Intrusa

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Uma placa discreta e meio quebrada estava fincada ao lado de uma antiga construção de três andares, cujas pequenas janelas percorriam toda sua extensão, com flores em tons variados de rosa e roxo. No primeiro piso há duas lojinhas de conveniência, aparentemente tradicionais. Diminuo a velocidade, numa tentativa muito bem sucedida de visualizar o interior de ambos os recintos e não posso negar que as madeiras rústicas ali colocadas têm um aspecto tão acolhedor que eu poderia jurar que uma velhinha sairia de lá com uma bandeja repleta de biscoitos e um leite quente. Infelizmente minha fértil imaginação foi subitamente cortada assim que o som de uma buzina surgiu atrás do meu carro.

Uma caminhonete vermelha alta e provavelmente antiga como tudo o que vi desde que entrei nessa região havia acabado de se aproximar e buzinava mais uma vez. A julgar pela impaciência e pelo braço musculoso que acabara de sair da janela e sinalizar para que eu seguisse em frente, não havia dúvidas de que se tratava de um motorista, e não uma. Inevitavelmente reviro os olhos antes de dar seguimento.

"SEJA BEM VINDO (A) A VANILLA "

Ah sim. É claro. Mal cheguei e já fui muito "bem vinda", como pude perceber. A entrada da cidadezinha não era em nada surpreendente, pelo contrário: parecia mais com um bairro residencial onde não há barulho nenhum, e pessoas desconfiadas te olham do jardim da casa enquanto se agacham pra pegar o jornal. Isso não é um exagero. Um senhor mal humorado à minha direita carregou o rolo de papéis pra dentro de casa, sem sequer tirar os olhos do meu carro e, sinceramente, não sei como conseguiu subir a pequena escada da varanda sem tropeçar. Dá pra ver que, à minha esquerda, a situação não é tão diferente. Um casal estava sentado em cadeiras de praia dispostas no gramado, discutindo acaloradamente para se silenciarem imediatamente e seguir meu percurso com os olhos curiosos.

O caminho todo foi assim até eu finalmente parar em frente a um chalé de aspecto extremamente místico e ao mesmo tempo reconfortante. Um jardim escandalosamente florido crescia em frente à entrada, e a fachada do chalé era parecida com uma daquelas casinhas de bruxas de contos de fadas, com duas janelas no andar de cima e uma pequena chaminé. A porta se abriu assim que parei o carro, e tia Molly saiu de lá com um sorriso radiante. Suas vestes eram um pouco largas demais para seu corpo e os cabelos eram loiros de uma vivacidade intensa, assim como sua postura. Fazia tempos que não a via e só agora me dava conta do quanto sentia saudades dela.

- Minha querida, olhe só pra você! – ela exclamou, me puxando pra um abraço apertado.

- Oi, tia. – retribuo na mesma intensidade, ainda que tenha medo de quebrar alguma de suas costelas. Como pode ser tão magrinha?

- Fiquei muito feliz quando soube que chegaria! Estava te aguardando há tempos!

- Pois é. Era tão difícil conseguir fazer uma visita, mas...

- Não vamos nos preocupar com o passado. – ela me interrompe prontamente. – Deixe eu te ajudar com as malas. Você está com fome?

- Ainda não.

- De qualquer forma, vou começar a preparar nosso almoço. Sua mãe me disse que adora espaguete, portanto vou preparar um especial pra você.

Enquanto tia Molly falava animadamente sobre o que planejara para o almoço, eu só conseguia olhar para as pequenas montanhas em volta da cidade. Não havia prédios altos, nem helicópteros, nem aquele som de carros freando fortemente, buzinando ou simplesmente passando pela rua a todo instante. Vai ser uma longa estadia, permito-me suspirar.

- Tia?

- Sim? – paralisa, virando-se para mim.

- A senhora se importaria se eu aproveitasse o horário pra dar uma voltinha rápida na cidade? É bem rápida mesmo, só pra... Matar a curiosidade.

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⏰ Última atualização: Mar 15, 2021 ⏰

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