante um dia vulgar em que passeava às margens do Rio Han, Namjoon foi condenado a andar pela face da terra, nunca adoecendo ou envelhecendo e, por tanto, pela eternidade o vampiro viveria. Mas sua condenação não se deu sem um propósito e, muito menos, sem causa. Embora não saibamos até que ponto tal infortúnio se deu devido ao fruto do acaso ou por fortuito projeto de outrem.

A causa da perdição de Namjoon foi uma singela flor. Durante seu caminho, Namjoon se deparou com uma flor de tamanha beleza que jamais havia vislumbrado. A flor não se parecia com nenhuma outra, crescendo única e isolada numa parte do chão que anos depois seria inundada pelo rio próximo, apagando da terra completamente qualquer suspeita de sua existência.

O simplório jovem ficou fascinado pela beleza da flor e resolveu colhê-la, sem saber o quanto lhe custaria a decisão de retirar a bela flor de seu lar. A ira de um dos demônios mais vingativos foi despertada pois tal flor pertencia a ele para atrair e agradar seu amado que andava livremente pela face da terra.

Namjoon foi amaldiçoado pelo próprio diabo a viver para sempre cultivando a flor da qual tão ingenuamente apoderou-se. Pois só assim o propósito do agora vampiro serviria ao propósito da flor do diabo: agradar o seu amado.

O vampiro deveria procurar, através de sua perpetuidade, aquele que era sob muitos aspectos - e ainda assim sob nenhum -, o amante do diabo; e ofertá-lo, concluindo sua passagem pela terra.

Embora a eternidade tenha para nós mortais certo encantamento e cobiça, para os seres eternos a imortalidade pouco apelo possui e para aqueles que a vivem em solidão é, então, completa agonia. Mas o diabo é um ser tão maligno quanto as mais diversas crenças terrestres o supõem. Observando tamanho apego que o vampiro tinha pela raça humana e por sua própria humanidade, o condenou a se alimentar do sangue - e portanto da vida - daqueles que são mortais. Namjoon, sentindo sua humanidade escapar de si, resignou-se em sua infelicidade, decidindo plantar uma flor para cada vítima que por ele perecesse.

E a sua busca pelo amante do diabo começou.

Por haver a restrição de não morrer sob qualquer aspecto que naturalmente tiraria a vida de seres mais frágeis e de sua dieta restrita, Namjoon tomava cuidados constantes para não ser notado pelos mortais.

Ainda que fosse cauteloso, a própria natureza do vampiro não era assim tão discreta. Por muito que se houvesse alterado, Namjoon permanecia com sua personalidade intacta, apenas mais madura e menos ingênua.

Dono de um caráter reservado mas muito divertido e livre, o vampiro não demorou para fazer fortuna e, assim que possível, a viajar pelo mundo. Por tudo o que viu e pelo que acreditava ainda ter de ver, não tomava como possibilidade de fato que um dia fosse encontrar o amante do diabo, mas possuía a seu favor a eternidade e dela ele se faria dispor.

Em certa década, alguns séculos após ter saído da Coreia, decidiu retornar. É claro, ninguém mais no reino em que uma vez residira estava vivo para sequer lembrar-se de si. Ainda assim, assumiu uma postura de maior reserva do que a habitual. Nunca poderia demorar-se por muito tempo em um só lugar e todo o tempo do qual dispusesse para aproveitar sua terra natal, após longos anos sem avistá-la, seria cuidado com gratidão.