CAPÍTULO ÚNICO

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oi nenes! escrevi essa oneshot e gostei muito dela... mas decidi a postar em sua pureza total, ou seja, não reli nem reescrevi. dependendo da resposta a ela, pretendo transformar em algo maior, e por isso adoraria que apontassem erros nessa pequena provinha.

espero que gostem!
~ Leticia

As manhãs de terça feira eram um tanto monótonas, mesmo que confortáveis, na Rua Shreiber, 25. Era novembro, e uma pesada chuva castigava as ruas sujas de Londres, o céu refletindo a cor de chumbo do Tâmisa, a água celestial tornando tão mais óbvia a sujeira da metrópole.

É estranho, vê, como a riqueza tem essa qualidade introvertida, particular. O dinheiro é um eremita: se esconde dentro de casa e só permite que uma seleta sociedade o veja. Ao que não fazem parte deste grupo, resta as depressivas e opressoras ruas londrinas e o esgoto aberto, aquele rio mágico de miséria. O esgoto é dono de uma personalidade quase infantil: borbulhante, irreverente, extrovertido. Se esconder é uma das habilidades que não tem, por mais que se tente força-la sobre ele.

Por isso, enquanto o mundo lá fora sofria sob tons frios e água, o estúdio de Kim Taehyung brilhava quente em tons de vinho e dourado, o ar amanteigado por incensos e chá quente. Xícaras estavam espalhadas em todas as superfícies, algumas mornas, outras frias, uma pela metade a outra vazia. As janelas que davam para a rua eram a única prova de que lá fora havia qualquer temporal, e uma quieta brisa que por vezes se esgueirava da porta da cozinha a única prova de que aquele lugar não era um sonho. As nove horas se arrastavam silenciosamente para as dez, um disco rodava na vitrola, e Taehyung se ocupava com o fundo de um retrato enquanto cantarolava, imerso em cores.

Era um bonito retrato, sim, todo rosa pastel e verde primavera, todo dourado e castanho, cheio de rosas e margaridas e, em seu centro, uma jovem menina que parecia ela mesma uma flor. Era a Condessa de Liechtshire, a embaraçosamente jovem nova esposa do conde viúvo, uma garota rechonchuda de faces rosadas e áureos cabelos, que no retrato pareciam ainda mais bonitos do que em vida, emoldurando em uma cascata luminosa e angelical seu rosto. Taehyung tinha testado novas tintas a óleo, importadas da Turquia, e elas brilhavam, as cores perfeitamente misturadas uma a outra, como se fosse um espelho.

Namjoon havia lhe tecido elogios longos e elegantes sobre as virtudes da tela, a magia nela contida, o dom apolíneo que só poderia ser responsável por aquela obra. As mesmas coisas foram lhe ditas, menos eloqüentemente, pelo Conde de Liechtshire, cujos olhos brilharam tanto em vista da obra, que Taehyung achou que havia se apaixonado de novo pela condessa.

Mas para ele, era apenas mais um retrato. Uma obra infinitamente graciosa, agradável, e em um nível, perfeita. Mas tão cheia de falhas! Não um sentimento brotava dela, nem uma sombra de um... O que é arte se não poesia e o que é poesia se não o sentir, transbordante e insano? Não se poderia tecer uma crítica àquele quadro, nem se chocar com ele.

O pintor associava isso a sua modelo. O quão frustrante é pintar a perfeita imagem de uma menina... Não havia nada de demoníaco ou angelical naquelas faces, nem mesmo o suspiro de algo mais humano, como uma ninfa ou um fantasma. Ela era tão definitivamente uma menina, que seria impossível arrancar sensações além-mundo de uma imagem tão fiel a ela. Era assim que quase todos os modelos lhe faziam sentir. Talvez fosse culpa própria também... talvez fosse bom demais. Uma quantidade de distorção e sonho é necessária para a arte se transformar em ponte a outro mundo.

A música acabou, e o artista guardou seus pincéis, ainda cantarolando, a chuva se afinando lá fora, mas ainda caindo insistente. A carta de Lord Kim Namjoon jazia, em seu caro papel e elegante caligrafia em cima da mesa. Havia a lido, mas era quase como se não o tivesse feito, realmente. Nela, o lord lhe dizia que havia arranjado o perfeito, o mais mágico e magnífico modelo, e que ele apareceria por lá naquela manhã de terça-feira. Namjoon eram um ser excepcional entre a nobreza medíocre, mas seus olhos vazavam rosa demais; a ele o mundo era mil vezes mais florido, mais colorido, mais pulsante em vida. Taehyung achava que era porque ele lia demais. Aqueles mundos fictícios distorceram o mundo real. Coisa irremediável, realmente.

MAGNUM OPUS | KTH+JJKOnde histórias criam vida. Descubra agora