Talvez o amor seja assim: uma luz queimando os olhos daqueles que, ingenuamente, tentem contemplar a sua face.
Eu sabia que era algo diferente, como a extremidade de um ímã atraindo a sua oposta; vozes dentro da minha cabeça lembravam-me das intensas (e demoradas) pregações que ouvia, com espanto, nas igrejas empoeiradas nas quais minha mãe tão alegremente me levava quando ainda era pequeno, para aprender a palavra do Senhor.
Era uma manhã clara, normal, (tradução: tediosa) e barulhenta, graças aquelas legiões de estudantes compartilhando rasos pedaços de suas vidas sem graça em conversas cheias de risos e vozes elevadas, todos amontoados naqueles desfalecentes metros quadrados que chamávamos de escola.
Com o mero objetivo de acomodar o meu corpo que ainda reivindicava horas de sono, sentei-me nas arquibancadas, que ficavam nas laterais da quadra de esportes no fundo do colégio, aos quais dispunham de uma agradável sombra de uma mangueira vizinha. Entretanto, o carro-chefe daquele lugar era a vista que possibilitava um interessante panorama de todos aqueles ****** ** ****.
A visão era esplendida: uma multidão de adolescentes em profunda ebulição hormonal, nada que eu não tivesse visto no meu espelho naquela manhã enquanto penteava meus malditos cabelos rebeldes.
Sutilmente senti um estrangeiro brilho aquecendo cada terminação nervosa da minha face até culminar em um profundo êxtase com uma forte dilatação nas pupilas que me deixaria intrigado por anos; era como olhar um monótono céu azul e ver, de repente, um sol de tamanho imensurável tomando conta de todo aquele vazio azul. Uma divindade metafísica manifesta, com certeza, ao qual se devia favores, oferendas, culto e, claro, amor; e isso eu estava disposto a dar. (Kkkkkk)
Uma palpitação cardíaca. Como pode, perguntava à minha abalada consciência, existir alguém tão belo? É confuso ver algo tão fantasioso se manifestar diante de seus olhos. Lábios de vivida cor, cabelos com formas geométricas confusas que me deixavam mais confuso do que jamais estive. Seus dentes? Frutos de um notório saber arquitetônico. Todo aquele corpo era para mim semelhante ao fruto que seduziu Eva; sentia que estava fazendo o mesmo, mas sem nenhum arrependimento.
Fiquei ali parado como as colunas daquele lugar, contemplando tão suave composição até o sino soar. Não demoraria encontra-lo novamente e conhecê-lo melhor.
"Talvez o amor seja assim: uma luz queimando os olhos daqueles que, ingenuamente, tentem contemplar a sua face", parece-me que isso seja verdadeiro, pois desde que o vi naquela manhã nunca mais consegui ver mais ninguém, como cego que vive sempre nas trevas.
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Ingênuos
Short StoryTalvez o amor seja assim: uma luz queimando os olhos daqueles que, ingenuamente, tentem contemplar a sua face.