DJ KILL MC

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Não gosto de dealers de erva. Aliás, detesto-os. Sei que existem diferenças entre eles, mas aquilo que têm em comum é o suficiente para querer evitá-los. Prefiro contar com um amigo de um dealer, mesmo que isso me custe uma parte do producto pelo qual paguei. É um preço justo a pagar.

Já deviam ser perto de seis e quarenta e oito da tarde, porque a minha namorada já me tinha ligado seis vezes e o comboio partia às seis e cinquenta e cinco. A minha sorte foi a de que é possível demorar-se quatro minutos da estação de metro de Entrecampos até à plataforma dos comboios da Fertagus. E digo que tive sorte porque foi a única vez que isso aconteceu. Assim que saí do metro consegui fazer uso de uma força de vontade que me permitiu subir as escadas do metro a correr, saltar por cima da cancela, e ter o descaramento de dar uns encontrões aos utentes da passadeira rolante que deslizava na direcção da estação de comboios. Tenho a impressão de ter atingido uma miúda com um cotovelo. Tenho essa impressão porque ouviu um queixume feminino, um "Ái!" semi-orgásmico, seguido por "Então, caralho?!" expresso num rugido inconfundivelmente masculino. Só posso supor tudo isto, porque não olhei para trás. Talvez deva agradecer à minha falta de civismo, porque se tivesse olhado para trás, não duvido nada que o decurso de eventos poderia ter sido completamente diferente. A minha namorada esperava-me no fim das últimas escadas que dão acesso à plataforma, com aquela expressão pueril de quem tinha a certeza de que iríamos apanhar o comboio que, por este momento, apitava sinalizando o fecho das portas. Ela estava certa. Conseguimos. Apesar destes comboios da tarde partirem sempre por volta da sua hora oficial, a Alice conhecia-lhes bem as manhas.

Na hora de ponta, um lugar à janela é um privilégio. A Alice conseguiu-me um. Como era seu costume, agarrou-me pela mão e puxou-me por entre a multidão na direcção de dois assentos, um deles junto à janela. Empurrávamos indiscriminadamente quem se metesse no nosso caminho: mulheres grávidas, velhas, velhos, crianças – só os cegos e os deficientes motores é que eram um caso mais complicado, porque tinham à sua volta uma barreira protectora de braços zelosos. Ela cedeu-me o lugar à janela. "Senta-te, amor". Eu sabia que algo não estava bem. Mas também sabia que faltava muito pouco para descobrir, por isso não perdi tempo a imaginar o que seria. Aceitei a oferta generosa da Alice, como se não desconfiasse que era na verdade uma transacção. Com a cabeça encostada no meu ombro e com o braço agarrado ao meu, a Alice põe as suas cartas na mesa:

– Amor, quero dormir contigo...
– Hoje?
– Sim! Sei lá, não me apetece ir para casa... A minha mãe anda estúpida. E tenho saudades tuas...
– Hum, claro que sim! Não precisas de ir a casa primeiro?
– Não. Vamos logo para tua casa. Assim podes fazer o jantar...
– Ok. Deixa-me só dizer ao Rui que já não vou a Lisboa hoje à noite.
– Mas se quiseres ir, vai!
– Alice, não sejas estúpida.

Uma noite de sexta-feira arruinada. A Alice fazia destas de vez em quando. A pior coisa que uma namorada de longa data pode pedir ao seu homem – a seguir à pratica do celibato conjunto – é que este seja só seu numa noite de sexta-feira. Há quem fale de namoradas de longa data que fazem com que os seus homens esqueçam o mundo lá fora numa noite sexta. Eu acho que não existem. Não se o seu método para induzir o esquecimento consistir numa noite de sexo barulhento e porco. Mas a Alice sabia bem que alguns homens conservam a esperança de que estas mulheres existam, portanto, enquanto me observou a informar o Rui da minha ausência através de uma SMS, fez o seu melhor avanço:

– Amor?
– Sim, linda?
– Eu faço-te um broche... – disse-me ela, com os lábios bem encostados ao meu ouvido.

Qualquer resistência da minha parte seria inútil, mas probabilidades não estavam a meu favor, pois isto já acontecera: ela prometia um broche, chegávamos a casa, esfregava-me um pouco o caralho até ficar duro e metia-o dentro de si; depois disso, seguia-se o típico jantar cozinhado por mim e um filme que estivesse ao gosto dos dois – i.e. um filme que nenhum de nós gostava assim tanto. Broches são uma raridade numa relação de longa data, tão raros como dedos masculinos que massajam as costas de uma mulher sem intenções de chegar a outro lado. No entanto, a minha esperança era a de todos os outros homens estacionados no purgatório marital: a de voltar a receber um daqueles broches capazes de levar um homem a cometer loucuras, tais como a loucura de se comprometer com a mulher que o faz. Chegámos a casa e ela enfiou-se imediatamente no meu quarto após ter cumprimentado histericamente os meus pais. Assim que me juntei à Alice no quarto, dei por ela dentro de um dos meus pijamas improvisados, deitada na minha cama, a jogar um dos seus joguinhos no telemóvel. Se se tivesse tratado de qualquer outro dia que ela dormisse cá eu jamais ficaria minimamente excitado, mas vê-la deitada de barriga para baixo e de pernas dobradas, com os pés apontados para cima, mexeu comigo. Aproximei-me dela e perguntei-lhe o que estava a fazer – uma espécie de tentativa de obrigar a realidade a imitar PORNO. "A jogar, tótó.". Era óbvio, não ia acontecer. O tom com o qual aquelas palavras foram proferidas continha tanto erotismo como um peluche: o sexo só pode ser lá posto à força. "Vou fazer o jantar, Alice.". Virei-lhe as costas e saí do quarto.

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⏰ Last updated: Apr 27, 2019 ⏰

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DJ KILL MCWhere stories live. Discover now