Luzes. Um brilho ofuscante dourado confrontava o macabro ambiente do fundo do mar.
Era um local quase sem vida, monótono e escuro, iluminado pelo que mais parecia ser a faísca gloriosa da evolução. O brilho não vinha de pérolas. Muito menos de criaturas abissais, pouco conhecidas pela raça humana.
Na verdade... O brilho vinha de um artefato, fincado no chão subaquático. Dois mergulhadores, cuidadosamente equipados, pareciam ter chegado onde queriam. Ambos se aproximam do objeto pontiagudo. Pelo formato, parecia ser uma flecha.- Ora, mais um tesouro colonial? – Brinca um deles, falando com a ajuda de uma espécie de máscara de mergulho. Na região auditiva, tinha um comunicador, que funcionava quase como um rádio.
- Ainda assim, dá pra faturar uma boa grana. Já pegamos o suficiente.
Retornam à superfície, onde aguardava um barco. Sobre o mesmo, estava outro tripulante, além de alguns outros achados marítimos. Ao embarcarem, retiram as máscaras. Os três admiravam tudo o que conquistaram num único dia.
- Isso é incrível...! – Exclama o navegador, vestindo uma roupa típica de pescador. – Pessoal, essa vai ser a nossa maior fatura! Não faço ideia de como tanta coisa assim não foi encontrada antes...
- Vai ver, surgiu tudo isso ali do nada.
Caem na gargalhada. Um dos homens joga a tal “ponta de flecha" sobre o resto do tesouro. Essa última relíquia brilhava tão intensamente como o sol. A mesma estrela que anunciava outra manhã na cidade do Rio de Janeiro.
8 de Maio de 2020: A data em que a flecha foi descoberta, na região litorânea do Sudeste, e vendida à influente Fundação Brasileira Speedwagon. Pouco menos de um dia depois, os três mergulhadores desapareceram sem deixar rastros.
O glorioso Cristo Redentor permanecia estático, invicto, glorioso sob a luz matinal. Ele aproveita seus últimos dias de intangibilidade, enquanto aguarda a inevitável “força maior" surgir.
Nesse mesmo tempo, um grupo misterioso está prestes a ascender.• • •
Bairro Cidade de Deus – 9 de Maio, 13:40
O início da tarde não poderia ser mais agitado.
Ecoavam pelas ruas desertas os sons do disparo frequente. Aparentemente, mais um confronto de gangues naquela comunidade. Os civis desarmados refugiavam-se em suas casas; aqueles cujas moradias eram mais precárias tinham mais chance de serem atingidos por balas perdidas.
Quanto aos que participavam do tiroteio, alguns encontravam esconderijos estratégicos no mato ou atrás das construções. Todos possuíam armas compradas de traficantes da mesma fonte, mas, há pouco mais de uma década, houve desentendimento – ainda desconhecido – entre seus líderes.De um lado, haviam os Miseráveis. Um nome dado pelos próprios moradores da Cidade de Deus, devido à origem marginalizada do grupo. Eram famosos pelo comportamento geralmente violento de seus integrantes, e pelo fato de sempre acabarem “sujando a rua" ao entrarem um combate. Por tal razão, tornaram-se um dos grupos mais perigosos do país inteiro.
Do outro, os Retirantes, imigrantes que vieram de áreas extremamente secas. Também temidos pela má reputação de onde vieram. O líder havia sido morto no combate atual, mas ainda não houve rendição, mesmo que a situação não estivesse tão boa.- Ah, porra...! – Um jovem esbelto e negro, de roupas demasiadamente sujas, pressionava a mão contra uma ferida superficial no braço esquerdo. Uma bala por pouco não acertara em cheio.
- Deixa de ser frango, Poco! – Ao ser chamado pelo velho apelido, o frágil Pocoloco se atenta ao senhor que o segura pela gola da camisa. As roupas estavam no mesmo estado, e ele tinha feridas piores. – Não aguenta uma picadinha no braço, seu moleque? Some logo daqui, volta pra base!
- Mas dói, Vô...! Ai...!
• • •
Pocoloco.
13 anos, nascido em Salvador, capital da Bahia.
Passou maior parte da vida nas áreas mais precárias do sertão. Com a escassez dos recursos, seguiu o caminho obscuro repassado de geração em geração por sua família.
Sempre viveu com seu avô, Moacir Abdul.
Sua mãe morreu no parto. Meses antes, seu pai havia morrido numa viagem à área urbana. Dizem ter sido um acidente de carro, mas Poco nunca acreditou. Para ele, a injustiça deve amaldiçoou seus parentes e a si mesmo.Amaldiçoados pela "Flecha do Diabo".
Um artefato raro, cuja origem é desconhecida. Foi encontrada pelo bisavô há cinquenta anos, e, a partir de tal época, a desgraça tomou conta de suas vidas. Abdul foi encarregado de mantê-la guardada pela eternidade, para que não caísse em mãos alheias.
Desde sucessivos desastres envolvendo o grupo inteiro, foi necessário migrar pela região inteira... Surgiu, então, seu nome. "Retirantes”.- Acho melhor recuarmos... Por favor, meu avô!
- Não podemos! Se fugirmos, seremos expulsos desse território! E não temos mais onde-
Ambos são interrompidos por mais tiros, que acertam a parede na qual estavam escondidos. É atravessada, e o projétil atinge o estômago do adulto. Em seguida, mais atingem a região do apêndice e os pulmões. Os jatos de sangue e o gemido apavoram Poco, que a todo instante gritava com pânico.
- Vô! Aguente! – O menino apoia-o em seu braço suado e trêmulo, enquanto a barba acinzentada roçava na ferida de seu ombro.
Mal conseguia falar. Era grande a quantidade de sangue que saía de seu avô. Tornara-se automaticamente chefe do grupo após o antigo ter falecido, mas sua carreira não duraria muito. Com os olhos semicerrados, e quase sem forças para se mover, entrega ao neto um objeto dourado no formato de uma seta.
- Pegue... Poco, pegue...
- Vô...Não pode ser! – Seus lábios grossos são calados pela mão fria de Abdul. De sua rouca voz, saem algumas das últimas palavras do velho guerreiro:
- A Flecha do Diabo... Lutei para mantê-la em segredo... – Tosse violentamente, pingando mais sangue nas roupas do neto. – Esse combate foi um erro... Está em suas mãos, Pocoloco... Faça o que deve ser feito...
Apontava a relíquia ao peito de Poco, cujas mãos também a seguravam. No exato momento, mais integrantes d’Os Miseráveis apareceram, apontando as armas à cabeça do pequeno soldado. O mesmo, erguido, encarava todos com olhos determinados. Se não seguisse o plano final do Mestre, o sangue derramado nos confrontos de muitos anos de duração teria sido em vão.
Mas essa história não é apenas sobre Poco e os Retirantes. Na verdade, nosso protagonista acaba de entrar em cena, perto da zona de combate.
- Chefe, trouxe o cara.
- Muito bem. Entre. – Ordena a voz de um jovem adulto. A porta da salinha se abre, onde adentram passos lentos.
-...Estive esperando por você. Joel, não é? Sente-se, temos...assuntos a tratar.
O som incômodo de mais um disparo estoura pela comunidade. As sementes da revolução foram plantadas.

VOCÊ ESTÁ LENDO
JoJo's Bizarre Adventure - Ember Green Heart
ActionUma fanfic baseada na icônica série de mangás, JoJo's Bizarre Adventure, obra de Hirohiko Araki. A história se passa em 2020, no Brasil. Joel Araujo, até então um jovem comum, experimenta uma nova vida ao entrar numa das gangues mais perigosas do p...