O Tipo Rosa Patricinha

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Rosa, rosa, rosa e um pouquinho mais de rosa.

A bolsa, o vestido, o sapato, as unhas... tudo contia um pouquinho dessa cor.

Parecia que o mundo ao redor dela era repleto de rosa. Mesmo o mais escuro dos lugares parecia adquirir um pouco da cor quando ela passava.

Para ser bem sincero, essa cor sempre foi enjoada demais para mim. Realmente nunca foi de me agradar. Deve-se imaginar o meu completo espanto ao avistar a garota pela primeira vez, certo?

Lembro-me de pensar assim: "Qual a necessidade de tanto rosa? Não poderia ao menos variar, ao invés de vestir-se totalmente com esta cor?"

Quando a vi novamente, ela estava novamente adornada por rosa e mais rosa. Isso não mudou com o tempo, pois sempre que a via ela estava enfeitada com a cor.

Por algum motivo, meus olhos começaram a buscá-la sempre, mesmo que inconscientemente. Talvez fosse a cor que chamava a atenção para si sempre que eu olhava, tornando fácil encontrá-la. De fato, não existia descrição ao seu redor.

De tanto observá-la, aprendi alguns de seus costumes. Ela ficava brincando de rodar seu anel quando estava entediada, fazia biquinho quando parecia estar confusa e sempre colocava fones de ouvido quando ia ler. Me perguntava o que ela estaria escutando.

Com o tempo, comecei a ouvir as pessoas falarem sobre ela, sempre pelas suas costas. A chamavam de metida, enjoada, mimada e muitas outras coisas. Me perguntava o quanto essas pessoas a conheciam, já que nunca as vi conversando com a garota.

Admito que, antes de a observar também imaginava tais coisas da garota, no entanto, percebi que seus atos não demonstravam isso. Eu estaria errado?

Era uma tarde quente quando a encontrei próxima a uma praça. A vi abaixada em um canto e me perguntei o que ela estaria fazendo. Até pensei em passar e fingir que não tinha a visto, mas a curiosidade foi mais forte  e me vi com a necessidade de saber o que ela estaria fazendo. Aproximei-me devagar, para que ela não notasse a minha presença. 

A primeira coisa que notei foi o rosa. Ela usava um lindo vestidinho rosa claro, que ia até um pouco antes do joelho; o sapato era um salto baixo um ou dois tons mais rosa que o vestido; a cabeça estava enfeitada com uma discreta presilha num tom claro; e a boca estava ligeiramente melada com o batom da cor  que ela parecia amar.

A segunda coisa que notei foi uma patinha branca com manchinha preta. Um gato. Um fofo e pequeno gatinho descansava em seu colo, enquanto ela o dava um pouco da água de um copo.

Talvez eu não tenha sido tão discreto, já que ela de repente levantou o olhar em minha direção. Ficou me encarando por uns segundos, antes de abrir um lindo sorriso e me perguntar:

-Ele é seu?- Perguntou-me se referindo ao pequeno felino.

-Não.- Respondi somente.

-Ah...

Lembro-me bem da bela carinha que ela fez, parecendo lamentar-se.

-Algum problema?- Perguntei.

-Não. Bom, não exatamente. Apenas estava com esperanças de encontrar a casa deste filhote.

A garota olhou para o pequeno animal com um triste olhar. Fiquei observando-a, sem conseguir olhar em outra direção. Suas belas feições me encantavam. O olhar que lançava em direção ao pequeno animal era carregado de carinho e compaixão, sua beleza parecia se destacar ainda mais quando fazia tal olhar.

-Ele realmente tem um dono?

-Não sei. O encontrei a poucos minutos aqui. Parecia estar cansadinho e está fazendo tanto calor... senti um aperto em meu coração quando o vi, ainda é apenas um filhote.

-Se está com tanta pena dele, por que não o leva com você?

Ela olha pra mim com uma carinha triste e suspira levemente.

-Gostaria muito de fazer isso, porém não poderia cuidar dele devidamente. Além de que minha família não me permite ter animais, já que meu irmãozinho tem alergia a eles.

-Tem um irmão mais novo?- Pergunto repentinamente, curioso.

Ela abre novamente um sorriso antes de falar carinhosamente.

-Tenho dois. São pequenos. O mais novo tem alergia  a pelos e essas coisinhas. -Ela olha novamente para o gatinho.- Se eu pudesse, o levaria comigo. Infelizmente, o máximo que posso fazer é dar um pouco de água pra ele.

Não sei o que me motivou a tomar a atitude a seguir, só sei que em um segundo eu estava de pé ao lado dela e em outro eu havia me abaixado em sua frente.

-Eu posso cuidar dele.- pronunciei sem pensar.

-Pode mesmo?

-Claro, não tenho nada para me impedir. Além disso, não deve ser grande coisa cuidar de uma criaturinha dessas.

-Claro que é! Você não pode simplesmente deixá-lo por conta própria. Tem que se certificar de que ele tenha os devidos cuidados.

-Não vou deixá-lo com fome, se é isso que te preocupa.- Respondo simplesmente.

-Alimento certamente não vai ser a única coisa de que ele irá precisar. Não pode esquecer de limpá-lo com cuidado, ensiná-lo a não destruir tudo o que ver pela frente. Além da atenção que ele precisará, claro.

-Você faz parecer como uma missão impossível.

-Impossível? Não mesmo. Complicada? Talvez. Gratificante? Com certeza. - Ela sorri novamente.

Sorri com a resposta.

-Se você diz tão confiante, creio que devo confiar em suas palavras.

Conversamos ainda mais um pouco, antes de ela me avisar que precisava voltar para casa e se despedir tristemente do animalzinho, deixando-o comigo.

O costume que eu tinha de observá-la ficou cada vez maior. Cheguei até mesmo a falar com ela, com o pretexto de lhe dar notícias sobre o felino que eu agora estava cuidando.

Com o tempo, passei a conviver mais com ela, aprender seus gostos e entender seus costumes. O que diziam sobre ela certamente estava errado. Além de ser extremamente gentil, era uma garota inteligente, carinhosa e muito interessante. Eu estava totalmente encantado por ela.

[...]

-No que está pensando?

Meus pensamentos são interrompidos por uma doce voz, saindo de uma boquinha rosada.

-Em nada especificamente.

Observo-a deitada em meu colo, fazendo carinho no gatinho adormecido em cima dela. Sempre tão distraída, característica que a deixa ainda mais bela.

-Pois eu estava pensando na primeira vez que falou comigo, naquele parque. Jamais imaginaria que iria aceitar cuidar deste pequenino. Você me parecia tão sério, sempre usando tons escuros.

-Bom, não posso julgá-la, levando em consideração que a ideia que eu tinha de você era bem diferente da realidade também.

Ela ri, provavelmente lembrando-se de que eu já disse o que achava da mesma a princípio.

-Certo, talvez as pessoas  nos achem um casal estranho.

-Não me importo se nos acham um casal estranho ou não. Eu nos acho o melhor casal.

Ela sorri antes de concordar.

-Eu também.

Seu olha se volta novamente para o felino, agora um pouco maior, comparado a quando o adotei, e ela fica fazendo carinho em sua cabeça.

Levanto minhas mãos, tocando em suas madeixas claras - agora com uma mecha rosa - e ela fecha os olhos -com uma sombra levemente rosada- apreciando a carícia.

Eu, que odiava rosa, passei a amar a pessoa que mais ama esta cor, minha menina não patricinha.

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